Entrevista com Stephanie Ribeiro

O The Black Cupcake tem o orgulho de apresentar uma entrevista feita no dia 17 de dezembro com a estudante de arquitetura, da PUC-Campinas, feminista e ativista negra, Stephanie Ribeiro. Atualmente ela escreve para o site Confeitaria e para o Blogueiras Negras

Por: Naomi do The Black Cupcake

O cabelo da mulher negra ainda é marginalizado pelos padrões de beleza, entretanto, nos últimos anos presenciamos  um certo declínio da “ditadura da chapinha”. Nessa nova ascensão do cabelo natural da mulher negra, o cabelo crespo sem cacho, está abaixo do cabelo cacheado?

Stephanie: A mídia impôs um padrão, aonde todos acham que ser negra, é ser a Taís Araujo. Existe esse cobrança  todos querem que tenhamos o cabelo igual, o nariz igual. Então, sim, o cabelo crespo ainda apresenta uma dificuldade a ser aceito, que, as vezes, não acontece com o cabelo cacheado. O cabelo negro aceitável, é aquele mais próximo ao cabelo liso. A branquitude criou  um padrão de belo, e o cabelo cacheado acaba se aproximando mais desse padrão, do que o crespo.  

Você tem o cabelo cacheado, o nariz afilado, uma boca grande, mas  nem tanto, uma beleza próxima a esse padrão da branquitute. Existem, mulheres negras privilegiadas em relação a beleza? Que tenham mais chances de evitar a solidão da mulher negra, as ditaduras capilares, entre outros problemas específicos das negras?

  Stephanie: A negra “aceitável” é aquela que mais se aproxima do padrão que a branquitude pauta como belo. Considero que tenho inúmeros privilégios. Tanto estéticos, quanto ao acesso universitário que estou tendo. Não acho ofensivo pautar isso, eu estou dentro do padrão de mulher negra que a branquitude dita como aceitável, tanto que cheguei a ser modelo. Isso não quer dizer que eu não passe por racismo, mesmo sendo uma negra mais próxima ao padrão.  É mais fácil ser, dentre as milhares de brancas, uma negra próxima do padrão, do que uma negra de pele mais escura, cabelo crespo, gorda, etc. Eu acho que a solidão da mulher negra rola com todas, não sei dizer se minha estética influenciou para que hoje eu tenha um namorado. Mas também há o fato de que , no meio onde eu estou inserida agora, como não existe muito homens negros, e nem mulheres negras, eu sou vista como exótica. Eu sinto que as pessoas me desejam, mas nada além disso. Penso que quanto mais ascender socialmente, menos negros estarão perto de mim. E consequentemente mais brancos, e nesse meio branco eu nunca vou ser um deles. Eu sou “aquela moça de beleza~~exótica~~“, é assim que me chamavam. Tentavam e tentam dizer que não sou negra, que sou morena, moreninha. Tudo isso como uma tentativa de me embranquecer, para justificar meu lugar ali, e justificar que as ações racistas não são racistas. Privilégio estético pra mim , é se sentir miseravelmente mais representada e aceita que outras mulheres negras, que não estão alinhadas no que a branquitude pauta como negro bonito.  
E como foi essa experiencia como modelo? Você via diferença entre as modelos brancas e negras? Ou entre você e as modelos mais escuras?
Stephanie: Quase não existia nas agências, onde eu participava, modelos negras de pele escura, e entre as brancas, eu percebia que talvez elas notavam, que nós [negras] sempre seriamos uma só. Por exemplo, em um casting só uma negra seria escolhida para 10, ou 15, brancas.  
Nos Estados Unidos, temos uma quantidade superior de modelos negras influentes, e editoriais voltados a mulheres negras. A população negra deles é muito inferior a nossa. Já aqui, com a segunda maior população negra do mundo, temos uma quantidade muito inferior de modelos negras com representatividade e, como você disse, 1 negra para 14 modelos brancas. Porque você acha que isso ainda ocorre?
Stephanie: Então eu acho que mesmo nos EUA não dá pra se iludir, Tyra Banks, Naomi [Campbell] são negras “lapidadas”, pela branquitude, para serem aquelas mulheres brancas coberta no chocolate, que eles acreditam que é a representatividade negra que queremos.   Acho que a questão dos EUA, é que lá existe uma classe média negra consumidora, que não pode ser excluída. Sendo aqui, a maioria negra é pobre. Talvez com os novos acessos a universidade, cursos, etc, conseguimos mudar um pouco essa perspectiva de negro = pobres. [A indústria de beleza] Não representam a gente, por que não nos veem como consumidor. E claro que mesmo quando o nosso mercado começar se abrir pra nós, e percebo que estamos aos poucos caminhando pra isso, a representatividade só vai rolar nos moldes do negro que acham aceitável.
 E como seria a representatividade negra que queremos?
Stephanie: Eu realmente acredito que a representatividade que queremos ela é múltipla. Os negros não são todos iguais, mesmo que alguns achem isso, e fiquem te comparando com pessoas que não parecem nada com você, mas que sejam negras.  
Para finalizar a nossa entrevista, você teria alguma mensagem para mandar para as pessoas que leem esse blog?
  Stephanie: Eu comecei a me achar bonita depois dos 17 anos, até então na escola eu era feia, a cabelo de vassoura, a menina que ninguém queria ficar. O processo foi difícil, minha auto estima foi mutilada, eu odiava fotografias, não queria me ver, me achava feia, quando meu cabelo armava eu me sentia horrível. Nas revistas de adolescentes eu nunca encontrava uma dica de maquiagem pra mim. Por mais que ser modelo esteja ligado a passar pelo racismo, me ajudou a me ver como mulher bonita. Eu considero que seja assim com muitas, a gente vai descobrindo nossa beleza negada. Por isso, ir contra essa corrente é o que precisamos fortalecer. A ideia de blogs, tumblrs, que valorizem nossa estética negra são sim necessários, além de questionar a mídia , e nos unir é mais ainda.  
Muito obrigada.
Quer saber mais sobre beleza negra? Leia o texto escrito pela própria Stephanie para a Confeitaria: Beleza negra – é preciso ver para crer.

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