Justiça Federal absolve jovem negro acusado de ‘racismo reverso’ em rede social

Ele era réu pelo crime de racismo, acusado de ter incitado discriminação contra brancos e pregado ódio entre raças. Juiz disse não crer em ‘racismo reverso’ porque ‘nunca houve escravidão reversa’.

Por Mariana Oliveira e Fernanda Vivas, do G1

O juiz João Moreira Pessoa de Azambuja, da 11ª Vara Federal de Goiás, absolveu um jovem acusado de “racismo reverso” por postar, em uma rede social, conteúdos considerados ofensivos a brancos. Para o magistrado, não existe “racismo reverso” porque “nunca houve escravidão reversa”. A decisão foi lançada no processo nesta quarta-feira (29).

Segundo a denúncia do Ministério Público Federal, o jovem Diego Lima criou um post na rede social em julho de 2018, no qual “praticou e incitou a discriminação de raça ou cor, por intermédio do meio de comunicação social (Facebook), tendo feito reiteradas declarações pregando, com incitação ao ódio, a separação de raças, inclusive citando mulheres negras que se relacionam com homens brancos (caucasianos)”.

Ele virou réu pelo crime de racismo em fevereiro do ano passado, mas o caso ainda não tinha ido a julgamento.

Ao analisar o processo, o magistrado fez um histórico da escravidão no Brasil e afirmou que o conceito de racismo reverso é “evidente equívoco interpretativo”.

Segundo ele, “a pessoa branca nunca foi discriminada em razão da cor de sua pele”; nunca foi “impedida de ingressar em restaurantes, clubes, igrejas, ônibus, elevadores”; e “nenhuma religião de matriz europeia sofreu discriminação no Brasil, a ponto de seus praticantes serem perseguidos e presos”.

“Nunca se fez necessária a adoção de políticas de ações afirmativas para as pessoas brancas por não existir quadro de discriminação histórica reversa deste grupo social nem necessidade de superação de desigualdades históricas sofridas por pessoas brancas. Diante de tal cenário histórico e social, o conceito de racismo reverso constitui evidente equívoco interpretativo”, considerou o juiz.

“Não existe racismo reverso, dentre outras razões, pelo fato de que nunca houve escravidão reversa, nem imposição de valores culturais e religiosos dos povos africanos e indígenas ao homem branco, tampouco o genocídio da população branca, como ocorre até hoje o genocídio do jovem negro brasileiro. O dominado nada pode impor ao dominante”, completou.

O magistrado considerou que “não faz sentido” pedir a aplicação da lei do racismo para suposto caso de discriminação contra brancos. E afirmou que, no caso, não existe nenhuma prova de que a postagem tenha tido intenção de ofender ou subtrair direitos da população branca.

O jovem foi defendido no processo pela Defensoria Pública da União. Na manifestação final no processo, a defensora Mariana Costa Guimarães afirmou que a acusação era uma “deslealdade intelectual”.

“O posicionamento adotado pelo parquet (MP) no presente caso é teratológico e beira ao absurdo. Assim, a defesa recorre ao bom senso deste Juízo, pois sabe-se que o branco nunca saberá o que é ser inferiorizado, subjugado e humilhado por sua cor”, diz a defesa.

“No particular, os argumentos aduzidos pela acusação em seus memoriais escritos, quando invocou o princípio da isonomia para concluir que o racismo contra um branco estaria equiparado pela lei penal, não passam de um constrangimento epistêmico e deslealdade intelectual.”

+ sobre o tema

Alunos de arquitetura da UFMG se recusam a projetar casa com área para empregados

Em nota, estudantes da UFMG pedem cancelamento do trabalho...

Especialista de universidade catalã aborda produção discursiva do racismo

  Racismo e discurso político é o tema da conferência...

Meia do Leicester é alvo de racismo em rede social após derrota para o Liverpool

Hamza Choudhury recebeu apoio do clube Do Esporte  O Leicester City...

para lembrar

Comandante da PM acusado de racismo em Campinas é transferido

  O capitão da PM, que ordenou a abordagem de...

Vítima de racismo em bar da Tijuca convoca para manifestação

Nossa luta!!! #juntossomosmaisfortes Posted by Leonardo Valentim on Quinta, 26 de...

Ludmilla processa Val Marchiori por injúria racial

Funkeira exige indenização por danos morais após comentário da...

Além da morte física a jurídica diz Hamilton Borges

A decisão da Justiça de absolver os nove policiais...
spot_imgspot_img

SP: Condomínio é condenado após mandar homem negro para entrada de serviço

O condomínio de alto padrão Quinta do Golfe Jardins, em São José do Rio Preto (SP), foi condenado a indenizar um homem negro em...

Três policiais são considerados culpados no caso de espancamento e morte de homem negro nos EUA

Três policiais acusados ​​de espancar o jovem afro-americano Tire Nichols, em 2023, foram considerados culpados por um tribunal federal, nessa quinta-feira, por manipulação de...

Juízes não seguem o STF e barram cotistas em concursos de universidades com três vagas ou menos

Instituída há dez anos, a lei que reservou a negros 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos ainda enfrenta obstáculos para ser aplicada em...
-+=