Marcado historicamente como a data em que o Brasil libertou seus escravos, o dia 13 de Maio hoje é um dia de luta e denúncia contra a falsa abolição vivida pelo povo negro e o racismo que ainda impera em nossa sociedade. É um dia em que o movimento negro e de todos aqueles/as que defendem uma sociedade verdadeiramente igualitária e democrática saem às ruas para lembrar aquilo que não pode nunca ser esquecido: que o Brasil tem uma dívida histórica com o povo negro, que ainda está longe de ser cumprida.
Não bastasse a brutal desigualdade social entre brancos e negros, comprovada em qualquer estatística de acesso à saúde, educação, moradia, trabalho e renda, ainda é preciso enfrentar, cotidianamente, manifestações explícitas de racismo – como a recentemente praticada pelo deputado Jair Bolsonaro na televisão – e políticas públicas que, em vez de desconstruir esta lógica, a reforçam de maneira sistemática.
No ano passado, denunciamos o assassinato de jovens motoboys em São Paulo, executados de forma brutal pela Polícia. Neste dia 13, lembramos dos crimes de maio de 2006, quando 493 pessoas – sua imensa maioria, negra – foram mortas em pouco mais de uma semana. Entre os dias 12 e 20 de maio, a polícia e grupos de extermínio ligados ao Estado assassinaram em São Paulo mais pessoas do que ao longo de toda a ditadura militar brasileira. Deste total de mortos, apenas 6% tinham antecedentes criminais; 126 casos foram registrados como “resistência seguida de morte”, mas a imensa maioria apresenta características de execução sumária pela polícia. Cinco anos depois, segundo o estudo “São Paulo sob Achaque”, elaborado pela Clínica Internacional de Diretos Humanos de Harvard e pela Justiça Global, divulgado esta semana, a polícia solucionou 85% das mortes de policiais e só 13% dos assassinatos de civis durante os ataques de maio. A grande maioria foi arquivada sem esclarecimento.
Ou seja, a política de Segurança Pública em vigor em nosso país extermina os jovens negros brasileiros e fecha os olhos para os crimes praticados pelos próprios agentes públicos. Por isso, corre na Justiça um pedido de federalização dos crimes de maio. Apoiamos tal iniciativa, assim como a instalação de uma CPI para investigar este triste episódio da nossa história. O governo paulista falhou ao gerir seu sistema prisional e foi omisso ao saber da possibilidade dos ataques e não tomar providências para evitá-los. Na sequência, deu uma licença para matar “suspeitos” e até hoje não puniu os responsáveis.
Esta é uma explicação que o Estado brasileiro deve à população, e sobretudo às Mães de Maio, que lançam agora um livro – “Do Luto à Luta” – para registrar sua história. Há cinco anos, depois de perderem seus filhos, elas transformaram sua dor em coragem. Deram início a um movimento de resistência, que hoje luta ao lado de tantos outros contra o genocídio da população negra. A elas, nossa mais profunda solidariedade.
O genocídio continua. Somente no primeiro semestre deste ano, 111 pessoas já foram mortas por policiais em São Paulo em casos de “resistência seguida de morte”. Na Baixada Santista, depois dos crimes de abril de 2010, quando 27 pessoas foram assassinadas em apenas uma semana por grupos de extermínio, novas chacinas colocaram em cena novamente o terrorismo estatal. A matança só parou quando os Estados Unidos aconselharam seus cidadãos a não viajarem para a região, pois nada poderia garantir suas vidas. Policiais militares suspeitos de participação em grupos de extermínio foram presos, mas liberados em seguida. Neste ano, as cenas se repetem.
De acordo com os números do Mapa da Violência no Brasil 2011, entre os anos de 1998 a 2008, mais de 500 mil pessoas foram assassinadas no Brasil. De cada três jovens assassinados, dois são negros. Enquanto o assassinato de brancos caiu 23,3%, o de negros cresceu 13,2% Parte dessas mortes foi praticada pelas mãos do Estado. Por agentes, como descreveram as Mães de Maio,
que julgam, decretam e executam eles próprios a pena capital, e que seguem caminhando impunemente.
Que este 13 de Maio seja um dia de denúncia do racismo e de luta por Justiça, por reparações históricas e contra o genocídio da população negra que permanece. Que as Nações Unidas, que decretaram 2011 como o Ano Internacional dos Direitos dos Afrodescendentes, olhem de perto para a opressão que persiste contra os negros em nosso país. E que o Congresso Nacional cumpra seu papel, de legislar para promover a igualdade, sem a qual o Brasil não poderá nunca ser chamado de democracia.
Fonte: Ivan Valente Psol Dep. Federal