Cultura é chave e porta para o país

Argamassa da coesão nacional, abriga e processa as nossas identidades

Atravessamos uma crise política e institucional sem precedentes, marcada por retrocessos civilizacionais, ameaças autoritárias e investidas do ultraneoliberalismo sobre conquistas sociais, riquezas naturais e ativos econômicos do povo brasileiro. Dramas como as tragédias ambientais, a fome, o desemprego, a distopia e o pessimismo colocam em dúvida nossa capacidade de sobreviver como nação livre e soberana.

Diante de um impasse dessa proporção, setores progressistas da sociedade reconhecem a urgência de pensar e propor caminhos para a reconstrução e aprimoramento da democracia brasileira como base para uma ação política que responda às nossas grandes necessidades humanas, sociais, econômicas, políticas e culturais.

As soluções para tantos problemas devem ultrapassar as disputas políticas e econômicas imediatas porque demandam reflexão, conhecimento e elaboração. A construção de alternativas para uma sociedade justa e igualitária passa pela cultura, pois precisamos enfrentar chagas históricas, como as perversões escravagistas e a herança colonial que ainda nos definem e nos limitam.

A cultura é argamassa da coesão nacional; é espaço que abriga e processa as identidades culturais regionais, étnicas, etárias, de gênero e quantas houver; é espaço de comunicação e de ressignificação de visões sobre a vida coletiva. É uma chave para a emancipação e porta para o século 21, abrindo oportunidades de inserção soberana do Brasil no mundo.

Precisamos olhar sim para nossa valiosa bagagem histórica, como a Semana de Arte Moderna de 1922
—às vésperas do seu centenário—, e para o nosso processo cultural, particularmente para a experiência criativa das artes, as políticas de Getúlio Vargas e a trajetória desde o fim da ditadura militar.

Mas, de forma mais ampla, precisamos refletir sobre a guerra cultural, arma de um projeto global antidemocrático e antipopular da extrema-direita, que promove a corrosão da vida civilizada, da democracia e das ideias de justiça e igualdade no Brasil e no mundo.

É para isso que estão reunidos, desde segunda-feira (8), grandes nomes da cultura, política e sociedade civil nos Seminários Cultura e Democracia. Entre eles, o ex-ministro da Cultura Gilberto Gil; o sociólogo e escritor italiano Domenico De Masi; a ministra da Cultura da Bolívia e líder indígena, Sabina Orellana; o economista Luiz Gonzaga Belluzzo; a filósofa Marilena Chauí; o representante da Fundação Friedrich Ebert, Christoph Heuser; o presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), Renato Janine Ribeiro; a poeta mexicana e representante dos povos indígenas na ONU, Irma Pineda; o professor universitário Muniz Sodré; e muitos outros pensadores, ativistas, pesquisadores e estudiosos nacionais e internacionais.

É hora de acolher colaborações de todo o universo intelectual, político e cultural da sociedade brasileira. Promover um diálogo com enfrentamento de ideias e, ao mesmo tempo, reconhecer territórios comuns que sedimentem uma base coesa, em torno da democracia, capaz de ajudar o país a se reencontrar e a superar a distopia.

Juca Ferreira

Sociólogo e coordenador dos Seminários Cultura e Democracia, foi ministro da Cultura (2008-10 e 2015-16, governos Lula e Dilma) e secretário municipal de Cultura de São Paulo e Belo Horizonte

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