A cada desocupação a cidade diz: “O Centro não é para gente como vocês”

Ontem a cidade de São Paulo mostrou a verdadeira face, que nós conhecemos, mas que ela gosta de esconder. As imagens falam por si só (a bela e triste videoreportagem da Ponte Jornalismo). Ontem, mulheres, crianças, idosos e homens da classe trabalhadora cometeram o pecado de não querer mais pagar o aluguel parasitário, o pecado de querer morar perto do trabalho, o pecado de querer participar da vida da cidade, de seus centros de lazer e cultura, ontem, as pessoas que cometeram o pecado de ocupar um prédio abandonado há dez anos foram reprimidos com a dureza e desumanidade típica da força policial desta cidade, deste estado e deste país para com os seus filhos pobres. As cenas de resistência revoltam e inspiram. Abaixo copio a reflexão e o desabafo da companheira Vanessa Gravino. O problema é conhecido e as soluções também – no espaço entre os dois está a necessidade de lutar.

Por Vanessa Gravino

Apesar de cenas de despejo e desapropriações se tornarem cada vez mais recorrentes, ainda fico chocada e triste com a ação policial diante de famílias sem-teto/sem-terra que ocupam lugares para viver. Machuca olhar para pessoas sendo despejadas diante de uma cidade (estado e país), que não garante moradia digna para sua população. O centro da cidade não é para os pobres morarem. Se for “pobre e preto”, então, esqueça!

E de onde saem esses homens armados de violência? Fiquei imaginando que muitos policiais militares são pessoas que já moraram, ou ainda moram, nas periferias. Sabem o que significa a vida afastada dos centros urbanos e têm baixos salários. Como podem agir com tamanha truculência e violência? O despejo no centro de SP foi acompanhado por bombas, cassetete e muita pancada! Mesmo com a presença de crianças.

Quando penso nisso a conta não fecha…

A conta só fecha quando a gente olha para a mídia, pois ela procura convencer as pessoas de que aqueles(as) que ocupam prédios vazios são criminosos(as), invasores(as). A conta só fecha porque a TV divulga que o lugar de negros e negras é na periferia e que sua função,ainda, é servir os(as) brancos(as). A conta só fecha porque PMs recebem treinamento que ensina a obedecer os ricos e reprimir os pobres… A conta fecha porque vivemos numa sociedade onde quem tem grana usufrui todos os direitos, já os pobres têm o “direito” de ficarem quietos.

Para construir uma sociedade mais justa e igualitária defendemos:

A desmilitarização da polícia!
Democratização dos meios de comunicação!
Moradia digna para a população!
Reforma urbana – que passe pelo fim da especulação imobiliária!
Combate a todas as formas de opressão!

E, só para finalizar com aquele sentimento de “minuto de silêncio”: na terça-feira, 16 de setembro de 2014, enquanto havia o despejo de 800 pessoas que ocupavam um prédio no centro de São Paulo, o Supremo Tribunal Federal concedia auxílio-moradia para todos os juízes federais no valor de 4.377,73 reais, auxílio que os juízes estaduais de 20 estados já usufruem. Enquanto os mais pobres são expulsos de maneira violenta das habitações em que viviam, mais recursos são direcionados para altos funcionários do judiciário, que certamente não possuem problemas de moradia.

 

 

Fonte: Negrobelchior.

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