Justiça de SP condena shopping a pagar R$ 10 mil de indenização a menino negro que foi impedido de entrar no estabelecimento

Enviado por / FonteG1

Bourbon Shopping recorreu da sentença e pediu que valor seja reduzido para R$ 3.000. Caso ocorreu em 2019, e, à época, estabelecimento informou, em nota, que 'seguranças agiram em conformidade à orientação de abordar qualquer menor de idade desacompanhado que ingresse no shopping'.

A Justiça de São Paulo condenou o Bourbon Shopping, na Zona Oeste da capital paulista, a pagar indenização de R$ 10 mil a um menino que foi barrado por seguranças do estabelecimento a entrar no local.

O caso aconteceu em 2019, quando o garoto tinha 11. Ele estava acompanhado da mãe e da irmã de 2 anos, à época. Quando entravam no estabelecimento, um brinquedinho da filha menor caiu do lado de fora da porta de entrada.

A mãe ficou com a filha do lado de dentro do shopping e esperou o filho passar pela porta e pegar o brinquedo. O menino estava com dois copos de suco na mão e pegou o objeto da irmã. Quando se virou para entrar novamente, ele foi cercado por dois seguranças, que o impediram de entrar no local.

O juiz Danilo Fadel de Castro afirmou, em sua sentença, após analisar imagens de câmeras de segurança que fazem parte do processo, que elas “revelam, com clareza, a dinâmica da abordagem, extirpando qualquer dúvida quanto à grave falha na prestação dos serviços pelo réu”.

“Restou evidente que o primeiro segurança agiu de forma não razoável ao se sobrepor à passagem do autor, impedindo-lhe a entrada no shopping. Além disso, poucos segundos depois, outro segurança também se aproximou do autor, que, à época dos fatos, contava com apenas 11 anos de idade”, afirma.

Segundo o magistrado, houve “constrangimento indevido que caracteriza dano moral indenizável”.

“O procedimento adequado e esperado de um segurança é no sentido de que, ao encontrar uma criança sozinha, lhe dê amparo e proceda à imediata comunicação à central do shopping, o que não se viu no caso em análise”, finaliza.

O shopping entrou com recurso pedindo a redução do valor da indenização para R$ 3.000. O g1 solicitou posicionamento do estabelecimento, mas, até a última atualização desta reportagem, não havia recebido resposta. À época do acontecimento, o Bourbon divulgou nota em que afirmava que “os seguranças agiram em conformidade à orientação de abordar qualquer menor de idade desacompanhado que ingresse no shopping”.

Na época, foi registrado um Boletim de Ocorrência na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi) por preconceito racial. Segundo a sentença, ” o suposto crime de intolerância racial foi convertido em Inquérito Policial nº 2281501/2019 conduzido pelo DECRADI e após investigações, foi determinado o arquivamento do procedimento criminal ‘por ausência de justa causa para a deflagração da persecução penal'”.

Entenda o caso

Um menino de 11 anos, que estava acompanhado da mãe e da irmã de 2 anos, foi barrado por dois seguranças do Bourbon Shopping, na Zona Oeste de São Paulo, em setembro de 2019

O caso aconteceu quando o menino e mãe e a irmã saíam de uma lanchonete, que fica nas proximidades do shopping. A mãe resolveu continuar o passeio com os dois filhos no shopping. Quando entravam no estabelecimento, um brinquedinho da filha menor caiu do lado de fora da porta de entrada.

A mãe ficou com a filha do lado de dentro e esperou o filho passar pela porta e pegar o brinquedo. O filho estava com dois copos de suco na mão e pegou o objeto da irmã. Quando se virou para entrar no Bourbon Shopping, ele foi cercado por dois seguranças, que o impediram de entrar no local.

Inconformada com a situação, ela correu até os seguranças para saber o que estava acontecendo. “Eles me pediram desculpas, mas disseram que muitas crianças circulam a região para pedir dinheiro aos clientes e que acharam que meu filho era um deles”, disse a mãe.

A Polícia Militar foi chamada pela mãe, que identificou apenas um dos seguranças. O segundo agente que participou do bloqueio à criança segue sem identificação.

Segundo Ariel de Castro Alves, advogado da família na época da ocorrência, o BO foi feito com base no artigo 20 da lei 7716 de 1989. “Ela define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor. É um caso grave de racismo e discriminação social e econômica. A delegacia agora vai chamar o segurança acusado de racismo e discriminação e os representantes legais do shopping para que prestem esclarecimentos.”

Alves disse que o menino ficou abalado com o ocorrido. “Estamos sim num país racista. O menino ficou abalado e constrangido com a situação e disse que foi o pior dia da vida dele. E se fosse mesmo um menino em situação de rua e abandonado? Não poderia entrar no shopping? A Constituição Federal proíbe qualquer forma de discriminação.”

Em nota divulgada em 2019, o Bourbon Shopping disse que “a empresa informa que os seguranças agiram em conformidade à orientação de abordar qualquer menor de idade desacompanhado que ingresse no shopping, e reforça que a atitude dos profissionais visa única e exclusivamente à proteção deste público.”

O shopping informou ainda que “os dois seguranças, que trabalham para empresa terceirizada, foram identificados pela Polícia Militar. A empresa ressalta que repudia qualquer forma de racismo ou ato discriminatório.”

+ sobre o tema

O pardo e o mal-estar do racismo brasileiro

Toda e qualquer tentativa de simplificar o racismo é um tiro...

Quem ganha ao separar pessoas pretas e pardas?

Na África do Sul, o regime do apartheid criou a...

Justiça manda soltar PM que matou marceneiro negro com tiro na cabeça na Zona Sul de SP

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) concedeu nesta quarta-feira...

Promotor é investigado por falar em júri que réu negro merecia “chibatadas”

Um promotor de Justiça do Rio Grande do Sul é...

para lembrar

O pardo e o mal-estar do racismo brasileiro

Toda e qualquer tentativa de simplificar o racismo é um tiro...

Quem ganha ao separar pessoas pretas e pardas?

Na África do Sul, o regime do apartheid criou a...

Justiça manda soltar PM que matou marceneiro negro com tiro na cabeça na Zona Sul de SP

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) concedeu nesta quarta-feira...

Promotor é investigado por falar em júri que réu negro merecia “chibatadas”

Um promotor de Justiça do Rio Grande do Sul é...
spot_imgspot_img

O pardo e o mal-estar do racismo brasileiro

Toda e qualquer tentativa de simplificar o racismo é um tiro no pé. Ou melhor: é uma carga redobrada de combustível para fazer a máquina do racismo funcionar....

Quem ganha ao separar pessoas pretas e pardas?

Na África do Sul, o regime do apartheid criou a categoria racial coloured, mestiços que não eram nem brancos nem negros. Na prática, não tinham...

Justiça manda soltar PM que matou marceneiro negro com tiro na cabeça na Zona Sul de SP

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) concedeu nesta quarta-feira (27) habeas corpus ao policial militar Fábio Anderson Pereira de Almeida, réu por assassinato de Guilherme Dias...