Carolina Montenegro,
Os suíços votam neste domingo em um referendo nacional que propõe a introdução de cotas de imigração para cidadãos de países europeus.
A polêmica votação “contra a imigração em massa” foi proposta pelo Partido Popular Suíço, de direita, e está sendo acompanhada de perto em toda a Europa.
O partido defende que a Suíça deve abandonar o acordo de livre circulação de pessoas assinado em 1999 com a União Europeia, que permite acesso irrestrito de cidadãos do bloco ao país.
Apesar de não ser membro da UE, a Suíça é signatária de vários tratados do bloco e, em troca, ganha livre acesso ao mercado único europeu.
Atualmente, cidadãos de outros países europeus podem viver de três a seis meses na Suíça sem visto e, se tiverem um emprego, têm direito à residência no país sem restrições. Para cidadãos de outras nações já existem cotas de imigração em vigor.
A expansão da economia suíça, baixa taxa de desemprego (3%, contra 11% na UE em 2012), alto salários e benefícios estatais generosos são grandes atrativos para imigrantes das nações vizinhas.
Cerca de 1,87 milhão de pessoas ou 23% da população total da Suíça hoje é composta por imigrantes, segundo dados oficiais do governo. Trata-se da maior porcentagem entre os países da Europa e corresponde à entrada de aproximadamente 63 mil estrangeiros em território suíço por ano. Italianos, alemães e portugueses são os maiores grupos.
Muitos defensores da introdução às cotas argumentam que a imigração crescente está tendo impacto no número de moradias disponíveis e na superlotação das redes de saúde e transporte públicos.
“Tem gente demais”, diz o fazendeiro Martin Haab à BBC News. “Nas estradas, nos trens, e principalmente nas cidades.”
Sua fazenda, nos arredores de Zurique, fica imprensada entre uma ferrovia e uma estrada movimentada.
“Fico preocupado com meu filho e netos. Se 80 mil continuarem entrando todos os anos, em quatro décadas teremos 13 milhões de pessoas vivendo aqui. Isso ignifica que o noroeste da Suíça vai virar uma grande cidade”, diz o fazendeiro, que também é um político local pelo Partido Popular Suíço.
Tensão
A tendência crescente de “portas fechadas” à imigração é vista com preocupação por especialistas e suíços ouvidos pela BBC Brasil.
Para o professor de políticas migratórias da Universidade de Neuchâtel, Etienne Piguet, o debate sobre imigração reflete o crescente mal-estar nacional sobre o assunto e a tensão com a UE.
Segundo ele, nos últimos 40 anos, estes referendos têm acontecido a cada cinco ou dez anos e estão relacionados ao sistema de democracia direta e ao fato de a Suíça ser um país que acolhe muitos imigrantes.
“Mas o mal-estar da população suíça em relação à imigração está crescendo. A situação há cinco anos era mais aberta”, afirmou Piguet.
Para o especialista, se a iniciativa for aprovada, as consequências seriam grandes para a Suíça.
“O fim da imigração livre com a Europa significa provavelmente o fim de muitos outros acordos com a União Europeia, como parcerias científicas comerciais, acadêmicas. E isso é extremamente delicado”, disse.
Crise e expansão
A crise econômica no bloco e a expansão da União Europeia (Romênia e a Bulgária ganharam livre acesso ao mercado de trabalho de vários países do bloco no início do ano) são vistas como ameaças.
“Os suíços têm medo de que, se a situação piorar em outros países da Europa, mais pessoas venham para cá em busca de emprego. Ninguém quer perder o alto padrão de vida daqui”, disse a brasileira-suíça Maria da Graça Almeida Costa, que mora em Genebra há 16 anos.
Pesquisa publicada em 29 de janeiro pela consultoria gfs.bern indicava que 50% dos eleitores votariam “não” às cotas e 43% “sim” – um aumento, porém, frente aos 37% de uma sondagem anterior divulgada em 10 de janeiro.
O governo e as empresas fazem coro contra a iniciativa. Nesta semana, a Câmara Internacional de Comércio da Suíça divulgou um comunicado alertando que as cotas “enviariam um sinal claro contra o livre mercado e prejudicariam as companhias suíças, que contribuem muito para a economia do país”.
Representantes de 12 setores empresariais, incluindo tecnologia, relógios e turismo também reclamaram em nota pública sobre a possível perda de mão-de-obra qualificada.
“As consequências seriam devastadoras para nosso mercado de trabalho, que depende de especialistas”, afirmou Heinz Karrer, presidente da companhia Economiesuisse.
O ministro da Economia suíço, Johann Chneider-Ammann disse em entrevista ao jornal local Tribune de Geneve que se os suíços votarem “sim”, empregos serão perdidos.
“Os suíços devem votar com suas cabeças, não com seu estômago”, disse o ministro.
Até 2015, outros dois referendos sobre imigração devem acontecer no país. O grupo verde Ecopop planeja limitar a imigração a 0,2% do crescimento populacional do país e os suíços também deverão votar pela inclusão da Croácia no acordo de livre circulação firmado com a União Europeia.
Fonte: BBC Brasil