‘Convergência de dois tipos de dominação’, por Ignacio Cano

Contra atuação de traficantes como milicianos, Estado deve investigar, repreender e regular atividades econômicas

Por Ignacio Cano Do O Globo

A notícia de que os traficantes da Rocinha estão obrigando os comerciantes a comprar de determinados fornecedores representa um passo a mais na convergência de dois tipos tradicionais de dominação ilegal sobre as comunidades populares do Rio. Desde o surgimento das milícias como fenômeno consolidado, ficou claro que algumas delas, a despeito de sua tentativa de se apresentar como uma cruzada libertadora em relação ao tráfico, vendiam drogas ou toleravam essa atividade em troca de pagamentos regulares, numa espécie de “arrego miliciano”.

Uma das diferenças entre as duas formas de dominação era justamente o fato de que os traficantes não costumavam se intrometer na vida dos moradores, desde que estes não atrapalhassem o seu negócio, enquanto que a voracidade econômica da milícia impunha taxas e ágios a atividades econômicas. À ausência do estado de direito, somava-se então a ausência do mercado, proscrito pela força das armas, com o resultado de um incremento no custo da vida para os moradores.

No fundo, a dominação de milícias, tráfico, grupos de extermínio sobre as comunidades apresenta diversas faces, mas uma só natureza: a privação completa dos direitos civis básicos e frequentemente também dos direitos econômicos.

A reação do Estado deve passar não apenas pela investigação e a repressão das condutas ilícitas, mas pela regulação das atividades econômicas a fim de dificultar essa imposição de monopólios coativos. Afinal, o crime organizado, desde as empreiteiras que pagam propinas para obter obras aos traficantes-milicianos que achacam os moradores, não morre pelas armas, morre pelo bolso.

 

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