Dez anos da SEPPIR: das diferenças entre gueto e enclave – Por Cidinha da Silva

A SEPPIR, Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, completou 10 anos em 2013. Aprendi com a querida Ministra Luiza Bairros, nos idos de 86 ou 87, que a discussão sobre desigualdade racial só faz sentido se entendemos e desconstruímos o racismo que a produz.
Por conhecer um pouco do ideário da Ministra, ouso afirmar que ela se sentiria mais confortável gerindo uma Secretaria de Combate ao Racismo e Promoção de Políticas de Igualdade Racial, mas a SEPPIR foi a conquista possível há 10 anos e continua a sê-lo, porque é um enclave no Planalto, está instalada, resiste, mas não deveria estar ali.
A Secretaria de Políticas Para as Mulheres e a Secretaria de Direitos Humanos são pedras no sapato, incomodam, mas não podem ter sua existência negada. Com a SEPPIR é diferente, lidamos sempre com o fantasma de uma possível extinção, fusão, diluição. Porque o tema da promoção da igualdade racial (nem falamos de combate ao racismo) continua sendo objeto da atenção proativa de poucos e do desagrado de muitos, inúmeros, infindáveis. Estes que se esforçam diuturnamente (dentro e fora da Esplanada) para guetificá-lo ou para apagá-lo da agenda nacional.
Para ascender da posição de enclave à condição de pedra no sapato é preciso institucionalizar a questão da promoção da igualdade racial (em oposição frontal ao racismo institucionalizado), promover políticas abrangentes e persistir, porque sua eficácia será comprometida, invariavelmente, pelas raízes profundas e expostas do racismo, manifestas em artérias inflamadas que provocam derrame de sangue a todo instante.  É necessário comprometer a Presidenta, instá-la a defender as cotas raciais como estratégia de diminuição da desigualdade, em programas televisivos de massa. Nos fóruns internacionais, a trilha aberta pelas organizações negras brasileiras nos anos 90 e 2000 para tratar o racismo vem sendo seguida pelo governo brasileiro. É mister enramar o debate e potencializar cidadãos e cidadãs comuns, de baixo nível de politização, para perceber, compreender e enfrentar o racismo estrutural. É fundamental articular os demais ministérios, mobilizá-los para a problemática, co-responsabilizá-los, impedir o discurso rasteiro que busca transformar a SEPPIR em gueto negro, localização sabidamente cômoda para a maioria dos opositores (e detratores). A meu ver a gestão que comemora os 10 anos da SEPPIR  realiza estes objetivos.
Desta forma, quando certos artistas justificarem a discriminação racial da ordem do dia (cabelos de palha de aço em modelos como opção estética de um desfile de moda) embasados no silêncio quanto ao mesmo artifício utilizado em edições da década anterior, saberemos, candidamente, que a pessoa negra de 2013 é afirmada, tem noção de direitos que não tinha antes, mete o pé na porta para tirá-los do umbral. De maneira simbólica e também objetiva (por meio de políticas que têm esse significado empoderador) é o que a SEPPIR representa.
Existem pessoas que gritam pelos direitos do povo negro, que negociam para garantir-lhe a vida, posto que a vida dos negros está ainda sendo negociada, não é um direito humano consolidado. Essa luta e essas articulações, como sabido, não merecem as luzes da ribalta, e mesmo no BBR só aparecerão porque o departamento de comunicação da SEPPIR  cumpre seu papel.
Há outras pessoas, entretanto, que esperneiam tal qual adolescentes irresponsáveis e autoritários, quando o pai os castiga por dirigirem sem carteira. Gente que não tem diligência para dirigir, promover e projetar o próprio galinheiro, mas quer cantar de galo quando maneja um microfone de sonorização amadora.

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