Dos 5.698 processos analisados na 1ª fase pela Defensoria Pública, quase 36% tinham atrasos jurídicos
Mutirão da Defensoria Pública de São Paulo descobriu que quase 36% das mulheres encarceradas tinham providências jurídicas atrasadas e, em muitos casos, já deveriam estar em liberdade.
Os atendimentos foram realizados em oito penitenciárias, da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP), e 31 cadeias públicas administradas pela Secretaria de Segurança Pública (SSP), com estruturas consideradas bastante precárias. O mutirão mostrou que 74% das presas (4.214) sequer tinham advogado constituído. Dependem de defensores e advogados do Estado, que são insuficientes para todos os atendimentos.
“O mais comum foi encontrar mulheres que cumpriam mais pena do que precisavam, em casos em que já se podia pedir progressão de regime”, afirma o 1º Subdefensor Público Geral, Davi Eduardo Depiné, que coordenou o mutirão. Só de progressão de regime foram 632 pedidos. “Há uma carência na assistência jurídica aos presos e a mulher sofre mais. Porque a ponte com a justiça é a família e elas não recebem visitas.”
A agora ex-detenta Debora dos Santos Domiciano, de 36 anos, sofreu com esse “esquecimento”. Envolvida no tráfico pelo marido – ainda preso -, ela ficou presa mais tempo do que a lei permitia. Foi condenada a 7 anos e 9 meses por tráfico e 4 anos por associação ao tráfico. Com os benefícios da progressão, deveria ter sido libertada no segundo semestre de 2009. Mas só saiu em abril deste ano.
Mesmo com um dos processos anulado, o de tráfico, Debora permaneceu presa. “É como se ela tivesse sido condenada duas vezes por um caso só. Quando peguei o processo, ela já tinha direito ao regime aberto”, explica a defensora Daniela Skromov.
Debora foi uma das 5.698 detentas atendidas da primeira fase do projeto Mulheres Encarceradas. Para 2.035 mulheres, defensores protocolaram pedidos de liberdade, livramento condicional, habeas corpus ou refizeram cálculo de pena ou extinção.
De volta para casa, no interior, Debora agora enfrenta outro drama comum às presas: o desmonte das famílias. Está prestes a perder a guarda de nove dos 11 filhos. “Estou desesperada. Pela minha cadeia ser alta, o juiz está querendo tomar a guarda, porque eu não seria capacitada para cuidar deles.” A exigência é por um trabalho com carteira assinada. Ela só conseguiu bicos como diarista.
Atendimento. A Defensoria Pública encontrou casos que não esperava. “Houve pelo menos três em que as prisões não constavam nos processos”, conta o defensor Davi Eduardo Depiné. “O mais importante, entretanto, não são casos individuais, mas o olhar integral que permitirá proposição de políticas públicas.”
A SSP declarou que, quando ocorre prisão em flagrante, informa a Justiça para que seja designado ao preso um defensor público. O governo promete acabar com cadeias públicas femininas até o fim do ano.
Além dos 50 defensores que atuam com a questão penitenciária, a Fundação de Amparo ao Preso (Funap), ligada à SAP, mantém 270 advogados. A presidente, Lucia Casali, discorda que atendimentos são ruins. Mas concorda que o número de advogados e defensores é insuficiente. “Temos trabalho de qualidade, mas tem de aumentar os profissionais.”
Até novembro, a Defensoria pretende atender todas as cerca de 11 mil presas do Estado. Além dos 50 defensores da área penal, a 1ª fase do mutirão contou com outros 33 profissionais.
Fonte: Estadão