As Ganhadeiras de Itapuã comemoram título da Viradouro no Carnaval carioca

Dezenas de pessoas se reuniram em Itapuã para celebrar vitória e entoar samba-enredo

Por Marília Moreira, do Correio 24 Horas

Foto: Tiago Caldas/CORREIO

Parecia uma sucursal da quadra da escola de samba Unidos da Viradouro. Em Itapuã, mais precisamente no Bar da Tina, a emoção foi grande para comemorar o título de campeã do Carnaval carioca, que homenageou o grupo baiano As Ganhadeiras de Itapuã.

Com o samba enredo na ponta da língua, e um carro de som na rua para ajudar, a galera se juntou no local desde cedo, para acompanhar a apuração, no início da tarde desta quarta-feira de Cinzas. Apesar do nevorsismo, a esperança da vitória era grande, ainda mais depois do Prêmio Estardarte de Ouro, do jornal O Globo, considerado um ótimo termômetro do desfile. “Nós merecíamos esse presente, Itapuã merecia”, disse Dona Lucinha ao microfone, que participou do desfile no Rio, e no Carnaval de Salvador se apresentou nos bairros de Itapuã e da Liberdade junto ao grupo.

Dona Mariinha, 85 anos, outro patrimônio do grupo, disse que só não chorou com a vitória porque não é de chorar. Mas não parava de agradecer. Ela, que também esteve no desfile no domingo, vai voltar com um grupo para o desfile das Campeãs, neste fim de semana. A expectativa é que a comitiva supere as 30 pessoas que viajaram na semana passada. “Está todo mundo emocionado, não tem como ir menos”, aposta Salviano Filho, diretor administrativo e artísitico do grupo.

Mariinha contou que perdeu a filha Solange há oito meses, quando os carnavalescos da Viradouro anunciaram a homenagem. Mesmo desanimada, a comunidade manteve o desfile à pedido de Solange, como uma maneira de levar a história de luta das baianas para o mundo.

“Isso é por ela, e para ela. Depois que ela faleceu, perdemos o brilho, não queríamos nem mais desfilar. Mas foi ela mesmo quem nos incentivou a todo tempo, e nos disse que íriamos ganhar”, lembra Ana Lúcia, amiga pessoal de Solange e ex-moradora do bairro.

Ana Lúcia foi uma daquelas que preferiu evitar ficar na frente da TV na hora da apuração. No Bar da Tina, foram duas, instaladas na varanda. “Trouxe de casa sem minha esposa ver”, confessou Paulinho do Apito, que no próximo dia 14 promove uma festa em homenagem às Ganhadeiras de Itapuã na Rua Alto da Bela Vista, a partir das 17h. “Essa vitória é motivo de orgulho para elas, e para o bairro. Itapuã é um bairro que luta pela cultura, e assim como tantos outros na cidade, é pouco visto”, continuou Paulinho.

O sentimento de realização era geral. “Estou feliz para caramba hoje, tem gente que não liga para cultura do bairro, mas ela precisa ser mais valorizada. Ela é muito forte, e nos proporciona presentes como esse”, comentou o músico André Barará, que deixou de tocar no Carnaval para assistir ao desfile no domingo. “Não aguentei, fiquei muito emocionado, mandava vídeo para todo mundo, fiquei igual a pinto no lixo”, recorda.

Com o enredo De Alma Lavada, a escola destacou o protagonismo feminino na história brasileira, a partir da história das baianas, descendentes de mulheres escravizadas que lavavam roupa na Lagoa do Abaeté e faziam outros serviços na capital baiana para comprar a alforria. Além de visitas ao bairro, nas quais entrevistaram moradores e as integrantes do grupo, os carnavalescos também usaram a pesquisa de doutorado em etnografia musical da professora Harue Tanaka, desenvolvida na Universidade Federal da Bahia. Este é o segundo título da Viradouro, que só havia vencido o Grupo Especial do Rio em 1997.

Quando eles estiveram aqui, saíram dizendo que nossa história rendia não só um, mas três carnavais, tamanha é a força e importância da nossa história – Salviano Filho, diretor administrativo d’As Ganhadeiras de Itapuã

Em segundo lugar, com mesmo número de pontos, ficou a Grande Rio, que homenageou o pai de santo baiano Joãozinho da Gomeia. O desempate foi no quesito evolução.

O samba da Viradouro teve influência do afoxé, e o desfile contou com participações da cantora Margareth Menezes, que saiu como destaque do carro que lembrou as cirandas de roda à beira do mar aberto; e da dançarina Lore Improta, que viveu a Rainha do Carnaval de Itapuã.

O desfile mostrou atividades que as Ganhadeiras exerciam como lavar roupa, carregar e vender água, cozinhar e vender alimentos, fez referências à Lagoa do Abaeté, à liderança negra Luiza Mahin e ao bloco afro Malê Debalê. Ao público, foram oferecidas cocadas.

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