O Tribunal de Justiça de São Paulo alegou discriminação e concedeu liminar (decisão provisória) proibindo a Prefeitura de São Paulo de perguntar aos funcionários aprovados em concurso público se eles têm “Aids”, “hepatite” e “alterações menstruais”.
As perguntas precisam ser preenchidas pelos aprovados, que no dia de entregar seus documentos e realizar exames médicos recebem o “Questionário Saúde” da Coordenação de Gestão de Saúde do Servidor. Procurada, a prefeitura diz que ainda não foi intimada, mas que “todas as informações serão prestadas em juízo”.
A Ação Civil Pública, ajuizada pela vereadora Juliana Cardoso (PT), foi avaliada pelo juiz Renato Augusto Pereira Maia, que na última terça-feira (24) concordou com o pedido e concedeu liminar proibindo a prefeitura de utilizar o “Questionário Saúde” ou de exigir dos candidatos o preenchimento dos campos “Aids”, “hepatite” e “alterações menstruais”.
“Os três pontos do ‘Questionário Saúde’ atingem diretamente os direitos de dois grupos de pessoas: os soropositivos (para HIV e hepatite) e as mulheres”, escreve o juiz ao citar lei que obriga “a preservação do sigilo sobre a condição sorológica da pessoa que vive com infecção pelo vírus HIV e hepatites crônicas”.
“Aids não é sequer o termo correto para referir-se à condição sorológica de uma pessoa”, continua o juiz, ao afirmar que a discriminação de portadores do HIV pode ser punida com reclusão de um a quatro anos, além de multa.
Alterações menstruais
Outro campo polêmico no questionário obriga as candidatas mulheres a informarem se elas sofrem com alterações menstruais.
“Tal questionamento é impertinente e ofende os direitos fundamentais à intimidade e vida privada das candidatas”, escreveu o juiz. “O Brasil parece caminhar na contramão do mundo, a exemplo da Espanha”, que discute a concessão de licença menstrual remunerada de até três dias para mulheres que sofrem menstruação severa.
As mulheres deveriam ter o apoio nesses dias e não serem expostas e se sentirem ameaçadas, constrangidas e discriminadas em razão de menstruarem.”
Renato Augusto Pereira Maia, juiz
Maia definiu multa de R$ 1.000 por dia com teto de R$ 1 milhão em descumprimento da decisão, que ainda cabe recurso.
“São questões que constrangem e chegam a discriminar as pessoas, em especial as mulheres e portadores de situações de saúde que em nada interferem em seu trabalho”, defende Juliana, a autora da ação. “Qual o intuito da prefeitura em saber essas informações? Vai influir na capacidade profissional delas? Claro que não.”
Advogado na ação, Roberto Piccelli diz que obrigar um novo funcionário “a declarar essa condição antes da posse causava não só desconforto mas uma certa desconfiança sobre os critérios de admissão”.
“Os órgãos públicos têm o dever de dar exemplo na inclusão de pessoas em situação vulnerável”, diz. “A decisão revela um Judiciário sensível às dinâmicas indiretas da discriminação.”
De acordo com ele, a liminar pode influenciar o processo de admissão em outras esferas da administração pública e também privada.