Aguinaldo Silva critica Helena negra de Manoel Carlos: “Falta a ela o componente racial”

Fonte: IG Gente –

Aguinaldo Silva abriu ao iG as portas de sua casa, num condomínio de luxo na Barra da Tijuca, no Rio, dias antes de embarcar para Lisboa, onde mantém residência. O autor concedeu a polêmica entrevista a seguir, rodeado de obras de arte garimpadas em leilões e feiras de antiguidades.

 

Sem rédeas, Aguinaldo assume um dos principais traços de sua personalidade: o gosto pela polêmica. “Eu não rejeito confusão, claro, adoro polêmica, sou barraqueiro mesmo”, diz ele, às gargalhadas, sentado no amplo sofá de sua sala.

 

Essas polêmicas se traduzem em repercussão aos seus trabalhos. O próximo deles, a minissérie “Cinquentinha”, da Globo, com previsão de estreia para 8 de dezembro, é um claro exemplo disso. Marília Pêra, que seria uma das protagonistas, abandonou as gravações por achar que sua personagem não teria o devido destaque. Aguinaldo dispara: “Marília é meio um Tim Maia da TV. O problema é que ela, quando não larga o trabalho, o faz muito bem, então você tem que perdoar”, diz.

 

Aos 66 anos ele declara guerra ao “politicamente correto” que, segundo ele, tem dominado a pauta da teledramaturgia. “Isso está matando as novelas”, dispara. E não poupa palavras para criticar a nova Helena de Manoel Carlos, interpretada por Taís Araújo em “Viver a Vida”, da Globo. “O que falta à personagem é o componente racial. Você não pode ter uma atriz negra na novela como se fosse uma branca”, diz ele, com a autoridade de quem já assinou seis minisséries e 13 novelas, cinco das quais entre as doze de maior audiência na TV brasileira, “Roque Santeiro”, “Tieta”, “Pedra sobre Pedra”, “Fera Ferida” e “Vale Tudo”, esta última escrita em parceria com Gilberto Braga.

 

Lançando seu 15º livro, “Deu no Blogão”, uma reunião de alguns dos textos mais comentados no blog que mantém há dois anos, Aguinaldo fala sobre essas e outras polêmicas que o rondam.

 

iG: “Cinquentinha” só estreia em dezembro e já está cercada de polêmicas. Gosta disso?
Aguinaldo Silva: Não rejeito confusão, claro, adoro polêmica, sou barraqueiro (risos). Bate-boca é comigo mesmo. Me orgulho de vender meu peixe. Mas não apareço porque gosto de aparecer. O que aparece é o meu trabalho.

 

iG: O que você acha de a Marília Pêra ter desistido porque achou que seu papel era secundário?
AS:
Me preocupei em contar as falas das três principais personagens, e todas tinham o mesmo peso. Ela, Susana Vieira e Marília Gabriela. Ela não se sentiu bem, percebi isso desde a primeira reunião com elenco, não estava empolgada. E daí usou esse argumento, falando que a personagem era menor… Fiquei chateado porque ela assinou um contrato para fazer isso. Tem que pensar bem quando se assina um contrato, para não dar vexame depois.

 

 

iG: Voltaria a escrever um papel para ela, numa outra novela?
AS:
Olha, não sei. Na verdade, se você der uma olhada na sua história pregressa, ela já largou projetos, peças, filmes… Marília é meio um Tim Maia da TV. O problema é que, quando não larga o trabalho, ela o faz muito bem, então você tem que perdoar, fazer o quê? Nas três vezes que tentei ver um show do Tim, não consegui, porque ele não apareceu. Marília falta aos compromissos, como fazia Tim.

 

 

iG: O que é mais difícil, lidar com ego de atores ou definir um final coerente para seus personagens?
AS:
Ah, definir final coerente, pelo menos no meu caso. Não gosto de intimidade com atores. Qualquer dúvida deles com relação ao trabalho, tem que ser pelo intermédio de Wolf Maya, que é meu diretor. Se tiver que dar atenção a todos, não tenho tempo para escrever.

 

 

iG: Quem é o melhor autor de novelas hoje?
AS:
Não me faça essa pergunta! Que difícil. Nesse momento, se eu citar um nome estaria sendo apenas gentil. Todos os autores das oito se equivalem, cada um com seu estilo. Mas veja, sou o único autor de novela que só escreve para o horário das oito, em trinta e poucos anos de TV.

 

 

iG: Segundo o Ibope, das 12 novelas de maior audiência na TV, cinco são suas. Tem o segredo para ganhar o público?
AS:
Tenho sim. Minhas novelas são extremamente populares, não escrevo apenas para a elite. Existem autores brilhantes, como Manoel Carlos, que eu adoro, que nunca escreveram um sucesso de audiência porque são novelas mais voltadas à elite. O Leblon não é o Brasil. Há muito mais Baixadas Fluminenses do que Leblons pelo país.

 

 

iG: Você já frequentou a Baixada Fluminense?
AS:
Claro que já, principalmente quando fui repórter policial. Eu ia muito à Baixada. Como também vou ao Leblon!

 

iG: Há alguns anos, você criticou o fato de as novelas terem casais gays em suas tramas. Acha que há um exagero?
AS: Não é que haja um exagero. Eu não aguentava mais ver casais gays bem comportados, como reprodução de casais heterossexuais. É como essa novela atual do Maneco (“Viver a Vida”). O que falta a essa Helena (papel de Taís Araújo) é o componente racial. Você não pode ter uma atriz negra na novela como se fosse uma branca.

 

iG: Por que não?
AS:
Quantas vezes ouvi pessoas se referindo a Naomi Campbell como a modelo ‘neguinha’! É preciso levantar essa questão das minorias. É como tratar casal gay como coisa comum. Por mais que os gays se comportem, serão sempre suspeitos. Essa é a verdade. Os jovens me olham com desconfiança, acham que vou atacá-los a qualquer momento (risos).

 

iG: Falando em Manoel Carlos, você gosta do ‘elemento social’ inserido nas novelas? Abordar, por exemplo, síndrome de Down, alcoolismo etc?
AS:
Odeio o politicamente correto. Isso está matando as novelas. O folhetim precisa ser politicamente incorreto, senão deixa de ser novela. Me recuso a entrar nessa onda. Anão é anão e ponto.

 

iG: Mudando de assunto, quando você percebeu que estava rico?
AS:
(risos) Não sei se sou rico, acho que não. Para os padrões brasileiros, tudo bem, sou sim. A conta do PT diz que quem ganha mais de um milhão e meio de reais é rico. Então, para os petistas, sou rico. A gente percebe que está bem quando perde a vontade de comprar. Fui a um outlet em Paris, recentemente, fiquei lá o dia inteiro e só comprei uma gravata. Não me interessei por nada.

 

iG: Está namorando?
AS:
As pessoas da minha idade não precisam de namorados, precisam de enfermeiros. Tenho quase 66 anos, mas me sinto ‘cinquentinha’ fisicamente.

 

iG: Por que resolveu reunir num livro alguns textos do seu blog?
AS:
Porque na internet as palavras ficam no ar e a palavra escrita tem peso maior do que qualquer outra coisa. Meus textos repercutem muito.

 

iG: Saberia dizer por quê?
AS:
Meu blog é provocativo, falo de costumes com uma linguagem de duplo sentido, abusando dessa provocação. Tenho acesso diário de 130 mil internautas.

 

iG: Aproveitando que você está sempre entre Rio e Lisboa, o que falta ao Brasil que Portugal tem de sobra? 
AS:
Falta ao Brasil uma noção de ética, que os portugueses cultivam. Ser ético no Brasil é sinônimo de ser otário. E quanto a Portugal, falta a eles bastante bunda! É o que o Brasil tem de sobra (risos).


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Matéria original

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