Jorge Aragão chega aos 70 anos como bamba do samba que faz arte popular do chão do Brasil

Nascido em 1º de março de 1949, Jorge Aragão da Cruz completa hoje 70 anos de vida como referência no universo do samba, e não somente no do Rio de Janeiro (RJ), cidade que aniversaria no mesmo dia deste cantor, compositor e músico carioca de ascendência amazonense e infância vivida no bairro de Padre Miguel, berço da escola de samba Mocidade Independente.

Por Mauro Ferreira, G1

Jorge Aragão, homem negro de barba grisalha, em pé se apresentando.
Jorge Aragão em 2016, 40 anos após ter sido lançado como compositor na voz de Elza Soares (Foto: Marcos Hermes / Divulgação)

Zeca Pagodinho, uma década mais moço, atualmente pode ser mais popular e mais presente na mídia do que Aragão. Mas pergunte a Pagodinho o que ele acha de Aragão. A resposta certamente conterá a admiração entusiasmada de um fã por um ídolo do qual se tornaria parceiro na composição de sambas como Voo de paz (1986) e Não sou mais disso (1996).

Tal devoção faz sentido porque Aragão foi pioneiro entre a geração de sambistas projetados ao longo dos anos 1980, egressos da quadra do bloco Cacique de Ramos, celeiros de bambas como Pagodinho e os integrantes do grupo Fundo de Quintal.

Em 1976, quando a formação do grupo ainda nem sequer estava oficializada, Elza Soares pôs voz na gravação original de Malandro, samba que Aragão compusera oito anos antes, em 1968, com João Batista Alcântara, o parceiro dos tempos de pré-fama que ficaria conhecido pela alcunha de Jotabê. Estava aberta a porta para o sucesso do compositor
Em 1978, atenta aos sinais emitidos pela turma que se reunia na quadra do Cacique de Ramos, a antenada Beth Carvalho propôs um samba esquema novo no álbum puxado por Vou festejar, samba de sucesso retumbante que trazia as assinaturas de Aragão, Neoci Dias de Andrade e Dida (compositor do bloco).

De 1978 em diante, Aragão – que ouvira o apito do samba ainda na década de 1960, quando ainda era corneteiro de quartel – jamais deixou de ser gravado regularmente enquanto abria parcerias com baluartes do sambas como Ivone Lara (1922 – 2018), com quem assinou Tendência (1981) e Enredo do meu samba (1984), sambas lançados nas vozes de Beth Carvalho e Sandra de Sá, respectivamente.

Aragão costuma ser caracterizado como O poeta do samba porque muitos dos sambas do cancioneiro do compositor são de fato poéticos, por vezes até líricos, e têm melodias mais melancólicas. Reflexão (1990), parceria de Aragão com o bamba Luiz Carlos da Vila (1949 – 2008), ilustra bem essa vertente da obra do compositor ao lado de sambas como Lucidez (Jorge Aragão e Cleber Augusto, 1991).

Contudo, o cancioneiro de Aragão extrapola clichês e rótulos porque o artista parece saber que, como dizia o poeta, é melhor ser alegre do que ser triste. Basta alguém puxar Coisinha do pai (Jorge Aragão, Almir Guineto e Luiz Carlos da Vila, 1979), por exemplo, em qualquer roda de samba que o pagode fica instantaneamente animado.

É com a alegria consciente do samba que Aragão jamais fugiu à luta pela valorização da negritude. Eriçado na voz do cantor Emílio Santiago (1946 – 2013), também o intérprete original de Logo agora (Jorge Aragão e Jotabê, 1979), Cabelo pixaim (Jorge Aragão e Jotabê, 1978) destilou o orgulho negro espichado por Aragão em Identidade (1999).

É com a alegria consciente do samba que Aragão jamais fugiu à luta pela valorização da negritude. Eriçado na voz do cantor Emílio Santiago (1946 – 2013), também o intérprete original de Logo agora (Jorge Aragão e Jotabê, 1979), Cabelo pixaim (Jorge Aragão e Jotabê, 1978) destilou o orgulho negro espichado por Aragão em Identidade (1999).

O suprassumo dessa obra referencial está gravada pelo autor em álbuns como Coisa de pele (1986), Raiz e flor (1988), A seu favor (1990) e Chorando estrelas (1992), sendo que Um Jorge (1993) fez o resumo dessa obra em série de medleys.

O peso da discografia do artista seria diluída a partir dos anos 2000 por conta da redundância de sucessivos discos ao vivo gravados com a intenção de repetir o sucesso comercial do álbum Jorge Aragão ao vivo (1999), disco que simbolizou pico de popularidade na carreira do cantor. Mas nada que tire o valor do conjunto da monumental obra autoral do compositor.
Avesso a badalações, Jorge Aragão chega aos 70 anos de vida como um dos maiores bambas do samba “nascente das várias feições do amor”, como o compositor poetizou em Coisa de pele. Sim, Jorge Aragão faz sólida arte popular do nosso chão.

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