Violência policial não é questionada em mais de 45% das audiências

A audiência de custódia, projeto lançado em 2015, é uma inciativa do Conselho Nacional de Justiça, que consiste na garantia de que o preso em flagrante seja rapidamente apresentado a um juiz de direito

Do Correio do Brasil 

Levantamento do Instituto do Direito de Defesa (IDDD) mostra que em mais de 45% das audiências de custódia feitas em São Paulo os réus não foram interrogados sobre violência policial durante a prisão em flagrante. Os dados mostram ainda que membros do Ministério Público perguntaram sobre abusos policiais apenas em 1,36% das vezes, e os advogados, em 5,78%.

A audiência de custódia, projeto lançado em 2015, é uma inciativa do Conselho Nacional de Justiça, que consiste na garantia de que o preso em flagrante seja rapidamente apresentado a um juiz de direito. De acordo com o Tribunal de Justiça de São Paulo, entre fevereiro de 2015 e março de 2016 foram realizadas 19.472 audiências de custódia na cidade de São Paulo. O IDDD sistematizou dados referente a 588 pessoas que passaram por essas audiências, coletando informações dos boletins de ocorrência e dos autos de prisão em flagrante.

– Já me causa espécie uma quantidade muito grande de juízes não formular essa pergunta. Depois, o Ministério Público tem a possibilidade de fazer a pergunta e também não faz. E aí também, advogados quando possibilitada fazer essa pergunta, ela também não é feita – disse o presidente do instituto, Augusto de Arruda Botelho.

– Então o que queremos? Esconder essa realidade infelizmente ainda existente em nosso país, de que há violência, há maus-tratos, há tortura nas delegacias de polícia? Causou um susto enorme esse número tão excessivo, principalmente do Ministério Público, que é o fiscal da lei – acrescentou.

Na análise das decisões judiciais dos casos acompanhados, 61% foram convertidos em prisão provisória após a audiência de custódia, 27% receberam liberdade provisória sem fiança e com outra medida cautelar, 6% das prisões foram relaxadas, 5% receberam a liberdade provisória com fiança e apenas 1% receberam a liberdade provisória sem medidas cautelares.

– O Brasil historicamente tem um caráter excessivamente de punição, como se a prisão solucionasse absolutamente tudo. E o que nós queremos é uma modificação do pensamento do sistema judiciário para que a prisão seja utilizada, sim, em caso de absoluta necessidade – destacou Botelho.

– Audiência de custódia não serve para soltar preso, não serve para colocar na rua criminosos, serve para fazer da prisão um local onde pessoas que necessariamente precisam estar presas, ali permaneçam –acrescentou.

Em nota, o Ministério Público do Estado de São Paulo disse que adota providências quando a lei é desrespeitada. “O Ministério Público do Estado de São Paulo zela, em todos os casos, pela legalidade das prisões, adotando as providências nas hipóteses de eventual desrespeito às leis”. Procurada, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ainda não se manifestou.

+ sobre o tema

Jovem, talentoso e negro

O que é talento? Essa palavra, que se popularizou...

Discriminação e desigualdades raciais no Brasil: obra de Carlos Hasenbalg quarenta anos depois

Em 1978, Carlos Hasenbalg defendeu na Universidade de Berkeley,...

Manifesto defende manutenção da maioridade penal em 18 anos de idade

Texto com 150 assinaturas de cidadãos e organizações afirma...

Seppir, PT, o movimento negro e a crise

No dia 02/10/2015, a já esperada reforma administrativa foi...

para lembrar

Qual é o lápis cor de pele? Fotógrafa coleta depoimentos sobre o tema

Denise Camargo vai projetar imagens sobre o assunto em...

Cultura do ódio, a violência nossa de cada dia

Qual sentido em discutir e divulgar de modo sensacionalista...

“Péssimo exemplo para as crianças” é um técnico de futebol machista por Sakamoto

''Futebol é um esporte forte, esporte de homens.'' por Leonardo...
spot_imgspot_img

Relatório da Anistia Internacional mostra violência policial no mundo

Violência policial, dificuldade da população em acessar direitos básicos, demora na demarcação de terras indígenas e na titulação de territórios quilombolas são alguns dos...

Aos 45 anos, ‘Cadernos Negros’ ainda é leitura obrigatória em meio à luta literária

Acabo de ler "Cadernos Negros: Poemas Afro-Brasileiros", volume 45, edição do coletivo Quilombhoje Literatura, publicação organizada com afinco pelos escritores Esmeralda Ribeiro e Márcio Barbosa. O número 45...

CCJ do Senado aprova projeto que amplia cotas raciais para concursos

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou nesta quarta-feira (24), por 16 votos a 10, o projeto de lei (PL) que prorroga por dez...
-+=