Em busca de bons propósitos coletivos em tempo de crises

Por Sérgio Martins

A experiência da vida neste planeta por si só deveria nos encher de satisfações e regozijos. Seus desafios e dificuldades, a labuta pela sobrevivência nos bastaria. Porém, não é isso que ocorre, somos descontentes, buscamos novas conquistas e superações de horizontes já consolidados. Para determinados segmentos sociais e étnicos, a mobilização política, para além do universo das relações privadas são essenciais, sob pena de quase extermínio pelos grupos dominantes. Mas, já houve tempo melhores para enfiarmos nossas cabeças em lutas coletivas, que entendíamos com pujança para  transformar o mundo, ou apenas torná-lo-ia melhor para um número mais de pessoas. Hoje, estamos presos na condição generalista de consumidores, todos felizes com suas televisões de tela plana e seus veículos novos com computadores de bordo e câmbio automático, outros com suas geladeiras que serve água na porta e demais parafernálias, que nem sabemos operar direito. Assistimos a vida como um espetáculo, sentados em nossas confortáveis poltronas, enquanto os telejornais tratam dos internamentos compulsórios dos usuários de crak ou de mais um assassinato nos bairros de periferia. A coisa anda tão patética, que até propaganda do governo comemora a superação da pobreza absoluta, porque um grupo de pessoas foi beneficiado por programas sociais, que lhes possibilita acesso à alimentação e água potável, quando tais acessos deveriam ser o básico do básico. Parafraseando os roqueiros locais: a gente não que só comida, a gente quer cultura, diversão e arte.

Mas para onde foram os grandes ideais: emancipação da condição humana, cidadania, diversidade, ética? Será que morreremos sentados em volta da fogueira do capitalismo endógeno, inebriadas pelas invenções tecnológicas e seus multiusos na vida cotidiana? Ainda, outro dia em uma formatura de ensino médio de alunos de uma comunidade de extremamente pobre, uma professora falava aos formandos e para plateia, sobre a necessidade de criarmos redes em defesa da vida, ações de solidariedade, onde nossas condições de meros espectadores fossem substituídas por indivíduos ativos na vida real.

Também podemos concluir que já alcançamos o máximo de gozo e fruição de direitos humanitários, sendo de desnecessários grandes mobilizações coletivas em torno de causas maiores. Tenho a impressão de estarmos diante de um sistema social cínico, que absorve e reinterpreta as violações humanas como fenômenos naturais, e propõe um diálogo que ausenta a vítima do plano da realidade, através de um discurso de constatação e projeções de atitudes vazias. Fica cada dia mais nítido, que as grandes corporações, querem sejam privadas ou públicas ditam as normas e controlam as interlocuções entre os sujeitos. Neste cenário o debate em torno do uso do crack deixa de ser um problema socioeconômico, manejado por um modelo social excludente e perverso, e passa a ser um problema de saúde pública, onde cada indivíduo já quase morto, tem o dever de segurar sua “marimba”.

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