Unesp terá comissão para verificar declaração de cor dos alunos cotistas

Enviado por / Fonteo Isto É

A Universidade Estadual Paulista (Unesp) vai averiguar se alunos cotistas da instituição são realmente pretos ou pardos, como indicado na inscrição do processo seletivo. Segundo a instituição, o sistema foi criado após denúncias de falsas declarações entre candidatos cotistas.

A ideia, por enquanto, não é verificar a etnia de todos os estudantes. Passarão pela checagem só alunos que forem alvos de denúncias vindas de dentro ou de fora da Unesp. No futuro, há intenção de ampliar a abrangência da averiguação. E terá efeito retroativo: se houver denúncia, será avaliada a suposta inconsistência na autodeclaração dos já matriculados.

Na análise, serão usados critérios físicos, como a cor da pele ou o tipo de cabelo. Diferentemente de outras comissões do tipo para vestibulares e concursos públicos, também poderão ser considerados, entre alunos com pele menos escura, aspectos subjetivos, como a identidade negra do candidato em contextos sociais ou culturais.

“Há casos em que gostaríamos de considerar: estudantes que desenvolveram sua identidade em espaços de construção cultural negra, como escola de samba, capoeira ou organização quilombola”, explica Juarez Tadeu de Paula Xavier, assessor da Pró-reitoria de Extensão Universitária da instituição. Esse perfil sociocultural pode ajudar o aluno a seguir na instituição, mas não significa que será obrigatório para ter direito à cota. A universidade diz que vai dar amplo direito de defesa aos avaliados, como o uso de fotografias, documentos e vídeos. A análise será feita caso a caso.

O estudante será avaliado por uma comissão formada por professores alunos e funcionários. Caso não seja enquadrado como preto ou pardo, será excluído da universidade.

O mecanismo foi criado após denúncias levadas pela ONG Educafro – que busca a inclusão de pobres e negros na educação – e por coletivos da universidade. Houve queixas em pelo menos metade dos 24 municípios onde a Unesp tem câmpus, segundo Xavier. “É um volume considerável”, diz ele, sem precisar números. Todas ainda estão em apuração.

Em 2013, a Unesp foi a primeira a adotar cotas entre as estaduais paulistas, de forma escalonada. Agora, a reserva é de 50% das vagas para alunos de escola pública e, dentro desse grupo, 35% para pretos, pardos e indígenas (PPI), segundo a distribuição populacional no Estado de São Paulo medida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Dos 7.403 calouros da Unesp neste ano, 1.922 – 26% do total – são PPI.

De olho

Frei David Santos, diretor executivo da Educafro, afirma que o movimento negro é defensor da autodeclaração. “Mas ela só tem valor se houver uma comissão antifraude.” É comum que falsos cotistas, segundo ele, usem truques para se passarem como pretos e pardos – desde o uso de turbantes até o bronzeamento artificial. Para o ativista, deve ter direito a cotas raciais aquele que enfrenta preconceito pela aparência. Uma pessoa de pele clara, ainda que tenha familiares negros, sofre pouco com a discriminação, diz.

Ele propõe que as universidades atuem em três frentes: obrigar os fraudadores a ressarcirem a instituição, usar o dinheiro para um fundo de bolsas para estudantes negros e criar edital para que a vaga aberta após o desligamento do falso cotista seja ocupada por um candidato PPI.

A ideia também é alvo de críticas. Para o professor de Direito Administrativo da USP Floriano de Azevedo Marques, comissões como essa “criam uma segregação justamente onde se queria evitar”, uma vez que “vai continuar marcando aquele aluno como ‘uma pessoa especial’ que precisa provar o quanto é especial, o que anula o principal proveito da política inclusiva, que é criar diversidade”. Marques diz ainda que “a quantidade de melanina na pele não é fator objetivo que define se o sujeito é ou não merecedor da inclusão”.(Colaborou Bruno Ribeiro)

+ sobre o tema

“A elite intelectual teve de dividir seus privilégios”

Unicamp adota cotas étnicos-raciais e abre caminho para a...

Professores alegam que UFRJ não cumpriu cotas em concurso para professor do IFCS

Cotas na UFRJ Um grupo de professores universitários (de USP,...

USP expulsa aluno pela 1ª vez por fraude no sistema de cotas raciais

A Universidade de São Paulo expulsou pela 1ª vez...

para lembrar

Entrevista com Fábio Konder Comparato

Írohín- Jornal Online - O Professor Fábio Konder Comparato titular...

Os cotistas desagradecidos

Por Tau Golin*, em  Sul 21 A incoerência é típica dos...

Plenário analisa resolução para inclusão de cotas raciais na magistratura

O plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) começou...
spot_imgspot_img

Folha ignora evidências favoráveis às cotas raciais

Na quinta-feira (7), pela oitava vez, esta Folha publicou um editorial ("Cotas sociais, não raciais") explicitando sua posição ideológica sobre as cotas raciais, negando os evidentes resultados...

Reitor da USP repudia ataques a cotas; veja entrevista

Os comitês que decidem quais alunos podem entrar nas universidades por meio das cotas raciais passaram por uma série de polêmicas nos últimos dias...

Não entraria em avião pilotado por cotista?

"Responda com sinceridade, leitor. Você entraria confortavelmente num avião conduzido por alguém que, pelo fato de pertencer à minoria desfavorecida, recebeu um empurrãozinho na...
-+=