Adriana Moreira, porta-voz do tempo

Era uma casa verde, habitada por sete mulheres pretas, num bairro de brancos. Um sobrado antigo na Rua Afonso Celso, nº 1.324, na Vila Mariana, em São Paulo. Tinha muros baixos, duas cercas de madeira e um jardim de margaridas. Nas laterais havia longo e estreito corredor que levava ao quintal — onde despontavam uma roseira, um limoeiro e um pé de pitanga. Nesse quintal idílico, em 1976, encontraremos a menina Adriana Aguiar Moreira, no auge dos seus seis anos de idade, brincando e correndo livre junto às irmãs.

Por Bruno Ribeiro, da Revista Opera

Adriana Moreira (Foto: Rafael Fridymann)

Sua brincadeira preferida era promover campeonatos de dança e de canto. Ela era quem se sobressaía. As outras mulheres da casa — sua mãe, duas tias e uma prima mais velha — não davam muita bola aos dotes artísticos da garota. Não que não se importassem com ela, mas apenas passavam a maior parte do tempo entretidas com os afazeres da casa e os assuntos do mundo adulto, sempre tão cheio de problemas.

O primeiro a prestar atenção no interesse da garota pela música foi o avô de Adriana, o professor e jornalista Jayme de Aguiar, único homem e provedor da casa. Ficou viúvo muito cedo e trouxe as irmãs — Maria e Matilde — para morar com ele. Enquanto trabalhava fora, as mulheres cuidavam das tarefas práticas do lar e ajudavam a criar a pequena Lucíola, filha de Jayme, que viria ser a mãe de Adriana.

Aos 50 anos recém-completados, Adriana Moreira descreve o avô da seguinte forma: “Ele tinha alma de poeta. Era um preto retinto, muito culto e asseado, que cheirava à loção pós-barba. Nunca o vi sem camisa ou com a roupa amarrotada, estava sempre de terno e gravatinha borboleta. Foi quem me disse pela primeira vez que eu deveria cantar”.

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