Conheça o The Elders: ex-líderes que buscam a paz mundial

Por: LUÍS EDUARDO GOMES

Na região de Amhara, na Etiópia, metade das meninas se casa antes de completar 15 anos. E não se trata de uma exceção. No mundo inteiro, cem milhões de crianças devem se casar antes do 15º aniversário na próxima década. Chamar a atenção para questões como esta é o objetivo do The Elders (Os Anciões, em tradução livre), um grupo seleto formado por pessoas que um dia já foram responsáveis por revoluções ou ajudaram a solucionar guerras civis em seus países. Hoje, usam sua influência para buscar paz e direitos humanos pelo mundo.

“Nós temos que mudar a ideia de que algo chamado ‘tradição’ não pode ser mudado”, escreveu Gro Brundtland, ex-premiê da Noruega e hoje uma “elder”. A frase pode servir de resumo da sua passagem pela Etiópia para conhecer a situação de Amhara pessoalmente. Junto dela estavam Desmond Tutu, arcebispo anglicano sul-africano e vencedor do Nobel da Paz, e Mary Robinson, ex-presidente da Irlanda – ambos membros do The Elders. O casamento infantil na Etiópia é uma das frentes de trabalho da organização – que atualmente também concentra esforços na luta pela paz no Sudão do Sul, além de marcar presença na Rio+20.

Somam-se aos três já citados o ex-presidente brasileiro Fernando Henrique Cardoso, o ex-presidente americano e vencedor do Prêmio Nobel da Paz Jimmy Carter, o ex-secretário-geral da ONU Kofi Annan, o ex-primeiro-ministro da Algéria e atual enviado da ONU para a Síria Lakhdar Brahimi, a ativista e fundadora da Associação de Mulheres Autônomas da Índia, Ela Bhatt, e o ex-presidente da Finlândia e vencedor do Nobel da Paz Martti Ahtisaari. Além de Nelson Mandela, um dos pais da ideia.

A ativista de oposição de Mianmar e também vencedora do Nobel da Paz Aung San Suu Kyi era uma membra honorária do grupo até ser eleita para o Parlamento de seu país em 2012.

O The Elders surgiu de uma conversa do músico britânico Peter Gabriel com seu compatriota bilionário Richard Branson sobre como, na antiguidade, sabedoria era significado de poder. Em dúvida ou em dificuldades para solucionar conflitos, muitas comunidades se voltavam para seus membros mais velhos em busca de aconselhamento, de soluções, de palavras decididas que mostrassem o caminho certo a ser percorrido. Daí surgiu a ideia para se formar um grupo de pessoas que pudesse servir de alicerce para a “aldeia global” contemporânea.

Eles então procuraram alguém que pudesse representar esse ideal de sabedoria nos dias de hoje. Mandela abraçou a ideia. Com a ajuda de sua atual mulher, a ativista e ex-ministra moçambicana Graça Machel, e de seu companheiro na luta para por fim ao Apartheid, Desmond Tutu, Mandela começou a montar The Elders, que seria apresentado oficialmente em Johanesburgo, na África do Sul, em 2007, e que em 2012 completa cinco anos. Em seu site, a organização descreve seus membros como figuras que ajudaram a promover a paz, reconstruir nações, promover revoluções sociais, defender pioneiramente o direito das mulheres. Pessoas, capazes de liderar pelo exemplo e de inspirar outros a seguir suas causas.

Trabalho pelos direitos humanos

Em janeiro de 2011, Jimmy Carter e Kofi Annan visitaram o Sudão do Sul. Na época, a mais nova nação do mundo ainda era uma região separatista do Sudão que aguardava um plebiscito que traria sua independência após longos anos de conflitos armados. Carter e Annan serviram como observadores internacionais no referendo que culminaria na secessão do maior país africano, em julho do mesmo ano. Só que a independência não encerrou a briga entre o Sudão do Sul e o seu novo vizinho e antigo irmão. Mais de um ano depois da visita de Carter, o grupo The Elders segue tentando atrair a atenção internacional para a questão. Da mesma forma, em junho, na conferência Rio+20, FHC, Brundtland e Mary Robinson se juntaram a jovens no movimento Elders+Youngers para promover a necessidade de o mundo rumar na direção do desenvolvimento sustentável. O parecer do grupo: a Rio+20 não foi longe o bastante.
O grupo também trabalha pela recuperação Costa do Marfim, que eclodiu em violência após as eleições de 2010; busca a união entre gregos e turcos cipriotas e também entre norte e sul-coreanos; tenta ajudar nas negociações entre palestinos e israelenses; além de trabalhar para solucionar as crises humanitárias no Sri Lanka e no Zimbábue. Seus princípios são: representar uma voz independente, desligada de interesses nacionais; promover os interesses da humanidade, os direitos humanos universais; ouvir os dois lados de um conflito – não importa quão impopular isso possa ser; agir com firmeza, falar verdades difíceis e enfrentar tabus.

Os integrantes do grupo mantêm contato regular uns com os outros e se encontram duas vezes por ano para revisar suas atividades, discutir prioridades e planejar futuros trabalhos. Quando vão a campo, eles usam sua influência para tentar colocar os cidadãos em comum em contato com seus líderes. Assim, criam espaço para o surgimento de políticas sobre temas difíceis. Ou trazem à tona assuntos importantes, mas negligenciados pela cobertura midiática.

 

Fonte: Terra

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