Angélica Dass nasceu no Rio de Janeiro e vive em Madri há 15 anos. Ela participa do PhEST, Festival Internacional de Fotografia e Arte em Monopoli, na região da Apúlia no sul da Itália, onde conversou com a RFI Brasil.
“O que eu faço no Humanae são fotos de pessoas no fundo branco. Pego um quadradinho no nariz e busco o correspondente numa paleta de cores chamada Pantone. Na verdade, Pantone é como um idioma de cores. Depois de identificar a cor da pele, pinto o fundo” conta.
O seu trabalho mostra uma infinidade de tons de pele, e até pessoas da mesma etnia que não têm a mesma cor. Cada imagem mantém a legenda do sistema Pantone, acompanhada pelo número e letra da variação da cor identificada.
“Nestas fotos o que eu estou tentando provar é que eu aprendi quando pequena, que as pessoas são classificadas como negro ou branco. Isso não é real. O que a gente vê no mundo real é uma paleta de cores gigantesca, desde um chocolate, caramelo, canela, iogurte, mas nunca esse preto e branco. Então por que classificamos os seres humanos desta maneira? O objetivo é propor este tipo de reflexão. Mostrar que a diversidade é um grande valor da espécie que é a raça humana. Em vez de discriminar, a gente tem que celebrar esta diversidade” explica.
Mosaico gigante
Nesta 6° edição do PhEST, o tema é O Corpo. O Festival reúne 30 exposições de fotos e arte contemporânea em vários pontos da cidadezinha litorânea do Mediterrâneo.
Angélica Dass tem uma posição de destaque. A sua obra é um mosaico de rostos impresso em uma tela gigante de 26 metros de comprimento por 5 metros de altura que está exposta individualmente na antiga muralha de Cala Porta Vecchia, diante das águas cristalinas do mar Adriático.
“Uma das grandes missões deste trabalho não é só estar na parede como uma peça de museu, como uma exposição. O objetivo é ser uma ferramenta educativa. Paralela a esta exposição no PhEST, faço oficinas em todo o planeta conectando com a juventude, com futuras gerações, para que sejam os líderes de amanhã” comenta.
Angélica começou a fotografar os rostos em 2012. A ideia surgiu quando fez retratos do marido espanhol e da família dela, que define como “multicolorida”.
“Eu me reconheço como alguém que é afrodescendente, eurodescendente e descendente dos povos originais do Brasil. Quando comecei a fotografar a minha família percebi a diversidade que a gente tem no planeta. ”
Até agora ela já fotografou 4.556 pessoas, em 20 países e 36 cidades do planeta. Seu trabalho percorreu diversas mostras pelo mundo. Para citar alguns exemplos, o Humanae foi exposto em 2017 no Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça. No ano seguinte, no Museu Americano de História Natural em Nova York.
Contra o racismo
Em cada retrato frontal a pessoa aparece com os ombros nus, dando a impressão que está despida.
“Talvez as informações mais importantes que você vai encontrar nas fotos é a falta de informação. Você não sabe quem é o pobre, quem é o rico, quem é o imigrante, qual é a orientação sexual. O objetivo é celebrar o que na verdade a gente tem como grande tesouro da nossa espécie, que é nossa diversidade em todos os aspectos”, ressalta
A mensagem da sua obra gera também um forte impacto no combate ao racismo.
“Uma das coisas mais importantes para mim, é tentar usar a arte como uma ferramenta. Se o conceito de raça é uma construção social, acredito que a gente possa desconstruir essa construção através da arte, através da fotografia, através da educação.”
O PhEST
A ideia de criar o PhEST – See Beyond the Sea (Veja além do mar) foi do documentarista e diretor de fotografia italiano Giovanni Troilo com a curadoria fotográfica de Arianna Rinaldo. O festival começou em 2016, foi crescendo, e não parou nem no ano passado com a pandemia. O respeito às regras sanitárias é rígido. Para ver as exposições em lugares fechados é obrigatório apresentar o certificado de vacinação ou o teste Covid-19 feito até 48 horas antes.
Algumas obras fazem parte de instalações dentro do Palazzo Palmieri, um edifício barroco no centro histórico. Já na antiga igreja desconsagrada de São Pedro e São Paulo encontra-se o trabalho do artista britânico e franco- marroquino, Phillip Toledano. São autorretratos nos quais ele aparece vestido e maquiado como diferentes personagens imaginando como poderia morrer.
Outras imagens estão expostas ao ar livre, como a Beleza dos Albinos da italiana Paola De Grenet, radicada em Barcelona. Ela fotografou em diferentes países pessoas albinas, muitas delas sofrem deficiências visuais.
O PhEst, que dura até 1° de novembro de 2021, não se limitou a terra firme e “invadiu” o mar. As fotos do artista lituano Tadao Cern estão impressas em horizontal sobre colchões flutuantes ligados no fundo do mar. A obra se transforma em uma brincadeira de verão. O público tem que nadar até a instalação para ver as imagens e se diverte subindo e descendo dos colchões.
Já no fundo do mar estão as esculturas do italiano Erich Turoni, acessível só aos mergulhadores.