Grupo Redimunho de Investigação Teatral apresenta “Woyzeck – uma desterritorialização em curso” da obra de Gerog Brchner

Novo espetáculo do Grupo Redimunho de Teatro estreia em data e local de grande simbologia para a encenação, dia 01 de Maio (dia do trabalhador) na Ocupação 9 de Julho, do MSTC (Movimento Sem Teto do Centro)

FONTEPor Rafael Ferro, enviado ao Portal Geledés
Woyzeck do Grupo Redimunho (Foto: Jardiel Carvalho)

O Grupo Redimunho de Investigação Teatral encena a sua versão de Woyzeck, propondo o que está chamando de uma dramaturgia adjacente, onde se estabelece a “desterritorialização” simbólica do clássico alemão, o espetáculo é baseado integralmente no texto inacabado do jovem dramaturgo alemão Georg Buchner, morto em 1837 aos 23 anos. A encenação tenta trazer questões de nosso tempo sem rupturas estruturais da obra Bucheriana. 

Woyzeck representa, não só o novo projeto do Grupo Redimunho, mas, sobretudo, a consolidação de uma experiência que marca mais de 17 anos de existência e consequentemente seu amadurecimento artístico, forjado na experimentação cênica e na troca de saberes entre artistas que carregam o objetivo de pesquisar a condição humana, utilizando como elemento norteador, entre outros, a narrativa de João Guimarães Rosa.

A partir de reflexões sobre a vida no campo e o próprio destino do trabalhador, também muito bem definidas no texto de Georg Buchner é que o coletivo baliza suas experiências e as coloca em contraponto com a vida nos tempos atuais, tratando dos aspectos políticos, sociais e culturais, propondo em metáfora um teatro que precisa transpassar a lógica do entretenimento.

Woyzeck do Grupo Redimunho (Foto: Jardiel Carvalho)

Foi da dramaturgia de Georg Buchner, que brotou de forma muito objetiva um pensamento mais afiado sobre o que estamos chamando de disputa do imaginário e do que acreditamos ser um mundo mais justo, mais honesto, mais verdadeiro e mais voltado para a ocupação do tempo e espaço, com mais autonomia pelos homens e mulheres, sejam eles do campo ou da cidade, podendo, desse modo, disputar o pensamento que concentra a reflexão sobre o humano que habita nossa sociedade.

A obra fragmentada de Georg Buchner é intercalada pelo texto adjacente de Rudifran Pompeu que promove um preenchimento reflexivo a partir do que surgiu nas infindáveis discussões do processo investigativo do coletivo, e que levantou e trouxe pra cena inúmeras questões de nosso tempo, mas que parecem ainda ser reminiscências de quase 200 anos atrás.   

Com muitos atores e musicistas no palco, a peça promove para o espectador um ambiente desenvolvido a partir do universo simbólico que a obra e o local de apresentação, a Ocupação 9 de Julho oferecem.

A discussão e reflexão que envolvem as temáticas do espetáculo são de grande relevância para nossa atual conjuntura política e social. Queremos proporcionar por meio desse espetáculo o encontro de existências ameaçadas, de indivíduos, personagens, cidadãos, que indagam suas ruínas.

Falamos sobre uma sociedade de exílios e medos, sufocada e estrangulada pela superfície. As liberdades de outrora possuíam o simbólico do encontro e da troca, da fraternidade, que agora são legadas à inanição. O acúmulo sucessivo de exclusões, de prisões arbitrárias e de crimes contra os direitos civis é um dos retratos mais lúcidos do contemporâneo, escancara não só a situação de crueldade daqueles que vivem a margem e que perderam o seu lugar no mundo, mas também a face embaçada do mundo que os perdeu.

Estamos diante de uma sociedade acometida por constantes demonstrações de ódio, afloramento este que não implica apenas na miséria dos discursos e na pobreza das opiniões, com suas ofensas e agressões cotidianas, mas algo muito mais grave que é a ausência de diálogo. A crise institucional e o desgaste no emprego de termos como “esquerda e direita”, por exemplo, além de não abarcar a confusão no horizonte das ideias, tem apequenado e fortalecido as fronteiras de uma divisão que é alimentada às cegas, recriando em bases sólidas o avanço do fascismo.

Trata-se também de trabalhar a cena de uma certa esperança que habita sobretudo naqueles que não encontraram consolação para seu apartamento do mundo, criando uma perspectiva alternada de um exílio intermitente que pode, talvez, alcançar uma nova forma de ver. Se a morada dessas existências é o desabrigo ou a luta nos acampamentos e territórios ocupados, a tragédia de não ter lugar no mundo chama a atenção para as outras tragédias originadas pela (auto) expulsão simbólica da vida e do direito à cidade.

O espetáculo será realizado em um campo de muitas lutas, a simbólica “Ocupação 9 de Julho” do MSTC (Movimento Sem Teto do Centro), movimento parceiro desde nosso último espetáculo “Siete Grande Hotel: a sociedade das portas fechadas”.

Keyth Pracanico em Woyzeck do Grupo Redimunho (Foto: Jardiel Carvalho)

O grupo chegou à sua adolescência no meio de uma das maiores crises sanitárias e econômicas da história brasileira e, assim como todos, tivemos que assimilar e entender a atual conjuntura, a fim de ordenar alguma possibilidade de futuro e de novas maneiras para navegar em águas tão turbulentas e desconhecidas. Portanto, para mirar um horizonte à frente, nossa proposta é um misto de compasso de espera e de ação, onde seguimos cuidadosos com o momento preocupante de saúde pública, mas focados em construir uma estética que tenha a força de suprir as necessidades inerentes da pesquisa, proporcionando, dessa maneira, a continuidade de um trabalho que pretende refletir um plano, no qual o fenômeno teatral se coloque com vigor na disputa do pensamento da cidade, principalmente, no sentido que corresponde a crise sanitária de questionar a vida pautada pela lógica do capital que, de forma avassaladora, acaba regendo as leis do mercado na sua ânsia por abarcar a própria existência humana.

O que se busca, enquanto pressuposto básico para a construção de um mundo possível é a fricção das forças que habitam a sociedade na qual estamos inseridos e que neste momento se evidenciam e se escancaram diante da peste covid-19, ampliando visivelmente o enorme abismo entre as classes, expondo mais cruelmente as já existentes inúmeras injustiças sociais, promovendo de forma avassaladora uma proposta de necropolítica e genocídio, executado violentamente pelo atual governo brasileiro.

Giovanna Galdi em Woyzeck do Grupo Redimunho (Foto: Jardiel Carvalho)

SINOPSE

Woyzeck é um soldado alemão da mais rasa patente, naturalmente apático e perturbado, estrangulado socialmente por sua condição econômica que o relega à margem da sociedade local. Excluído e oprimido pelas diversas forças que regem o sistema no qual está inserido, ele aparentemente sem saída, perde totalmente sua capacidade de reagir diante das situações limites provocadas pelo seu capitão e o médico do quartel, de tal forma que a sua ruína mental é inevitável.

Serviço:

Woyzeck, uma desterritorialização em curso”

Temporada: Estreia dia 01 de Maio

Domingos e Segundas às 19h | Até 25 de Julho

Local: Ocupação 9 de Julho (MSTC)

Rua Álvaro de Carvalho, 427 – Bela Vista – São Paulo

Ingressos: R$ 30,00 (inteira), R$ 15,00 (meia)

Bilheteria estará aberta 1h antes do início do espetáculo

Classificação indicativa: 14 anos

Capacidade: 60 Lugares | Duração: 150 min

Estacionamento ao lado. Próximo às Estações República e Anhangabaú de Metrô

Ficha técnica
Direção e Dramaturgia: Rudifran Pompeu

Assistência de Direção: Jandilson Vieira

Direção Musical: Luis Aranha

Artistas Criadores: 

Amanda Preisig, Anísio Clementino, Breno Carvalho,Bruna Aragão,Caio Silviano,Carolina Moreira, Danilo Amaral,

Flávia Teixeira, Giovanna Galdi, Jandilson Vieira, Keyth Pracanico, Luis Aranha, Luiza Torres, Neide Nell, 

Patricia Borin, Pedro Felício, Pedro Poema, Tatiana Polistchuk, Alexandre Mello, Marcus Martins,

Ivan Forneron e Rafael Ferro.
            Elenco do Espetáculo:

Amanda Preisig, Anísio Clementino, Breno Carvalho,Bruna Aragão,Caio Silviano,Carolina Moreira, 

Danilo Amaral,Flávia Teixeira, Giovanna Galdi, Jandilson Vieira, Keyth Pracanico, Luis Aranha, 

Luiza Torres, Neide Nell, Patricia Borin, Pedro Felício, Pedro Poema e Tatiana Polistchuk.

               Preparação Vocal: Cor e Voz / Ana Terra Ikeda

Pesquisa e Consultoria Literária: Ivan Forneron e Marcus Martins

Iluminação: Lui Seixas

Técnica de Iluminação: Guilherme Soares, Léo Xymox, Oubi Inaê Kibuko

Apoio Técnico Ocupação 9 de Julho: Júnior e Tiago Manoel

Cenários e figurinos: Grupo Redimunho

Produção: Giovanna Galdi e Bruna Aragão

Assessoria de imprensa: Rafael Ferro

Produção Visual e Site: Danilo Amaral

Ilustração: Pedro Felício

Mídias Sociais: Bruna Aragão e Flávia Teixeira

Produção teaser: Fuzuê Filmes – Cibele Appes, Lucas Kakuda e Márcio Nascimento – Som direto: Jefferson Santos


Sobre o Grupo Redimunho de Investigação Teatral

O Grupo Redimunho de Investigação Teatral surgiu como uma ideia, em fins de 2003 e início de 2004, mas só pisou no palco pela primeira vez em maio de 2006. Nossa ideia sempre foi a de buscar novos desafios (sentimento premente à sua maneira em cada um dos atores do grupo), trazer algo diferente, desvendar o desconhecido, recuperar e recriar o que achávamos que estava esquecido. As primeiras leituras e estudos realizados em salas de ensaio do teatro Sérgio Cardoso (e em salas de apartamentos diversos), possibilitaram, dentre tantas coisas, o encontro com a obra singular de Guimarães Rosa e, desde então, o norte de nosso trabalho foi o universo do homem do campo. 

Em 2005, por meio de uma parceria com a Cia. Paulista de Restauro, passamos a ocupar culturalmente um antigo casarão localizado no bairro do Bixiga, que abrigou, no mesmo ano, nosso primeiro espetáculo: A CASA, que recebeu o prêmio APCA de melhor texto em 2006, e permaneceu em cartaz por dois anos seguidos, com uma devolutiva da crítica e do público extremamente satisfatória. 

Ainda no Casarão, em 2008, estreamos o segundo trabalho: VESPERAIS NAS JANELAS, indicado ao APCA de melhor texto e que recebeu o prêmio Quem Acontece (Ed.Globo/RJ) de melhor direção e, novamente, obteve excelente devolutiva de crítica e de público, realizando apresentações com casa cheia, em todas as sessões, permanecendo um ano em cartaz. 

Em 2011, após a reforma de um estacionamento abandonado, inauguramos um novo espaço cultural no bairro central da cidade e estreamos nosso terceiro espetáculo: MARULHO: O CAMINHO DO RIO, premiado pela APCA como melhor texto daquele ano e, também, pela Cooperativa Paulista de Teatro por melhor ocupação e utilização de espaço não convencional. É neste espaço que atualmente trabalhamos cerca de 40 horas semanais, além de recebermos outros grupos e parceiros para inúmeras atividades. 

Durante os anos de 2011 e 2012, desenvolvemos a pesquisa: “NÃO PRECISA SOBRAR NADA!”, que teve como foco a reflexão do que tínhamos feito até aquele momento, objetivando o olhar para o mecanismo pelo qual nossos trabalhos foram gerados, para a técnica do ator e para a dramaturgia, além da intenção de friccionar as relações artísticas dentro do coletivo. Foi o momento de se ouvir, de se escutar, de se entender, mesmo conscientes de que esse entendimento está em construção permanente. 

Todo o percurso foi registrado e transformou-se na publicação do livro: “POR TRÁS DAS VIDRAÇAS”. 

O ano de 2013 foi dedicado à uma nova investigação. Dividida em blocos — ou partes — gerou nosso quarto espetáculo, “Tareias: atrás do vidro verde tem um mundo que não se vê…”, trabalho que se estendeu até o ano de 2015. A intenção foi a de dar continuidade ao trabalho de investigação acerca das novas possibilidades dramatúrgicas que estávamos descobrindo, objetivando a interferência no espaço público. Desse modo, criamos um espetáculo para a rua e produzimos um trabalho de relação direta com a cidade, no qual pudemos interferir, não só geograficamente, mas, também, interiormente no imaginário do cidadão urbano, usando, como ponto de partida, a figura feminina ‘ocultada’ na obra Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa, traçando um paralelo entre a mítica da mulher roseana em contraponto com a mulher dos grandes centros urbanos. O que nos levou ao terreno difícil das questões acerca dos territórios e, consequentemente, dos significados do público e do privado. O trabalho nos retirou do “conforto” político e estético, e fomentou a necessidade de nos aproximarmos do lugar público, pensando na continuidade de um trabalho que se movimenta e se propõe a repensar seus caminhos constantemente, criando rupturas que possibilitem uma profunda reflexão sobre nosso papel como artistas que pesquisam o universo campeiro, mas que, na contramão, habitam uma grande cidade como São Paulo. 

No período que compreende 2016 a 2018, estivemos imersos na criação e apresentações de um novo espetáculo – Siete Grande Hotel: a sociedade das portas fechadas, numa proposta de desdobramento daquilo que sentíamos de urgência, a ampliação do debate das relações entre o público e o privado, a sociedade, a cidade e nosso trabalho artístico. E por meio dessa pesquisa que resultou no espetáculo “Siete Grande Hotel…”, fomos contemplados com o Prêmio APCA de melhor texto no ano de 2017.

A cada projeto, temos sentido as dificuldades de nossas propostas, mas o teatro de grupo tem o acúmulo e a característica de sempre se interessar em criar e responder questões que permitam avançar, mesmo que isso signifique quebrar paradigmas, suscitando novas e instigantes provocações, trazendo, inclusive, a possibilidade da (des) construção de um discurso poético que há década e meia (como é o nosso caso) estamos seguramente construindo.  

SITE:  https://gruporedimunho.com.br/

Sobre a Ocupação 9 de Julho / MSTC

O Movimento Sem-Teto do Centro (MSTC) luta por esse direito fundamental à moradia, principalmente na região central de São Paulo. Atende mais de duas mil pessoas, entre adultos, crianças e jovens. Moradia não se resume à propriedade física, mas também diz respeito à vida familiar, segurança, saúde, educação, mobilidade e convivência comunitária. Ter acesso a um lar é porta de entrada para uma série de outros direitos, pelos quais também lutamos.

Hoje, no Brasil, há 33 milhões de pessoas sem moradia. Segundo o Plano Municipal de Habitação, de 2016, a cidade de São Paulo precisaria de 358 mil novas moradias para zerar seu déficit habitacional. São 358 mil famílias que têm, diuturnamente, negado o acesso a um direito humano fundamental, previsto no artigo 6º da Constituição Federal e na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Na outra ponta, a estimativa é que a cidade tenha mais de 1.300 imóveis ociosos, que estão abandonados, subutilizados ou terrenos sem edificações, que equivalem a dois milhões de metros quadrados sem uso na maior cidade da América Latina.

A fila de habitação na capital tem mais de um milhão de inscritos. A estimativa da prefeitura é que 20 mil pessoas estejam vivendo em situação de rua na cidade, 60% só na região central. Movimentos sociais estimam 40 mil pessoas nessa situação, e um déficit de mais de 22 mil vagas em abrigos, já que o município dispõe de 18 mil vagas.

Em novembro de 1997, algumas pessoas ocuparam o prédio na Rua Álvaro de Carvalho, hoje conhecido como Ocupação Nove de Julho. Em 2000, mulheres líderes desta e de outras ocupações se unem e fundam o MSTC, para mobilizar e organizar famílias sem moradia. 

Atualmente, o MSTC coordena cinco ocupações e um empreendimento.  O Residencial Cambridge, que foi uma ocupação, é, agora, um empreendimento financiado pelo programa Minha Casa, Minha Vida.

Ocupação José Bonifácio — 100 famílias

Ocupação Casarão — 24 famílias 

Ocupação Nove de Julho — 123 famílias

Ocupação Rio Branco — 30 famílias

Ocupação São Francisco — 30 famílias

O movimento é formalizado, porque ter um CNPJ e prestações de contas em ordem é condição para o acesso a recursos públicos destinados à moradia. Há Estatuto e regimento interno registrados em cartório, conhecidos por todos os integrantes. As decisões são debatidas e aprovadas em assembleia.

Entre nossos apoiadores estão grupos de apoio à luta por moradia, universidades, jornalistas, artistas, arquitetos e arquitetas, profissionais da saúde, educadores e educadoras, coletivos de sustentabilidade. As ocupações são abertas à cidade e a 9 de Julho se tornou, com nosso trabalho, um centro cultural, com shows, debates, exposições e almoços abertos todos os domingos. Saiba mais em: https://www.movimentosemtetodocentro.com.br/


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