Ela tem 16 anos e lançou uma petição online para revogar a lei antiaborto no Alabama

A estudante Jocelyn Wright ainda não pode votar, mas encontrou na internet uma forma de mobilizar pessoas para uma causa.

Por Emma Gray, no HuffPost Brasil 

Jocelyn Wright quer que os parlamentares saibam que muitos jovens em seu estado estão horrorizados com a Lei de Proteção à Vida Humana promulgada no Alabama. (Foto: COURTESY OF JOCELYN WRIGHT)

Quando Jocelyn Wright soube que uma lei que proíbe o aborto em quase todas as circunstâncias foi promulgada em seu estado natal, estava sentada em seu quarto em Daphne, Alabama, checando o Twitter.

Estudante secundarista de 16 anos, ela estava olhando seu telefone naquela noite na esperança de que a tática a ajudasse a pegar no sono – o tipo de ritual noturno contraproducente que é comum à maioria dos millenials e pessoas da geração Z. Quando viu que notícias sobre o Alabama estavam bombando, no entanto, prestou atenção imediatamente.

Wright mandou uma mensagem para uma amiga. “Falei: ‘Quero fazer alguma coisa, mas não sei o quê’”, lembrou ao HuffPost US. Sua amiga lhe enviou um link do Change.org. E Wright criou uma petição online.

“Como mulher jovem, perto da idade adulta, não posso tolerar essa violação dos direitos das mulheres, cidadãs deste país”, ela escreveu. “Peço aos jovens como eu que tomem posição contra a AHLPA (sigla da Lei do Alabama de Proteção à Vida Humana). Podemos ainda não estar em idade de votar hoje, mas logo vamos estar encabeçando as eleições (e talvez concorrendo a cargos políticos também). Queremos que o Alabama saiba que não vamos tolerar este abuso absurdo de poder voltado contra a mulher e sua capacidade de decidir o que é feito de seu PRÓPRIO corpo INDEPENDENTE”.

Algo que começou como uma expressão de sua frustração começou a ganhar força. No final de maio a petição de Wright já tinha sido assinada por 43 mil pessoas. O HuffPost US conversou com a ativista adolescente sobre liberdade reprodutiva e o papel que os jovens em seu estado estão exercendo nesta discussão – que tomou não só Alabama, mas outros 10 estados americanos.

“Queremos que o Alabama saiba que não vamos tolerar este abuso absurdo de poder voltado contra a mulher”, escreveu Jocelyn Wright, 16 anos.
(Foto: COURTESY OF JOCELYN WRIGHT)

Quando você ouviu falar da Lei do Alabama de Proteção à Vida Humana desde a concepção, que proíbe o aborto em quase todos os casos?

Tomei conhecimento dela quando foi aprovada a lei da Geórgia sobre “batimentos cardíacos fetais”. Vi no Twitter que muitos atores e atrizes estavam se recusando a filmar na Geórgia como forma de protestar contra essa legislação. Então comecei a acompanhar mais de perto. Quando descobri que o Alabama estava prestes a aprovar uma proibição quase total do aborto, fiquei revoltada.

 

Você se lembra de onde estava quando descobriu que a lei tinha sido aprovada?

Eu estava no meu quarto, lendo mensagens no Twitter. Estava tentando dormir, e costumo mexer no meu telefone à noite. De repente vi um monte de comentários, pessoas dizendo coisas do tipo “vamos boicotar o Alabama!”. Pensei: “Putz, o que fizemos desta vez?”

Eu já sabia sobre a medida, mas não pensava que [a governadora Kay] Ivey fosse realmente sancionar a lei. Não achei que ela seria aprovada. Fiquei chocada quando descobri.

 

Somos um país tão desenvolvido. Não faz sentido que as mulheres não tenham direito a um aborto seguro hoje em dia. Jocelyn Wright

Conte sobre a petição que você lançou.

Comecei a trocar torpedos com uma amiga. Mandei para ela a imagem de um tuíte que vi dizendo que a lei tinha sido aprovada. Nós duas ficamos indignadas com isso. Falei: “Quero fazer alguma coisa contra isso, mas não sei o quê.”

Estava quase no fim do semestre letivo, então não daria para fazer uma manifestação no meu colégio. E eu não sabia como reunir um monte de gente jovem. Então minha amiga me mandou um link do Change.org e eu lancei a petição. E agora, alguns dias mais tarde, mais de 40 mil pessoas já a assinaram. É uma loucura.

 

Você já tinha participado de alguma mobilização como essa?

Nunca participei diretamente, mas dei o maior apoio à Marcha pelas Nossas
Vidas (protesto estudantil de 2018 pedindo leis contra armas de fogo). Não consegui participar de nenhum dos eventos, mas sempre acompanho essas coisas.

Você já tinha conversado antes com seus pares sobre o direito ao aborto? Isso é algo que vocês estão discutindo agora?

Eu não tinha falado muito antes, mas agora estamos falando disso, sim. Muitos de meus amigos são pró-escolha (a favor do direito ao aborto), mas já conheci pessoas que são pró-vida (contra o aborto), só que tratam o assunto com muito respeito. Já tive muitas discussões bacanas com pessoas dos dois gêneros. E os dois gêneros são muito pró-escolha e a favor de a mulher poder controlar sua própria vida.

Acho que só tive uma experiência realmente negativa. Eu estava na aula de história europeia, todo mundo na classe estava falando da petição, e um cara fala: “Quem será que vai ganhar, Kay Ivey ou algum imbecil com uma petição?”. Isso doeu, mas não me abalei muito. Acho que essa questão do direito ao aborto é mais importante que a opinião de um sujeito qualquer.

 

Essa legislação antiaborto é algo que afeta você pessoalmente?

Acho que, para mim e meus pares ― como não podemos votar ―, o que realmente revolta é o fato de o Legislativo do Alabama estar querendo controlar o que eu vou poder fazer com meu sistema reprodutivo, sem que eu tenha direito de opinar sobre o assunto.

Quando eu ficar mais velha, não vou querer viver sabendo que não vou ter controle sobre meu próprio corpo. Essa é uma escolha que eu deveria poder fazer por mim mesma. Somos um país tão desenvolvido. Não faz sentido que as mulheres não tenham direito a um aborto seguro hoje em dia.

Esse é nosso direito constitucional. E acho chocante a governadora Ivey e nosso Legislativo estadual estarem tentando nos tirar esse direito.

 

Eu queria que eles entendessem que nossa voz tem importância. E daqui a pouco vamos começar a votar. Jocelyn Wright

Como garota de 16 anos vivendo no Alabama, o que você gostaria que os parlamentares entendessem sobre você e outros jovens de sua idade?

Eu queria que eles entendessem que nossa voz tem importância. E daqui a pouco vamos começar a votar. E vamos representar nosso estado. Eu queria que eles nos ouvissem mais agora, porque o que estão fazendo não é o que nós queremos – e, mais cedo ou mais tarde, eles não vão mais poder tomar essas decisões porque nós vamos tirá-los de seus cargos pelo voto.

 

Você acha que vai participar de outras iniciativas ativistas sobre direitos reprodutivos, além da petição?

Na realidade hoje vou comandar uma reunião para planejar um protesto sobre a questão do aborto. Queremos organizar uma manifestação em Montgomery [a capital estadual].

 

O que você espera que seja o resultado de seus esforços e dos esforços de outros jovens no Alabama?

Torço para a governadora Ivey reconhecer esta petição, que ela veja quantos jovens estão contra o que ela está fazendo e o que o governo do Alabama está fazendo. E torço muito para a lei ser revogada ou derrotada nos tribunais de primeira instância, antes mesmo de chegar à Suprema Corte. É assustador pensar que a Suprema Corte possa rever sua decisão anterior sobre Roe v. Wade e passar por cima dela. Essa ideia é apavorante.

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