Diarista é proibida de esquentar marmita no RJ: ‘Só pra moradores’

Enviado por / FonteUOL, por Daniele Dutra

A faxina programada para segunda-feira (27) não durou nem até a metade do dia. A diarista Marcelle Oliveira, 34, tinha ido fazer seu trabalho em um apartamento em Ipanema, na zona sul do Rio de Janeiro, mas decidiu ir embora na hora do almoço, após ser impedida de usar o microondas da casa para esquentar a própria marmita.

Ela ouviu do dono do apartamento que “os aparelhos domésticos eram só para os moradores da casa”.

Moradora de Campo Grande, zona oeste da cidade, Marcelle divide seu tempo entre faxinas e uma confeitaria, fazendo doces para fora. Na segunda, ela acordou por volta das 4h40 e preparou sua marmita. Para chegar às 8h em Ipanema, pegou uma van e um metrô. A pretensão era retornar só quando todo o trabalho fosse concluído, mas ela acabou tendo que mudar os planos.

“Assim que cheguei, cumprimentei ele com um ‘bom dia’, mas senti ele meio assim, não muito a fim de responder. Mas é um direito dele responder ou não. Fui para os meus afazeres, até aí tudo normal. Sempre que eu vou fazer uma faxina, eu pergunto se posso ou não beber água ou esquentar comida”, relatou ela ao UOL.

Quando perguntei a esse senhor, ele disse que eu não poderia usar o microondas porque é de uso dos moradores do apartamento. Eu olhei e perguntei novamente. Ele me respondeu mais uma vez e disse que os aparelhos domésticos são para os moradores da casa. Eu respirei, troquei de roupa e comuniquei a ele que estava indo embora.

Marcelle Oliveira

Questionada pelo UOL, Marcelle preferiu não identificar o homem, o que impediu a reportagem de contatá-lo para pegar sua versão dos fatos. Ela não pretende tomar medidas judiciais e foi enfática sobre isso:

Imagina eu, negra, doméstica, processar um homem branco e doutor que com certeza tem advogado. Não vale a pena, não. Eu publiquei na hora da minha revolta, pra que todos vejam a forma desumana que tem gente que trata os outros.

Recém-contratada

A situação aconteceu na hora do almoço, por volta de meio-dia. Marcelle foi chamada na quinta-feira (27), quando o homem, que aparenta ter entre 55 e 60 anos, entrou em contato com ela, pedindo informações sobre seu trabalho. Como o apartamento dele tinha três quartos, ela cobrou o valor de R$ 250 mais a passagem, e informou que levaria sua marmita.

Quando decidiu ir embora, ela já tinha limpado a sala de estar, a de jantar e um banheiro. Após ela comunicar que iria embora, o homem disse que não pagaria nem pelo serviço e nem pelo deslocamento:

Perguntei do meu pagamento, ele disse que não iria pagar porque não terminei o serviço. Nisso, eu vim embora para minha casa. Até hoje não me pagou. Eu me senti triste, porque trato todos os meus clientes de maneira respeitosa. Eu não pedi comida, pedi somente para esquentar minha marmita, algo que é normal para quem vai trabalhar, até porque saco vazio não para em pé.

Marcelle Oliveira

Marcella costuma divulgar seu serviço no Twitter. Assim que foi impedida de esquentar sua marmita, ela compartilhou nas redes sociais. A publicação já teve mais de 1,3 milhões de visualizações e gerou revolta.

“Que gente asquerosa!”; “Sinto muito. O brasileiro escravocrata é muito real, e existe em grande quantidade”; “Já deveria ser absurdo a pessoa chamar faxineira e não providenciar o almoço dela né”, eram os comentários das pessoas que ficaram indignadas com a situação. Muitas pediram até o Pix de Marcella, mas ela se negou a dar. Disse que aquilo era apenas um desabafo.

“Toda diarista ou faxineira passa por situações difíceis. Nem todo mundo é legal, trata seus funcionários de maneira respeitosa. Já passei por uma outra situação no final do ano passado, quando estava com crise de vesícula e a senhora não quis aceitar. Me tratou de maneira desrespeitosa”, conta ela.

Recebi muita solidariedade e muitos comentários de pessoas que já tiveram negados até copos de água. Muitas patroas não aceitam comer na mesa com elas ou estranham quando são bem tratadas. Infelizmente, empregados domésticos são vistos com indiferença por seus empregadores. Não são todos, mas uma boa parte acha que é superior por ser contratante.

Marcelle Oliveira

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