Ainda não teve um bebê? Então você é descartada

Jennifer Aniston falou sobre ser “julgada” por não ter filhos. Ela tem razão. As mulheres sem filhos são consideradas “submulheres”

Por Barbara Ellen

Jennifer Aniston falou recentemente sobre ser criticada por não ter filhos. Ela disse que não sentia que tivesse “falhado em alguma parte de seu feminismo ou em ser mulher” porque não “pariu um filho”. Aniston continuou: “Eu pari muitas coisas. Sinto como se fosse mãe de muitas coisas”. Ela acha que não é justo pressionar as mulheres por não terem filhos.

Enquanto alguns podem rejeitar isso como blablablá californiano, eu acho interessante e corajoso. Primeiro, todo o poder para Aniston por “ser sua dona” e não se deixar esmagar pelo enfoque mundial incansável sobre seu fascinante útero infrutífero. Bom para Aniston, não apenas por enfrentar isso, mas também por levantar pontos sábios sobre o que eu chamaria de “submulheres” e as infindáveis armadilhas que a sociedade arma para elas.

Por que as mulheres sem filhos, especialmente quando amadurecem e passam da idade de tê-los, ainda são consideradas supérfluas, murchas, carentes, de uma maneira que os homens sem filhos raramente – ou nunca – seriam rejeitados? Enquanto um homem sem filhos continua sendo apenas um homem, a mulher sem filhos com frequência é vista como alguém que falhou de certa forma. Deixando de lado as dificuldades médicas, enquanto a falta de filhos masculina é vista em geral como uma decisão, a da mulher é considerada qualquer coisa desde um castigo (uma carreirista ameaçadora), um erro (idiota, desorganizada), um estado forçado (incapaz de agarrar um homem) ou tudo isso ao mesmo tempo.

De maneira reveladora, seja como for que uma mulher chegue a essa situação, ela se torna uma “submulher” porque se tornou sub-humana – tendo falhado no teste mais importante de seu destino biológico. O que é isso? Por que a folha de testes procriativa em branco de um sexo continua sendo tão mais carregada moralmente que a do outro? Além disso (não que eu queira que isso aconteça), por que não há uma cultura equivalente de “sub-homens” sem filhos?

É claro, para algumas pessoas, a ausência de filhos é realmente a liberdade de filhos (para não falar em todas as outras realidades complicadas). No entanto, estou falando sobre mulheres que esperavam ter filhos e se veem interrogadas e ameaçadas porque não tiveram. Nesse contexto, o comentário de Aniston sobre não sentir que “falhou em alguma parte de seu feminismo” é intrigante. Um dia, o feminismo pode ter sido em parte (e de forma muito simplista) definido como mulheres que não têm filhos e se concentram em outras partes da vida. Ou o feminismo sugeria que não fazia sentido ser levada como uma sonâmbula, ou carregada em um trem, para a maternidade. O pêndulo balançou no outro sentido, com a falta de filhos hoje considerada antifeminista, e até antifeminina? Alguns insistem em pensar que uma mulher só é realmente feminina quando seu organismo cuspiu um ou dois rebentos?

Seguindo com os comentários de Aniston sobre ter “parido” e “criado” muitas coisas (supostamente projetos profissionais), seu ponto principal é sólido, mas quão revelador o fato de que ela sentiu necessidade de empregar o imaginário de parto/materno. Quando você ouviu pela última vez um homem dizer que, embora não tenha filhos, “ejaculei esperma que penetrou com sucesso o óvulo de muitos projetos”? Mesmo quando os homens “geram” esquemas – algo que não se ouve com frequência –, é apenas uma expressão, sem um sentido anexo de angústia ou defensibilidade. O fato de que qualquer mulher sem filhos se sinta levada a legitimar suas conquistas apropriando-se de terminologia maternal me enfurece em nome delas.

Portanto, o último ponto de Aniston foi o único inválido. Ela diz que é injusto que as pessoas as pressionem a ter filhos, mas não são realmente as “pessoas”, são? Falando de modo geral, os homens não sofrem uma pressão constante para explicar sua falta de prole. São geralmente as mulheres sem filhos, e não apenas as famosas, que enfrentam as perguntas invasivas, comentários maldosos, piedade humilhante, e até crueldade e gratificação.

Tudo isso está acontecendo quando as razões para a falta de filhos nas mulheres são geralmente complexas e inúmeras, muitas vezes indo muito além da opção pessoal, às vezes profundamente dolorosas e acima de tudo são as preocupações mais particulares. O interrogatório em grande escala, as armadilhas e a propriedade moral comunitária da mulher sem filhos devem parar. O útero não utilizado de uma mulher pode ser qualquer coisa, desde uma opção pessoal até o drama de sua vida e todas as variações intermediárias, mas pertence somente a ela.

 

Fonte: Carta Capital

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