Quatro líderes africanos foram, recentemente, celebrados como inovadores. Mas as esperanças de mudança neles depositadas não se concretizaram. Farão eles justiça à sua reputação em 2020?
Por Martina Schwikowski, do DW
Os quatro líderes africanos João Lourenço (Angola), o primeiro-ministro Abiy Ahmed (Etiópia), Cyril Ramaphosa (África do Sul) e Emmerson Mnangagwa (Zimbabué) têm algo em comum: quando chegaram ao poder, foram muito celebrados como possíveis reformadores de sistemas caducos. Mas as esperança não se concretizaram e os líderes estão agora sob enorme pressão para passar à acção. O ano de 2020 será para eles a prova dos nove.
O Presidente de Angola, João Lourenço, fez algumas mudanças positivas na política nacional desde a sua eleição, em 2017. Mas as expectativas neste país da África austral são muito altas: “O próximo ano tem que ser o primeiro em que o Produto Interno Bruto (PIB) aumente. Isso é muito importante porque acabou o período de graça do Presidente”, diz Alex Vines, investigador no instituto britânico de pesquisa Chatham House. O elevado desemprego jovem aumenta a pressão sobre Lourenço para proceder a reformas, acrescenta Vines.
Angola: economia estável à vista?
O Presidente angolano estabeleceu como seu principal objetivo estabilizar a economia de Angola. Mas este país rico em petróleo está em recessão há quatro anos, diz Vines. Uma transformação bem-sucedida depende de uma economia forte e de novos empregos. O Presidente tentou atrair novos investidores para o país. Mas “o fator decisivo será conseguir quebrar a eterna dependência de Angola da indústria do petróleo. 97% da receita atual vem da venda de petróleo”, disse Vines em entrevista à DW.
Segundo o analista, os angolanos veem como positivas as medidas que Lourenço tomou contra a corrupção quando foi eleito. O ex-governante de Angola, José Eduardo dos Santos, que administrava o país como uma “empresa familiar”, escolhera Lourenço como seu sucessor por não o considerar assertivo. Julgava que não representava uma ameaça para os interesses da família Dos Santos. Mas enganou-se: o novo Presidente surpreendeu com iniciativas para combater a corrupção e o nepotismo. Decidiu “limpar a casa” em Angola nos primeiros dois meses de seu mandato, e não teve medo de permitir a detenção de membros da família Dos Santos. Um antigo ministro dos Transportes também foi preso por corrupção.
Mas quão disposto estará o governante de Angola a reformar o país? “Ele está a falar sério, mas não tem planos de introduzir a democracia”, diz Vines. Na opinião do analista, trata-se mais de manter o poder do partido. O Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), que governa desde a independência em 1975, venceu a eleição com 61% de votos, segundo o resultado oficial. Vines comenta: “Lourenço quer garantir um resultado melhor.” Para os angolanos, no próximo ano ficará claro se o Presidente se concentrará na recuperação económica, ou se se vai preocupar mais com a política interna do partido.
Política arriscada na Etiópia
Na Etiópia, também não há certezas se os cidadãos beneficiarão de reformas em 2020 – o Prémio Nobel da Paz e primeiro-ministro, Abiy Ahmed, não promete muitas mudanças. O primeiro-ministro de 43 anos, que recebeu um dos prémios mais prestigiosos do mundo, está no cargo há apenas um ano e meio. O Nobel foi-lhe discernido pela coragem em resolver o conflito de longa data com a vizinha Eritreia. No seu próprio país, no entanto, a situação é tudo menos pacífica: nos últimos meses houve conflitos que resultaram em pelo menos 67 mortes e um referendo para autonomia regional que poder alimentar novas tensões. “O sistema político num Estado multiétnico pede que Abiy conceda mais autonomia. Foi muito arriscado”, diz Vines, “mas se ele [Abiy Ahmed] não tentar, não conseguirá nada.”
Há cada vez mais grupos étnicos no país de 109 milhões de pessoas a lutar pela autonomia. O primeiro-ministro poderá manter a integridade do país a longo prazo? A situação é complicada, diz Vines. Uma tentativa de golpe na região norte de Amhara, há alguns meses, mostra que a Etiópia pode tombar politicamente a qualquer momento: “Seremos capazes de avaliar melhor no próximo ano se Abiy conseguirá reformar a economia no futuro próximo e manter o país estável”. Do que depende não apenas a sobrevivência política de Abiy nas eleições parlamentares de maio de 2020, mas também a paz em toda a região.
Sul-africanos insatisfeitos
Também para os sul-africanos, a esperança e o medo fazem parte do cotidiano. A recuperação económica prometida ainda está muito longe de ocorrer. “Estamos sempre a falar em iniciar a quarta revolução industrial”, disse Aditi Lalbahadur, membro do Instituto Sul Africano de Assuntos Internacionais (SAIIA), à DW. “Mas há muita sombra a pairar sobre nós”. O analista refere-se ao legado do Governo corrupto do ex-Presidente Jacob Zuma, que Cyril Ramaphosa substituiu após a sua renúnca no início de 2018. Mas Ramaphosa não tem apoio suficiente do partido governamental, o Congresso Nacional Africano (ANC), para proceder a reformas radicais.
Muitos pensavam que finda a era Zuma, Ramaphosa libertaria o país da corrupção e daria novo impusdo à economia. Mas o otimismo evaporou rapidamente: “O gabinete de Ramaphosa consiste, basicamente, das mesmas pessoas acusadas de corrupção. Como confiar nelas?”, questiona Lalbahadur. A analista acredita que Ramaphosa tem seriamente o objetivo de relançar a economia estagnada da África do Sul. Os sul-africanos ressentem-se com a situação, tornando imperativo que Ramaphosa dê sinais positivos mais concretos.
Zimbabué sem esperanças
No vizinho Zimbabué, o desalento parece total. Ninguém parece contar com uma melhoria do cenário em 2020. “O Zimbabué encontra-se numa profunda crise política, económica e social”, diz Lalbahadur. Não há investimentos estrangeiros e a desconfiança do Governo do Presidente Emmerson Mnangagwa é enorme. “Enquanto os manifestantes saem à rua em protestos, ele fala de reformas e abertura do comércio”. Hoje, a hiperinflação é de 440%. “As pessoas percebem que livrar-se do autocrata anterior, Robert Mugabe, não foi suficiente”. No Zimbabué, alguns dizem que apenas se trocou de “condutor” do país em 2017, mas “o autocarro ainda é o mesmo”. O final de 2019 foi decepcionante politicamente para o país, diz o analista Vines. No que respeita a esperança de mundanças num futuro próximo, o Zimbabué parece não ter grandes perspetivas.