Nos dias 30 e 31 de julho, em Bogotá, capital da Colômbia, GELEDÈS – Instituto da Mulher Negra participou do Encontro Regional para a Autonomia e Justiça Reprodutiva das Mulheres Afrodescendentes na América Latina. A organização foi representada por Maria Sylvia de Oliveira, advogada, diretora executiva e coordenadora da área de Gênero, Raça e Equidade da organização. O evento reuniu lideranças negras do país anfitrião, Equador, Brasil, Argentina e México.
O encontro foi organizado pela ILEX – Acción Jurídica, instituição afrocolombiana composta por advogadas negras e pessoas afro-LGBTQIA+, que atua na defesa dos direitos humanos com ênfase em justiça racial e de gênero. O encontro se propôs a fortalecer alianças regionais e a visibilizar as múltiplas formas de violência enfrentadas por mulheres negras no acesso à saúde, especialmente no campo dos direitos sexuais e reprodutivos.
Ao longo dos dois dias de programação, foram discutidos temas como racismo institucional;violência obstétrica; interrupção voluntária de gestação, legalizada pela Corte Constitucional da Colômbia, em fevereiro de 2022, até a 24ª semana; acesso desigual aos serviços de saúde e a urgência de políticas públicas que respeitem os saberes, os corpos e os territórios das mulheres afrodescendentes. O encontro também foi um espaço de escuta, articulação política e reafirmação do protagonismo das mulheres negras latino-americanas nesta luta,
Maria Sylvia, que contribuiu como convidada no painel “Experiências e práticas no acesso à IVE (Interrupção Voluntário de Gestação)”, discorreu sobre o método de atuação de Geledès na formação política, litigância estratégica e produção de conhecimento sobre o aborto com base na realidade de territórios, lutas e dos problemas que impactam a vida das mulheres negras.
Ela destacou que um dos primeiros documentos produzidos por mulheres negras sobre direitos sexuais e reprodutivos, no Brasil, foi a Declaração de Itapecerica da Serra das Mulheres Negras, 1993, cuja publicação foi organizada por Geledés, a partir do Seminário Nacional “Políticas e Direitos Reprodutivos das Mulheres Negras”, realizado naquela cidade.
“Muito pouco, quase nada, avançamos nesta pauta. A influência de grupos religiosos e conservadores no debate público e na formulação de políticas limita a discussão sobre direitos sexuais e reprodutivos e impede avanços legislativos e sociais em temas como o aborto e a educação sexual no Brasil”, afirmou.

Um dos principais objetivos do encontro foi a criação de um espaço seguro e acolhedor para o debate sobre a interrupção voluntária da gravidez, tema ainda cercado de estigmas e barreiras em grande parte da América Latina. Além disso, a iniciativa buscou fomentar a construção de uma rede transnacional de mulheres negras — lideranças comunitárias oriundas do Brasil, México, Equador, Argentina e Colômbia — com vistas ao fortalecimento de alianças estratégicas voltadas à promoção e defesa dos direitos sexuais e reprodutivos.
Mais do que um espaço de discussão, a proposta do encontro girou em torno da partilha de experiências e dos desafios enfrentados por essas mulheres, com uma importante participação de mulheres com deficiência e LGBTs, em seus contextos nacionais, assim como na construção de respostas políticas coletivas que considerem as especificidades raciais, territoriais e de classe que atravessam a vida das mulheres negras na região.
No caso do Brasil, a prioridade é avançar no reconhecimento e garantia dos direitos sexuais e reprodutivos como parte da agenda de justiça reprodutiva, enfrentando os entraves legais e institucionais impostos pelo conservadorismo. Já na Colômbia, onde o aborto foi legalizado até a 24ª semana de gestação, o desafio é garantir que os direitos assegurados pela legislação sejam efetivamente acessíveis às mulheres negras, historicamente marginalizadas pelas estruturas do sistema de saúde e justiça.