Folha de São Paulo –
por: Sérgio Dávila –
MAIS do que um prêmio a Barack Obama pessoa física ou à gestão de ainda poucos meses do presidente democrata, o Nobel da Paz reconhece a importância do multilateralismo no mundo depois de oito anos da dupla Bush/Cheney, da mentalidade “nós contra eles”, das “guerras preventivas”, da “guerra ao terror”.
E nesse quesito -o multilateralismo, a iniciativa de privilegiar a diplomacia em vez da força, o diálogo com inimigos no lugar do isolamento e a participação em fóruns mundiais como um sinal positivo, não de enfraquecimento dos EUA-, Obama tem um trabalho de alguns anos para mostrar. Na verdade, o democrata fez sua campanha e se destacou dos concorrentes baseado nele.
Campanha que começou oficialmente em fevereiro de 2007, com um discurso em Illinois em que Obama dizia: “Nos últimos seis anos, ouvimos que a mudança climática é um boato, […] que falar duro e uma guerra mal-concebida podem substituir diplomacia, estratégia e visão de futuro. […] E, quando tudo o mais falha […], ouvimos que a nossas crises são culpa de outras pessoas”.
Nos meses seguintes, e até a eleição, ele manteve o discurso, bancando o risco de parecer “fraco” em relação a segurança nacional, pecha que os republicanos grudam com sucesso nos democratas há décadas, mas que dessa vez não colou.
Além disso, no primeiro mês à frente da Casa Branca, ele plantou o alicerce no qual pretende basear os quatro anos de Presidência, mandando fechar Guantánamo, proibindo a tortura e outras medidas de exceção, acenando já no discurso de posse com diálogo a regimes hostis como Irã e Coreia do Norte, lançando a semente de seu ambicioso plano antiproliferação de armas nucleares.
Quase nada saiu do papel, essa era a crítica ontem em Washington e o motivo da surpresa. Pela divisão profunda no ambiente político interno, é provável que pouca coisa saia. Ainda assim, como lembrou à Folha um integrante graduado da administração bushista, as pessoas esquecem que, nos EUA, a natureza da Presidência é de pouco poder nas questões domésticas, mas muito poder nas de política externa.
Seja como for, o Nobel premiou a ideia de paz de Barack Obama. Foi por ela também que o político foi eleito.