‘Decidi ser linda’: Albina conta como superou preconceito para virar top model

Desfilando as roupas de um conhecido estilista da África do Sul, a advogada e modelo sul-africana Thando Hopa, que é albina, é hoje uma referência para crianças vivendo com albinismo no país. Em depoimento à BBC, ela conta como superou o preconceito e discriminação sofridos na infância e “decidiu”, um dia: “Vou ser estonteantemente linda”.

Do Ceert 

O albinismo – transtorno genético caracterizado por falta do pigmento melanina na pele, cabelos e olhos – é relativamente raro na maior parte do mundo. Estatisticamente, entre uma em 17 mil e uma em 20 mil pessoas são albinas.

No entanto, índices do transtorno em algumas regiões africanas são bem mais altos. Segundo estimativas, uma em cada 4 mil pessoas na África do Sul seria albina e, na Nigéria, o índice seria de um albino em cada 5 mil habitantes.

Na Tanzânia, porém, a incidência do transtorno seria bem mais alta. Segundo estudo publicado em 2006 pela revista científica BMC, uma em cada 1.400 pessoas no país seria albina. O cálculo foi feito com base em dados incompletos mas, se for correto, haveria na Tanzânia uma população de mais de 40 milhões de pessoas, cerca de 30 mil albinos.

Especialistas suspeitam que maiores índices de albinismo estejam associados a uma maior incidência de casamentos consanguíneos em uma população.

Em vários países africanos, pessoas albinas tendem a ser discriminadas pela sociedade e até por suas próprias famílias. Casos de infanticídio de bebês albinos são comuns e muitas famílias deixam de enviar filhos albinos à escola por acreditarem que suas chances de conseguir emprego são mínimas.

Na Tanzânia, onde muitos acreditam que partes de corpos de albinos tragam poder e sorte, pessoas com albinismo são mortas e seus corpos usados em rituais supersticiosos.

Com seu trabalho, Hopa espera combater a ignorância e oferecer um modelo positivo para jovens crescendo com albinismo na África hoje.

A seguir, o depoimento de Hopa:

‘Nunca vi uma menina tão linda’

“Desde muito pequena, meus pais sempre se esforçaram para que eu não me sentisse diferente. Mas, infelizmente, quando fui à escola e fui apresentada à sociedade, crianças, em particular, começaram a agir de forma estranha em relação a mim. Me xingavam, não queriam tocar em mim. Depois, comecei a perceber que mesmo pessoas bem mais velhas faziam coisas que eu não entendia. Cuspiam quando eu passava. Me disseram que era para evitar má sorte.

Um dia, aconteceu uma coisa muito estranha. Acho que eu tinha sete anos, estava voltando da escola. Uma mulher parou e começou a gritar: ‘Meu Deus, é a filha do diabo, o que ela está fazendo comigo?’

Nunca me senti tão isolada. Naquele momento, me dei conta de que ela estava falando de mim. Aquilo me afetou tão profundamente que quando cheguei em casa disse à minha mãe que não queria mais ir à escola.

Eu não disse por quê. Mas o que mais me incomodava era que eu tinha sido criada com um forte senso de comunidade e eu não entendia como essa comunidade permitia que eu passasse por aquilo e ninguém repreendia essa mulher.”

Alguma coisa na criação que Thando Hopa recebeu, no entanto, permitiu que ela resistisse às agressões e insultos.

150820142117_sp_thando_hopa_2_439x549_cortesiashawmedia

“Minha mãe nunca disse nada, nunca sentou comigo para me preparar ou dizer coisas do tipo: ‘Você vai começar a escola, você tem uma aparência diferente.’ Acho que essa foi a forma que eles encontraram de me educar. Não queriam que eu me sentisse diferente.

Quando comecei a perceber, e as inseguranças começaram a aparecer, corri para o meu pai. Chorava, chorava, e dizia: ‘Por que não sou igual a todo mundo? ‘Ele respondia: ‘Mas você é tão linda, nunca vi uma menina tão linda como você!’ E eu respondia: ‘Não, você está mentindo, você está mentindo!’ Mas ele repetia a mesma coisa, continuamente. Nunca parou. E embora eu não estivesse consciente na época, acho que isso me fortaleceu.

 

+ sobre o tema

Câmara pretende ouvir Janot sobre equiparação de homofobia a racismo

A Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara...

Não entendemos errado, o que aconteceu com Angelo Assunção foi racismo

A sofisticação do racismo brasileiro está no fato de...

Gordofobia, racismo, preconceito: Há cura para as doenças sociais?

Especialistas acreditam que só com punição será possível coibir...

para lembrar

Atriz negra albina fala sobre preconceito: ‘Tratam como doença’

Desde criança, Thielle Luize chama a atenção por onde passa. Recebe...

Ao não achar roupas de seu tamanho, mulher cria marca em Chácara Santana

Preta, gorda, evangélica e feminista. É assim que Evelyn...

Ativismo de Cabelo

Há um tempo eu escutei pela primeira vez o...
spot_imgspot_img

Em Paris para a alta-costura da Chanel, Xênia França fala sobre moda, música e reconhecimento internacional

Única celebridade brasileira convidada para o desfile de alta-costura da Chanel, em Paris, Xênia França vem colhendo os louros da longa carreira na indústria...

Atriz negra albina fala sobre preconceito: ‘Tratam como doença’

Desde criança, Thielle Luize chama a atenção por onde passa. Recebe olhares curiosos, fascinados e até mesmo pouco amigáveis. Mesmo adulta, a influenciadora, que se tornou...

Modelo fala sobre caso de racismo envolvendo cabeleireiro: “Senti muito medo”

Na última semana, um vídeo de uma cena de racismo em um salão de beleza viralizou. Nele, a modelo Mariana Vassequi, 25, tem os cabelos...
-+=