A beleza negra de Odara

“Deixa eu dançar pro meu corpo ficar odara”, canta Caetano Veloso em um dos sucessos de seu disco Bicho, de 1977. Foi aí que o artista plástico Muha Bazila, 25 anos, encontrou inspiração para nomear sua série de gravuras dedicada a mulheres negras: “‘Odara’ é uma palavra que tem a ver com a exaltação de algo, como mostra a música do Caetano. Achei que cairia bem como título de uma série que celebra a beleza negra”, explica.

Por Mariana Tavares, do Não lidos

Criada em 2013, a Odara nasceu do interesse de Muha em refinar sua técnica em retratos feitos com canetas marcadores, instrumentos que conheceu por meio da Arquitetura, que cursa na Universidade de Brasília. Após experimentar com autorretratos, o artista, nascido em Salvador, foi buscar referência em imagens de mulheres negras de cabelo afro, interessado em explorar o potencial estético de tais composições e formas, diz. Entre suas influências, cita a francesa Françoise Nielly e o austríaco Voka, com quem compartilha o interesse por retratos e pelo uso de cores.

muha_bazila_2

Após os primeiros desenhos, uma pergunta começou a ser comum: por que apenas mulheres negras? “Eu respondo: por que não? Por que isso é diferente? Quando artistas das mais diversas áreas ou mesmo campanhas publicitárias mostram apenas pessoas brancas, não existia esse questionamento. Então, por que o espanto com uma série como a Odara?”, observa. Hoje, a série conta com mais de vinte gravuras de mulheres com os mais diversos perfis, o que, segundo Muha, não é aleatório: “É comum que a mulher negra, quando retratada, seja sexualizada. São estereótipos dos quais eu queria fugir. Por isso, procurei representar uma gama ampla de mulheres”.

muha_bazila_4_2

Muha busca inspirações em um banco de imagens que construiu, mas há referências próximas fundamentais. Sua mãe, Maria Luiza Junior, é militante do movimento negro, o que, segundo o artista, lhe garantiu uma educação com consciência sobre questões raciais. Da mesma forma, a atenção ao cabelo black partiu de vivência própria: “Na infância e adolescência, eu tinha o cabelo sempre trançado, não me sentia bem com o cabelo solto. Só depois, adulto, eu comecei a usar o cabelo black. E hoje vejo esse movimento, que parte principalmente das mulheres, as maiores vítimas de um eurocentrismo e de uma estética hegemônica branca que diz que o cabelo afro não é legal, que incomoda, e que obriga o alisamento do cabelo”.

muha_bazila_31

Muha vê na série uma forma de colaborar para essa mudança, sem roubar o protagonismo de quem ele é de direito: “Meu objetivo é dar minha contribuição por meio da forma que eu trabalho. São as mulheres negras que devem falar pelas mulheres negras”. Uma série dedicada aos homens negros está nos planos, entre outros projetos. Enquanto isso, a Odara segue. Além de exposições no Brasil, em 2014 a série foi para a mostra Art Freedom, em Paris, na França, onde Muha era o único artista brasileiro. Para conhecer mais de seu trabalho, visite sua página no facebook.

muha_bazila_credito-foto-ziza-gomes
Muha Bazila (foto: Ziza Gomes)
11401419_653435794786310_319609424736471799_n
Facebook

Imagens cedidas pelo artista.

 

+ sobre o tema

Videoclipe “Preta” promove auto-estima e valorização da mulher negra

Single lançado há uma semana do Dia Internacional de...

Índia prende suspeito de ter raptado e estuprado menina de cinco anos

A polícia da Índia prendeu um homem na faixa...

Leci Brandão recebe justa homenagem

A deputada estadual pelo PC do B, cantora e...

Obama pede o fim da “cura gay”

Presidente fez declaração através de assessora da Casa Branca Por ...

para lembrar

Filha de Samora Machel perde a visão após agressão do namorado

Josina Machel, filha do antigo presidente da República Popular...

Em Salvador, mulheres vão às ruas contra o racismo e o genocídio

Da Piedade à Praça da Sé, o 8 de...

Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva lança Entre Brasil e África

Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva lança Entre Brasil e África construindo conhecimento...

Proibidas de andar de bicicleta, meninas afegãs encontram liberdade no skate

Em muitas comunidades afegãs, é um costume proibir as...
spot_imgspot_img

Só sete estados têm leis específicas de proteção contra assédio sexual a servidores

Apenas sete estados contam com leis que visam ampliar a proteção contra assédio sexual de servidores. Nesses locais, os estatutos de profissionais públicos vão além do...

Mulheres afirmam que foram assediadas por Silvio Almeida: ‘Tive noção de que era algo grave’

O Fantástico, que entrevistou a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, também falou com sete mulheres que acusam Silvio Almeida. Duas gravaram entrevista. Entre elas, a professora...

Salvador elege Eliete Paraguassu, primeira vereadora quilombola da cidade: ‘a gente rompeu a barreira do racismo’

Eliete Paraguassu (Psol) se tornou a primeira vereadora quilombola eleita em Salvador. A vitória foi desenhada neste domingo (6), no primeiro turno das eleições...
-+=