Acabamos de entrar no mês mais esperado do ano pelo comércio. Todas as apostas do mundo do consumo estarão concentradas nas próximas semanas para garantir os resultados de vendas planejados. A lógica dos negócios gira em torno das metas de crescimento que serão alcançadas e, melhor, superadas, em relação ao exercício anterior.
Não podia ser diferente. Essa é a lógica capitalista, o sistema que movimenta praticamente todos os mercados. Até a China, do velho Mao, sem qualquer “mea culpa”, se rendeu a esse modelo e se transformou numa das mais poderosas economias da atualidade, com grandes chances de, brevemente, ocupar o topo.
Graças à eficiência da propaganda e das ações promocionais cotidianas, não há um só dia que não sejamos estimulados a consumir, principalmente produtos e serviços de maior valor agregado, os quais possibilitam uma margem de lucro mais expressiva. Diante das tentadoras promessas das peças de comunicação, às vezes é irresistível deixar de atender ao apelo da “condição imperdível”, mesmo que depois cheguemos à conclusão de que aquela compra impulsiva poderia ter aguardado um pouco, ou até ter sido descartada por um bom tempo.
Sou de uma época em que os bens duráveis, como geladeira e fogão, eram para a vida inteira e, em muitos casos, passavam até para a outra geração. Hoje praticamente todos os produtos têm versões renovadas a cada ano, e o bacana para quem tem grana sobrando é a substituição desses eletrodomésticos no prazo mais curto possível, como sinal de status, de alto poder aquisitivo, de se sentir “up to date” e ter assunto para falar com os amigos.
Em se tratando de uma sociedade que enxerga cada um de nós como consumidor, é normal um país como Brasil, que ainda precisa resolver problemas básicos de direitos e de cidadania, ter 468 shoppings centers, sem contar as lojas de rua e as virtuais, os ambulantes, entre outras formas de comercialização.
Tudo bem: esse conglomerado gera emprego e recolhe impostos; e em vários meses do ano sorteia presentes bacanas para uns poucos sortudos. Muitos também dirão que garantir os direitos essenciais dos cidadãos é responsabilidade do governo. Sim, tudo isso faz sentido, mas a realidade vem demonstrando que a verdadeira quebra de paradigma é reconhecermos que todos nós devemos responder por essa situação e encontrar uma fórmula de distribuição de riqueza mais equilibrada.
Vale pensar. Temos recursos para estimular diariamente o consumo, e passamos o ano inteiro sem pensar que estamos aqui para viver, se relacionar, se conhecer; conversar e fazer tantas outras coisas que não custam nada e podem proporcionar alegrias e muita felicidade. E mais: cada ser humano merece desfrutar de uma vida digna. Com isso garantido, cada um poderá decidir como melhor exercer o seu papel de consumidor. Por aqui, fico. Até a próxima.