Discriminação e falta de informação elevam casos de Aids no Brasil, diz ONU

Ao menos um terço das novas infecções na América Latina ocorre em jovens

Por:Mariana Della Barba e Kleyson Barbosa

IStock/Getty Images

O número de novos casos de infecção por HIV no Brasil aumentou 11% e o índice de mortes no país atribuídas à Aids subiu 7%, entre 2005 e 2013, segundo relatório divulgado na quarta-feira pela Unaids (Programa da ONU para HIV e Aids).

Clique Infecções por HIV aumentam no Brasil; no mundo, 54% têm vírus sem saber

Os dados chamaram a atenção porque vão na contramão da média global, em que os casos de infecção caíram 13% nos últimos três anos e o número de óbitos relacionados diminuiu 35% de 2005 a 2013, segundo o relatório.

Para especialistas ouvidos pela BBC Brasil, entre as causas do aumento estão a desinformação entre jovens, a discriminação contra gays e problemas de foco nas campanhas do governo.

Segundo a Unaids, a prevalência do HIV na América Latina é concentrada em determinados grupos mais vulneráveis, como gays, profissionais do sexo e usuários de drogas. Além disso, ao menos um terço das novas infecções na região ocorre em jovens, com idade entre 15 anos e 24 anos.

Jovens gays

A diretora do Unaids no Brasil, Georgiana Braga-Orillard, disse que os números do Brasil na pesquisa não a surpreenderam totalmente, já que dados oficiais já vinham apontando uma maior ocorrência de infecção por HIV entre jovens homossexuais.

“Muitos jovens de hoje se protegem menos, acham que não precisam de camisinha, até por acreditarem que Aids é uma doença do passado ou de pessoas mais velhas. Eles não viram ídolos morrerem, como [os cantores] Cazuza ou Renato Russo”, disse Georgiana.

Para ela, a desinformação sobre a doença não diz respeito apenas ao governo. “Hoje, se fala menos sobre a Aids também nas escolas e até na mídia, em que o assunto acaba entrando em pauta apenas na página de ciência.”

O governo brasileiro confirmou à BBC Brasil que existe um “crescimento de casos novos, concentrados nesses grupos e [isso] está de acordo com o cenário que o Ministério da Saúde tem apresentado nos últimos boletins epidemiológicos”, porém não informou o que influenciou o seu aumento.

Preconceito

Além da falta de informação entre jovens, a diretora da Unaids também cita a discriminação contra grupos como os homens gays, o que faz com que eles demorem para fazer testes e procurar tratamento precocemente.

“Um problema é que, por enfrentarem discriminação, muitos homossexuais não procuram ajudam ou procuram tardiamente”, afirma Georgiana.

 

Tratamento pode reduzir capacidade de transmissão em até 96%

“É preciso ver de perto por que essas pessoas não estão procurando tratamento, visto que o Brasil temos tudo: tratamento gratuito, remédios feitos aqui, testes rápidos também gratuitos.”

A médica infectologista e pesquisadora do Laboratório de Pesquisas Clínincas DST/AIDS da Fiocruz Brenda Hoagland avalia que se trata de uma realidade nacional: “O que acontece no Brasil é que o diagnostico é tardio. Se o diagnostico é tardio, aumenta risco de transmissão e também de óbitos”.

Ela explica que o tratamento é importante na política de prevenção, uma vez que “estudos mostram que quando a pessoa realiza o tratamento corretamente o vírus pode se tornar indetectável e ter sua capacidade de transmissão reduzida em até 96%”.

Testagem

Segundo o governo, os números da Unaids apontam também para o fato de o Brasil, no mesmo período, ter aumentado os testes de HIV feitos em sua população.

Em nota, o Ministério da Saúde informou que “a cobertura da realização dos exames passou de 28% da população sexualmente ativa (15 a 64 anos), em 2005, para 37%, em 2013”.

A pesquisadora da Fiocruz avalia que a captura de dados também melhorou no período e pode ter influenciado no aumento do número de pessoas diagnosticadas.

Brenda, contudo, critica as campanhas de orientação e mostra preocupação com o crescimento do vírus em um dos grupos mais vulneráveis à doença: os homens que fazem sexo com homens.

“A gente tem que mudar a maneira de fazer campanha. Primeiro, porque ela só acontece no Carnaval. Depois porque é preciso ter campanhas educativas e mais elucidativas sobre onde o risco é maior. As campanhas apontam que o risco é igual, mas o risco ao fazer sexo anal ou sexo oral é diferente, por exemplo”, considera.

A pesquisadora frisa que é importante conscientizar a todos. “A realidade é que o número de vezes que a pessoa se protege não muda muito, independente da orientação sexual”. Depois de 30 anos da epidemia, ela acredita que “é preciso falar as coisas como elas são para que as pessoas individualmente trabalhem o risco”.

Fonte:Bbc

+ sobre o tema

Outubro Rosa: desafios na luta contra o câncer de mama em mulheres idosas

No cenário da campanha Outubro Rosa, que tem como...

Estudo indica que DSTs atingem mais os homens negros no Brasil

Fonte: Diário de Pernambuco - O total de homens negros...

Dennis de Oliveira: O plebiscito, os médicos e a contradição entre Casa Grande e Senzala

A presidenta Dilma Rousseff buscou retomar a iniciativa política...

Promotoras Legais Populares do Geledés recebem netos de Nelson Mandela em atividade de prevenção a AIDS

   Por: Nilza Iraci Fotos: Renato Oliveira As Promotoras Legais Populares do...

para lembrar

Estudo indica que DSTs atingem mais os homens negros no Brasil

Fonte: Diário de Pernambuco - O total de homens negros...

Risco e escolha

A noção de risco em saúde orienta o processo...

Morto na porta de hospital sofreu discriminação, diz família

Familiares do vigilante que morreu após ser vítima de...

Polícia britânica ‘atirou apenas três vezes’ em um ano

Os números chamam atenção quando comparados aos de outros...
spot_imgspot_img

A indiferença e a picada do mosquito

Não é preciso ser especialista em saúde para saber que condições sanitárias inadequadas aumentam riscos de proliferação de doenças. A lista de enfermidades que se propagam...

Mulheres pretas e pardas são as mais afetadas pela dengue no Brasil

Mulheres pretas e pardas são o grupo populacional com maior registro de casos prováveis de dengue em 2024 no Brasil. Os dados são do painel de...

Saúde: 307 crianças ianomâmis desnutridas foram resgatadas em 2023

Ao longo do ano de 2023, 307 crianças ianomâmis diagnosticadas com desnutrição grave ou moderada foram resgatadas e recuperadas, segundo o Ministério da Saúde. Há quase...
-+=