Denúncias de racismo devem ter o máximo de detalhes, alerta ministra

A  ministra-chefe da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Nilma Lino Gomes, disse que quem for vítima ou testemunhar um caso de racismo deve  denunciar a uma autoridade policial.

no O Guia da Cidade

 

“Em casos de flagrante, o autor do crime pode ser preso”, advertiu.Segundo Nilma, é importante registrar a queixa no Distrito Integrado de Polícia (DIP) mais próximo “narrando o ocorrido com o máximo de detalhes e fornecendo os nomes das testemunhas, além de pedir ao policial para anotar  o desejo de que o agressor seja processado e o crime investigado por meio de um inquérito e não por Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO)”, orientou.

“Caso a autoridade policial se recuse a fazer o registro, a vítima deve procurar a Ouvidoria da Polícia Civil (PC) para denunciar a falha na conduta do atendente, levando à apuração do caso”, afirmou.

O maior número de dados na denúncia, conforme Nilma, beneficia a vítima no processo judicial. Segundo ela, os agressores se beneficiam da falta de provas.A Seppir registrou seis denúncias relativas à injúria racial e discriminação, entre 2013 e 2015, no Amazonas, mas apenas duas ações viraram processos.

Conforme a Seppir, foram registrados casos de agressão e violência por causa da cor e discriminação envolvendo intolerância à crença religiosa contra praticantes de umbanda e candomblé. Os processos, informou Nilma, correm em sigilo.

A ministra informou que qualquer cidadão pode enviar sua denúncia à Ouvidoria Nacional da Igualdade Racial, pelo site da SEPPIR. Basta acessar o endereço  www.seppir.gov.br, clicar em Contato (na parte superior – cabeçalho da página inicial) e escrever sua mensagem. O contato com o setor pode ser feito também por meio do telefone (61) 2025-7001 ou pelo e-mail [email protected].

Hoje, a Seppir atua no Amazonas em duas  ações de  regularização fundiária  em territórios quilombolas, incluídas no Programa de Enfrentamento ao Racismo e Promoção de Igualdade Racial. A comunidade de Tambor, em Novo Airão, está em fase de legalização.

A Seppir avaliou algumas propostas de convênios com o  Estado do Amazonas e município de Manaus, em 2012 e 2014, mas não chegou, conforme Nilma, a  formalizar os projetos em função do não atendimento dos critérios técnicos específicos, exigido pelo governo federal.

As propostas tinham como objetivo principal a capacitação de educadores multiplicadores para a população negra, o  fortalecimento da Ouvidoria e aquisição de bens para atendimento à população negra de Manaus e estruturação de um núcleo de diversidade étnico-racial e religiosa no  Amazonas.A Justiça brasileira  diferencia os conceitos  jurídicos de injúria racial e racismo.

Conforme o artigo 140 do Código Penal Brasileiro, injuriar alguém  consiste em ofender a honra da pessoa com  elementos referentes à raça, cor, etnia, religião ou origem. Já o  crime de racismo,  previsto na Lei   7.716/1989,  atinge uma coletividade indeterminada de indivíduos, discriminando toda a integralidade de uma raça. A prática é  inafiançável e imprescritível.

O Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) não informou quantos processos de injúria e racismo estão em trâmite.
Mesmo com o baixíssimo número de denúncias, a pós-doutora Patrícia de Melo Sampaio, pesquisadora da história da escravidão africana na Amazônia, afirma que o Amazonas é um dos Estados mais racistas do País. Segundo ela, além do preconceito referente à aparência física, como acontece em outras regiões, aqui a presença do negro é silenciada e negada.

“Parte do problema é que, por serem demograficamente menores, os negros deixaram poucas marcas na cultura local ”, afirmou.

Para o cientista político Ítalo Guerra, o número de denúncias na Seppir não reflete a realidade de preconceito e discriminação vivido em Manaus. Ele justifica que muitas pessoas não formalizam a denúncia porque não acreditam que a Justiça será ágil, mas a falta de dados concretos contribui para a perpetuação da discriminação.

Afrodescendentes relatam preconceito

Praticante da umbanda no bairro Praça 14, zona sul, a dona de casa Nádia Ribeiro conta que ela e seus familiares já foram vítimas de racismo e injúria, mas nunca procuraram a polícia.

“Quando meu marido estava  internado, com câncer,  sofreu falta de ar e a enfermeira disse que não precisaria colocar a máscara de oxigênio porque o nariz do negro já é bastante largo. Fiz um escândalo no hospital”, lembra.

A recepcionista Bianca dos Santos, 27, afirma que nunca se importou com o racismo até o nascimento de sua primeira filha. Ela conta que não admite ouvir expressões populares com relação ao cabelo da criança, nem a cor da pele, e planeja entrar na Justiça quando a menina for ofendida.

“Minha filha é linda e ponto final, peço respeito às nossas características e não tolero preconceito”.

 O militar Bruno Emerson Rangel, 34, é natural do Rio de Janeiro, e conta  que desde que chegou em Manaus, em 2013, viveu várias situações desagradáveis em locais públicos, todas envolvendo o tom de sua pele. Surpreendido pela baixa presença de negros na cidade, ele afirma que sente falta de apoio e afirmação da cultura afrodescendente em Manaus.

“Um senhor, visivelmente alcoolizado, me parou na Ponta Negra para dizer que meus ancestrais negros foram escravizados porque eram covardes, enquanto os índios lutaram bravamente”, contou.

Violência
Segundo dados do ‘Mapa da Violência 2014: Os jovens do Brasil’, 92% das vítimas de assassinatos no Amazonas, nos últimos dez anos, eram negras. O relatório foi divulgado  pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais. Dos negros assassinados, mais da metade tinham idade entre 15 e os 29 anos.

O índice do Amazonas ficou acima da média da Região Norte, que registrou 88% dos casos contra negros e da média nacional, que foi de 81%.

No relatório do Mapa da Violência, a categoria negro envolve o somatório das categorias preto e pardo, que é a nomenclatura utilizada pelo Instituto Nacional de Geografia e Estatística (IBGE).

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