SP: Secretaria apura se houve racismo em show de stand-up

RICARDO SANTOS

A Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo instaurou uma apuração preliminar do caso envolvendo uma apresentação de humor do início desta semana na zona sul da capital paulista. Durante o Proibidão do Stand-Up que ocorreu na última segunda-feira no Kitsch Club, no bairro da Vila Mariana, um dos humoristas teria comparado um músico negro, que tocava no show, a um macaco.

Ofendido, o rapaz acionou a Polícia Militar, que enviou uma viatura ao local, mas, segundo a assessoria de imprensa da PM, a confusão foi resolvida lá mesmo e não foi necessário o registro de um boletim de ocorrência. O próprio humorista, Felipe Hamachi, afirmou depois que o mal-estar causado pela piada “foi resolvido depois de muita conversa e depois de eu pedir desculpas”.

Entretanto, mesmo sem o documento, que ensejaria um processo criminal, é possível abrir um processo administrativo para apurar a ocorrência de discriminação racial, como explica Antonio Carlos Arruda, coordenador de Políticas para a População Negra e Indígena, órgão ligado à Secretaria de Justiça.

“O Estado de São Paulo possui uma lei (14.187, de 2010) que prevê uma punição administrativa para casos de discriminação racial. Basta que haja um indício para começarmos uma apuração”, afirmou Arruda. “Uma das razões dessa legislação é que muitas vezes as pessoas se sentem intimidadas de ir até a delegacia por causa disso, não querem se envolver com polícia. Por isso esse mecanismo de caráter administrativo.”

Segundo Arruda, para a denúncia ser feita, o músico precisa ratificar a acusação. Caso seja provada a ocorrência de discriminação racial, o humorista, a produção do Proibidão e a casa que sedia a apresentação podem levar desde advertência até multa de R$ 18,4 mil. Além disso, caso a Comissão Processante entenda que houve crime, ela pode encaminhar o caso à polícia ou ao Ministério Público.

Humor sem limites

A proposta do Proibidão do Stand-Up é praticar um humor sem os limites do politicamente correto. Durante a campanha de divulgação do show, que custa entre R$ 40 e R$ 60, a própria casa que o sedia avisa os clientes: “se você não aguenta piadas pesadas é bom nem aparecer”. “É um conceito experimental e diferente de show de comédia”, afirmou o humorista Felipe Hamachi em sua página pessoal. “O que falo no palco não faz parte de minhas opiniões pessoais, apenas segue a proposta do show.”

A produção procura criar um ambiente “seguro” para as performances, apresentadas com a frase “Tudo que você queria ouvir e eles não podiam falar”. Para ver o stand-up de Danilo Gentili, Luiz França, Murilo Couto, Felipe Hamachi e outros humoristas, o público tem de deixar máquinas fotográficas e celulares na chapelaria, além de assinar um termo de ciência de que as piadas podem ser preconceituosas ou de baixo calão.

Para o coordenador de Políticas para a População Negra e Indígena, no entanto, o termo não tem validade jurídica. “O Estado tem responsabilidade pela vida do sujeito, e o sujeito não pode dispor de sua dignidade, que está prevista na Constituição”, disse Arruda. Ele condena essa ideia de criar um ambiente no qual o humor “incorreto” seria permitido.

“A gente precisa parar com essa história de que as pessoas podem fazer humor ofendendo alguém”, afirmou Arruda. “O humorista tem a liberdade de falar o que quiser, desde que não atinja a dignidade de ninguém. Esse é o limite. Se eles não conseguem fazer humor sem respeitar isso, que mudem de profissão.”

 

 

Fonte: Terra

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