“Há reconhecimento da identidade específica e da história única dos afrodescendentes”

Geledés na ONU, incidencia internacional de Geledés Instituto da Mulher Negra

A declaração é do copresidente do Mecanismo de Coordenação dos Major Groups e Outros Stakeholders sobre a criação do Stakeholder Group de Afrodescendentes na ONU

No entendimento de Oli Henman, copresidente do Mecanismo de Coordenação dos Major Groups e Outros Stakeholders, a participação ativa de organizações de afrodescendentes em cada uma das sessões recentes do Fórum Político de Alto Nível sobre Desenvolvimento Sustentável (HLPF) foi muito importante para levar à criação do Stakeholder Group de Afrodescendentes na ONU. O grupo irá beneficiar não apenas os afrodescendentes do Brasil, mas também todas as diásporas ao redor do mundo.

“Muitos outros grupos de partes interessadas reivindicaram o reconhecimento dessa identidade e a oportunidade de uma maior compreensão das injustiças históricas na ONU”, argumentou Henman nessa entrevista exclusiva a Geledés como uma das justificavas para a criação desse grupo.

A primeira reivindicação de Geledés por um Stakeholder Group de Afrodescendentes se deu publicamente na ONU em setembro de 2023. É preciso entender que esse grupo funciona como uma plataforma em que há intensa troca para a elaboração de políticas públicas e instrumentalização para a efetivação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). 

Neste contexto, Henman destacou o papel de Geledés, como organização de mulheres negras, no árduo processo de pleito da formatação desse grupo na ONU. “Representantes de Geledés se destacaram como palestrantes em sessões importantes, como parte do Grupo Principal de ONGs e do Grupo Principal de Mulheres. Será muito útil continuar e aprofundar essa colaboração com todos os grupos de partes interessadas no mecanismo (Major Groups & other Stakeholders)”, afirmou.

Reconhecidos pelas Nações Unidas, os chamados Major Groups e Outros Stakeholders são os grupos de articulação entre a sociedade civil e os organismos internacionais, estabelecidos durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92), como parte da Agenda 21, com o objetivo de garantir a participação da sociedade civil. Os Major Groups and Other Stakeholders participam ativamente de conferências da ONU, como o Fórum Político de Alto Nível (HLPF), a Conferência de financiamento para o desenvolvimento, a Assembleia Geral e outros.

Nesta sexta-feira, 23, Geledés iniciou formalmente sua participação nas reuniões virtuais semanais do mecanismo de coordenação, como explica Henman. Leia abaixo a íntegra da entrevista.

Geledés – O que representa a criação do Stakeholder Group de Afrodescendentes na ONU não apenas para o Brasil, como também para outras diásporas ao redor do mundo, principalmente nesse momento de ataques ao multilateralismo?

A criação do Stakeholder Group de Afrodescendentes representa um momento importante para demonstrar a relevância da participação de grupos que representam a diversidade das sociedades em cada parte do mundo.

Geledés – Como analisa a atuação de Geledés nos fóruns da ONU, perante esse processo que começou em setembro de 2023, com uma requisição pública de um Major Group dos Afrodescendentes?

Os grupos afrodescendentes têm sido muito ativos em cada uma das sessões recentes do Fórum Político de Alto Nível sobre Desenvolvimento Sustentável (HLPF). Representantes de Geledés se destacaram como palestrantes em sessões importantes, como parte do Grupo Principal de ONGs e do Grupo Principal de Mulheres. Será muito útil continuar e aprofundar essa colaboração com todos os grupos de partes interessadas no mecanismo (Major Groups & other Stakeholders).

Geledés – Como se chegou ao entendimento de que seria realmente necessária a criação desse grupo e, nesse sentido, qual foi o passo a passo até se chegar ao anúncio da criação do grupo?

O ponto importante para a formação do novo grupo de partes interessadas foi o reconhecimento da identidade específica e da história única dessa população (de afrodescendentes). Muitos outros grupos de partes interessadas reivindicaram o reconhecimento dessa identidade e a oportunidade de uma maior compreensão das injustiças históricas na ONU.

Geledés – Uma vez definidos os Major Groups e outros stakeholders como grupos de articulação entre a sociedade civil e os organismos internacionais, como essas interlocuções acontecem na ONU e como elas se transformam em medidas concretas que vão favorecer a sociedade civil, e nesse caso, mais especificamente os afrodescendentes?

O Mecanismo de Coordenação dos Major Groups e outros Stakeholders mantém diálogo regular com a ONU sobre questões relacionadas ao acompanhamento e à revisão dos ODS. Isso inclui reuniões semanais de coordenação e diálogo regular com a agência relevante da ONU – a UN DESA –, bem como com o presidente do ECOSOC (que preside o HLPF). Os grupos também têm o direito de enviar um documento de análise completo sobre os ODS em revisao à ONU e têm a oportunidade de nomear palestrantes como parte de um processo coletivo.

Geledés– Uma vez criado o Stakeholder Group de Afrodescendentes, qual o próximo passo? Quem poderá participar?

Os representantes do novo grupo são agora convidados a participar nas reuniões semanais regulares do mecanismo de coordenação e a juntar-se aos vários grupos de trabalho que preparam o trabalho coletivo para o próximo Fórum de Alto Nível.

Geledés- No evento “Fortalecendo o papel dos Major Groups e outros Stakeholders”, promovido por Geledés em julho do ano passado, e do qual o senhor participou, Rashima Kwatra, coordenadora do Major Group LGBTQI e copresidente do MGO, questionou a dependência de países do Norte global no financiamento de pautas de Direitos Humanos. Como o senhor vê isso em relação aos Major Groups em um momento em que há cortes para as organizações de Direitos Humanos?

O financiamento para as atividades da ONU está significativamente ameaçado no momento. Em particular, o financiamento vinculado aos Direitos Humanos e à diversidade foi reduzido por vários doadores importantes do Norte global, como os EUA. Será importante identificar oportunidades de financiamento independente para organizações da sociedade civil e de Direitos Humanos no futuro.

Geledés – Neste mesmo evento, Carole Ageng’o, do Major Group de Envelhecimento, abordou as consequências do racismo estrutural e do tokenismo nos espaços multilaterais da ONU. Como enfrentar esse racismo nas instituições da organização?

Há uma oportunidade importante para mudar o equilíbrio entre experiência e engajamento na ONU, a fim de aprender com origens mais diversas e combater o racismo. Dada a redução de investimentos do Norte Global, pode haver uma oportunidade maior para países do Sul Global, como o Brasil, demonstrarem um conjunto diferente de prioridades.

Kátia Mello é jornalista de Geledés e Mestre em Estudos Africanos pela Universidade de Birmingham, no Reino Unido

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