Ataques à ciência têm a diversidade como alvo, afirma Nilma Lino Gomes

Professora Faculdade de Educação fez a conferência de abertura da segunda edição do Congresso de Mulheres na Ciência

Por Ewerton Martins Ribeiro, Da UFMG

Nilma Lino Gomes- mulher negra, de cabelo cacheado curto, usando camiseta estampada e jaqueta preta- sentada diante de um microfone
Nilma Lino Gomes: ciência e poder são inseparáveis (Foto: Foca Lisboa)

A professora Nilma Lino Gomes, da Faculdade de Educação, ministrou na manhã desta sexta-feira, dia 30, a palestra de abertura da segunda edição do Congresso de Mulheres na Ciência, iniciativa de estudantes e pesquisadoras da UFMG, cuja programação termina neste sábado, 31. Partindo do mote Quando a diversidade interroga a ciência, Nilma falou sobre “modos diversos de pensar e fazer ciência e política”, pensando nos “coletivos diversos” – negros, pobres, mulheres e LGBTs – que, nos anos recentes, passaram a integrar mais fortemente o universo acadêmico e científico.

No início de sua exposição, Nilma falou sobre como os sujeitos considerados “diversos” sempre foram mantidos fora do mundo das universidades e do campo da ciência. Esse processo, segundo ela, começou a mudar nos anos 2000, na proporção de um “aumento da consciência democrática no Brasil e em outros lugares do mundo”. “Quanto mais se compreendia os nefastos efeitos da globalização capitalista, mais os sujeitos pertencentes aos coletivos diversos passaram a compreender que a ciência e o poder são inseparáveis”, disse ela, que foi reitora da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab) e ministra das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos.

A partir dessa época, disse Nilma, “os sujeitos desses coletivos sociais diversos começaram a se organizar e a furar o cerco das profecias de dominação dos grupos que detinham e detêm o poder do campo científico e a entrar para as instituições responsáveis no Brasil pela produção e circulação da ciência, ou seja, as universidades”.

A professora também ponderou que, quando passam a acessar as universidades, esses grupos começam a demandar, além de acesso, mudança. “Quando os coletivos sociais diversos demandam a universidade como direito, querem outra universidade, cujas estruturas, currículo e gestão deem conta da presença dessa diversidade como dignidade”.

Caráter seletivo

De acordo com a professora, a reação conservadora que investe contra as universidades e a ciência brasileiras tem caráter seletivo. “Sabemos que há áreas e campos científicos dentro das universidades públicas que já estão mais do que privatizados, e cujo diálogo acadêmico e científico sequer é estabelecido com a ciência brasileira, mas com as fundações internacionais, as empresas capitalistas, o capital científico internacional. O alvo dos ataques à ciência não é a toda e qualquer ciência”, disse Nilma. Ela especificou: “O alvo é aquela parte da ciência que já foi impactada pela presença da diversidade, a parte que já foi indagada e, paulatinamente, vem sendo mudada pela diversidade. Não é coincidência que as áreas das humanidades e sociais sejam as mais visadas e atacadas.”

Para a professora, “é contra essa universidade marcada pela entrada de estudantes pobres, negros, indígenas, do campo, pessoas com deficiência, LGBT que a extrema-direita e os capitalistas se irrompem. Eles sabem a quem vão atingir ao destruir direitos, acabar com políticas de ações afirmativas, reduzir o orçamento, acabar com as bolsas de pesquisas na graduação e na pós, destruir a Capes e o CNPq, realizar intervenções autoritárias nos resultados das eleições para reitores, intrometer-se na gestão e indicar quem ocupará os cargos de poder e decisão e privilegiar somente as chamadas áreas de economia e desenvolvimento do país. E prosseguiu: “Os ataques à ciência e à universidade pública que vivemos hoje tem como foco essa universidade e essa ciência impactada pela diversidade”.

Ocupação

Em sua fala, a professora também defendeu que é um direito dos coletivos sociais diversos, que explicitam um compromisso ético e político com a produção do conhecimento, ocupar lugares de visibilidade, saber e poder na ciência. “Ocupar, mas não para repetir a experiência hegemônica, os privilégios e as desigualdades no campo científico, e, sim, para reinventar a ciência por dentro, a partir das experiências de conhecimentos e práticas produzidos e construídos pelos sujeitos nas lutas sociais, nos movimentos sociais, nas ações coletivas, na vida cultural, na experiência de ser considerado diferente, em um país no qual ser negra, mulher, pobre, trabalhadora e LGBT é ser considerada inferior e desigual.”

Sobre essa ocupação, Nilma Lino Gomes lembrou que avanços já foram alcançados, mas que ainda não se pode comemorar. “Os lugares da diversidade e dos coletivos diversos na ciência ainda são poucos, restritos a algumas áreas específicas, não alcançam grande circulação. As publicações de sujeitos diversos no campo científico não acompanham a mesma capacidade de circulação nacional e internacional, não são privilegiadas pelas grandes editoras, não são traduzidas para o inglês. Com isso, não entram com a mesma força no campo internacional”, disse. Nesse sentido, finalizou, “todas nós precisamos estar juntas – ainda mais em tempos de destruição da democracia e dos direitos, como os que vivemos. Precisamos ajudar umas às outras a ter coragem de falar, atuar, produzir conhecimento. Precisamos levantar as nossas vozes insurgentes”.

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