Divisão racial também nas mortes

Por: Débora Álvares

Ipea revela que, entre as fatalidades por causas externas, homicídios são responsáveis pela maioria dos óbitos na população negra. Entre os brancos, predominam vítimas do trânsito violento. Governo anuncia campanha contra racismo

No dia em que a ministra da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Luiza Bairros, apresentou, em São Paulo, a campanha nacional contra o racismo Igualdade Racial é Pra Valer, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgou dados preocupantes no levantamento Dinâmica Demográfica da População Negra Brasileira. Segundo o estudo, os afrodescendentes homens morrem mais de causas violentas do que os brancos. Quase 10% dos homens negros mortos anualmente têm idades entre 15 e 29 anos, número que não chega a 4% entre os jovens brancos na mesma faixa etária.

Causas externas, como homicídios, acidentes de trânsito, afogamentos, suicídios e quedas ficaram em segundo lugar na lista dos principais motivos de mortes entre a população negra, e representam 24,3% do total, ficando atrás apenas das doenças cardiovasculares. Entre os brancos, as causas externas (14,1%) aparecem em terceiro lugar nas principais formas de óbito, atrás de enfermidades do aparelho circulatório (28%) e neoplasias (17,3%).

Ao analisar separadamente as causas externas, os números do Ipea apontaram as agressões como o motivo que mais matou negros no país (50%), seguida por acidente de trânsito (24%). A análise dos óbitos de homens brancos pela mesma causa mostra uma realidade inversa: acidentes de trânsito (35,3%) matam mais do que agressões (31%).

Para o secretário executivo da Secretaria de Promoção à Igualdade Social, Mário Lisboa Theodoro, que participou do lançamento do estudo, a quantidade mais elevada de homicídios entre negros se explica pela maior exposição à violência, derivada do preconceito e da discriminação.

“O Brasil ainda vive com racismo. São estatísticas com dimensões de um quase extermínio.” Para Theodoro, os números do Ipea revelam o desafio do governo em desenvolver políticas públicas mais eficientes. “Se a população negra aumentar e esse tratamento destinado a ela for mantido, teremos ainda maior desigualdade. O estado terá que focar cada vez mais nessas pessoas para evitar um abismo social”, avaliou.

Tragédia

Alberto Júnior José Martins integra as estatísticas e fortalece a tese de vulnerabilidade da população negra. O atraso ao voltar para casa após buscar a irmã no colégio foi o estopim para agressões sofridas por ele e pela família. O jovem, que nunca acreditou nas ameaças de morte desferidas pelo pai, embora fosse vítima de agressões verbais e físicas, assim como a mãe e os irmãos, acabou sendo vítima da fúria do próprio progenitor. E foi morto aos 24 anos.

Passados dois meses desde a morte do filho, Elízia Martins, 49 anos, ainda não sabe explicar os motivos da tragédia. “Ele (o marido) sempre nos ameaçava, mas pensávamos que era só para nos fazer medo, para impor respeito.” Alberto, atingido com um golpe de faca de cozinha no abdômen, não resistiu aos ferimentos e morreu no colo da irmã, que acompanhou tudo. “Às vezes, fico pensando que poderia ter evitado. Falei com o pai dele por telefone antes e ele já estava muito alterado. Não devia ter deixado meu filho entrar lá sozinho”, desabafou Elízia.

Mudança demográfica

O Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Ibge), divulgado há duas semanas, trouxe uma novidade não vista desde o primeiro levantamento, realizado em 1872: o número de negros ultrapassou o de brancos no país. Na última pesquisa, 97 milhões de pessoas declararam ser afrodescendentes, contra 91 milhões que disseram ser brancas.

Para o Ipea, o principal fator para essa mudança é a verificação de maior fecundidade entre as mulheres negras na comparação com as brancas. “Observando a pirâmide etária, notamos que as afrodescendentes são responsáveis pela maioria dos nascimentos no país”, destacou a técnica em pesquisas do Ipea Ana Amélia Camarano, responsável pela pesquisa.

A taxa de fecundidade total (filhos por mulher ao fim da vida reprodutiva) da população negra permanece superior à da branca. Enquanto entre as afrodescendentes esse número esteja na média de 2,1, entre as brancas é de 1,6. Em 1999, o índice era de 2,7 entre as mulheres negras e de 2,2, entre as brancas.

Outro fator que contribuiu para o aumento da população afrodescendente no país se deve à autoafirmação: “Houve um trabalho muito intenso, desde os anos 1970, para resgatar o orgulho das pessoas negras”, ressaltou Ana Amélia. (DA)

Contrastes

Veja o percentual de mortes masculinas de jovens negros e brancos devido a causas externas:

Negros

2007

» Homicídios 48%

» Acidentes de transporte 24%

» Outras causas* 28%

2001

» Homicídios 50%

» Acidentes de transporte 24%

» Outras causas* 26%

Brancos

2007

» Homicídios 31%

» Acidentes de transporte 35,3%

» Outras causas* 33,7%

2001

» Homicídios 35%

» Acidentes de transporte 28%

» Outras causas* 37%

*Incluem afogamentos, quedas e suicídios

Causas das mortes

Negros

» Doenças do aparelho circulatório 25%

» Causas externas 24,3%

» Neoplasias 17%

» Doenças do aparelho respiratório 8%

» Outras 25,7%

Brancos

» Doenças do aparelho circulatório 28%

» Causas externas 14,1%

» Neoplasias 17,3%

» Doenças do aparelho respiratório 11%

» Outras 29,6%

 

Fonte: Ipea

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