Projeto acolhe mães com HIV e busca reduzir transmissão para filhos em SP

Segundo o Ministério da Saúde, mais de 20 mil gestantes foram diagnosticadas com o vírus desde 2019

Vera (nome fictício), 40, soube ser portadora de HIV, causador da Aids, poucos meses após o nascimento de seu filho. Sem saber da infecção, amamentou a criança, que depois também foi diagnosticada com o vírus. A revolta e o sentimento de culpa levaram a mãe a abandonar os medicamentos.

Em 2017, por não seguir o tratamento, complicações de um quadro de pneumonia a colocaram em coma por sete meses. Há pouco mais de três anos, ela conheceu o Projeto Criança Aids, em São Paulo.

A entidade atende, desde 1991, crianças e jovens com HIV. Mesmo fora de seu público-alvo, a ONG também acaba acolhendo mães que, infectadas e sem o devido diagnóstico, transmitiram a doença para seus filhos e os acompanha no tratamento. Vera e o filho, hoje com 14 anos, estão bem.

A contaminação por HIV através da amamentação é uma das formas de transmissão vertical do vírus –quando a criança é infectada por alguma IST (Infecção Sexualmente Transmissível) durante a gestação, parto ou amamentação.

Gestantes são orientadas sobre o risco da amamentação para o bebê e, logo após o parto, o protocolo do Ministério da Saúde indica que a mãe com HIV deve receber uma injeção que inibe a produção de leite.

Porém, ainda há casos em que, sem receber o diagnóstico da infecção durante o pré-natal ou a adquirindo posteriormente, mulheres acabam amamentando e transmitindo o vírus. “A mulher fica com a carga viral muito alta e a chance de transmissão pelo leite materno pode chegar até 40%”, explica Daniela Bertolini, infectopediatra colaboradora do Projeto Criança Aids.

Para Adriana Galvão Ferrazini, presidente do Criança Aids, o acompanhamento de famílias que convivem com o HIV faz toda a diferença.

“Temos casos de famílias em que um filho de pais que vivem com HIV não foi infectado durante a gestação nem no momento do parto”, conta. “A transmissão também não ocorreu no momento da amamentação, isso porque a família foi instruída pela equipe interdisciplinar do projeto.”

A dona de casa Lúcia (nome fictício), 46, não foi informada a tempo. Ela só soube ser portadora do vírus quando seu filho, com um pouco mais de um ano, teve um quadro de estomatite, que causa inflamação da mucosa oral.

O filho de Lúcia teve sequelas da estomatite, com agravante da infecção por HIV, e ficou internado por mais de dois meses. A dona de casa conta que ficou desesperada. Em toda a gravidez, nada fora detectado. Ela acredita ter sido infectada no pós-parto.

Durante o pré-natal, gestantes costumam ser submetidas a testes de ISTs. Porém, após o parto, não são realizados novos exames, e o sexo desprotegido pode expor as mães em período de amamentação.

Assim como Vera, Lúcia se negou por muito tempo a tomar a medicação, apesar de afirmar nunca ter esquecido de dá-la ao seu filho, hoje com 21 anos. Em 2010, a família passou a ser atendida pelo Criança Aids, para onde vão quatro vezes durante a semana.

Tendo em vista evitar a contaminação pós-parto, o Ministério da Saúde recomenda, para gestantes e seus parceiros o uso de preservativo em todas as relações sexuais, além da PrEP (Profilaxia Pré-Exposição), que permite ao organismo estar preparado para enfrentar um possível contato com o vírus.

Segundo o DCCI (Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis) da pasta, entre dezembro de 2019 e junho deste ano, 20.553 gestantes foram diagnosticadas com HIV.

Já o número de casos de infecção por HIV entre crianças de até cinco anos no Brasil caiu 87% entre 2009 e 2021, “o que demonstra que o acompanhamento durante a gravidez de uma gestante com HIV traz resultados positivos quanto a interrupção da transmissão vertical”, diz Bertolini.

Os bebês cujas mães vivem com HIV têm direito a fórmula láctea distribuída pelo SUS (Sistema Único de Saúde) até os seis meses de vida. Em São Paulo, o alimento é fornecido gratuitamente até os dois anos de idade.

Com sede na Vila Saúde, zona sul de São Paulo, o Projeto Criança Aids atende, atualmente, 46 crianças e adolescentes de 22 famílias. Além de apoio no tratamento, a ONG oferece capacitação profissional e auxilia as famílias com cestas básicas.

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