Lucas Mendes: Algo de podre

Na alfabetização comunista da minha geração, o Mississippi ocupava lugar de destaque nos males do capitalismo, exemplo do fracasso americano, Estado símbolo do racismo e da pobreza.

Até hoje, o Estado vive na zona de rebaixamento em educação, saúde, renda per capita e qualidade de vida.

Mas outro Estado, o Arizona, vinha buscando o título de campeão da discriminação americana, neste caso, contra os latinos.

Nas eleições de terça-feira passada, os eleitores do Arizona defenestraram um dos campeões da discriminação de imigrantes, dos cortes em saúde e educação e do poder federal.

O senador estadual republicano Russel Pearce, um dos ídolos do Tea Party, sofreu uma derrota surpreendente e humilhante contra um democrata estreante em política, Jerry Lewis.

Russel Pearce conseguiu aprovar uma das leis mais infames do país, a SB 1070, Senate Bill 1070. A lei, aprovada em junho e contestada pelo governo federal no Judiciário, transforma em criminoso quem estiver no Arizona ilegalmente.

Ou seja, se você é um imigrante sem visto, vivendo, trabalhando ou visitando o Estado, você é um criminoso. Cadeia para você.

Perplexo, com olhar de espanto, diante da derrota de 53% a 47% ao tentar se reeleger para o 11º mandato, disse às câmeras e seus eleitores: “Se o preço de falar a verdade é a derrota, assim seja”.

E lá se foi o senador Russel, antes tarde do que nunca.

Fazendeiros e consumidores de todo país, de maçãs, alfaces, pêssegos, melões, tomates, pimentões, laranjas, mirtilos e dezenas de outras frutas e legumes tiveram um momento de alívio e esperança, mas outros Estados, entre eles Alabama e Geórgia, aprovaram leis brutais e demagógicas contra imigrantes e agora colhem o que plantaram.

Até Estados progressistas como o Maine, que na década de 90 foi um exemplo de abusos de latinos no campo e hoje é um exemplo de bom tratamento de imigrantes legais e ilegais, teve problemas nas fazendas.

O Maine é o maior produtor de mirtilo do mundo e a colheita da fruta é a mais bem remunerada da costa leste: US$ 1.350 por semana para um bom colhedor, e todos eles são latinos.

A fruta é abundante na área de maior desemprego do Estado, 12.2%, mas os locais não vão para o campo. Preferem o cheque do governo de US$ 265 por semana.

O trabalho no campo é brutal. Os americanos duram dois ou três dias na colheita e desistem. Antes da proibição de crianças no campo, um mexicano de 8 anos no Maine colhia 3 vezes mais cestas de mirtilo do que um adulto americano e esta não é a única fruta.

Quatro latinos ganham US$ 150 por dia colhendo de 250 a 300 caixas de tomates no Alabama. Vinte e cinco americanos colhem 200 caixas e ganham US$ 24 por dia, menos do que ganham se ficam na vadiagem e recebem o cheque de desemprego.

Os governadores do Alabama e da Geórgia acham que o fracasso desta colheita será corrigido no futuro quando os americanos desempregados e sem opções se virem forçados para ir o campo, mas os dados mostram que o número de vistos temporários de trabalho para los gringos dobrou nos últimos três anos em busca de empregos no vizinho de cima, Canadá.

Quase todo trabalho de colheita manual é feito por um milhão de imigrantes ilegais que começam a trabalhar nos laranjais da Flórida em dezembro, sobem para colher pimentões verdes e melões na Geórgia, mais um pouco para colher tabaco na Carolina do Norte e Virgínia, um pouco mais para as melancias em Delaware, depois os tomates e pêssegos em Nova Jersey, em julho estão no Maine para os mirtilos, e daí seguem para as maçãs e peras em Nova York. Daí, de volta para os laranjais da Flórida.

A horticultura gera US$ 144 bilhões por ano e os americanos comem fartamente algumas das melhores frutas pelos preços mais baixos do mundo.

Os ilegais fugiram do Alabama e da Geórgia porque as leis radicais afetam não só o trabalho no campo como todos os aspectos do dia a dia, como escolas e assistência médica.

O senador Russel Pearce quase aprovou uma lei que proibia cidadania americana para filhos de ilegais.

A realidade está no calcanhar dos xenófobos e demagogos americanos. Há dez anos, os Estados Unidos deportavam 500 mil ilegais por ano. Ano passado deportaram 80 mil.

Neste ritmo, em breve terão de proibir ilegais de sair do país ou pagar US$ 5 por uma maçã. Mais do que nunca precisam dos latinos no campo e a maioria deles trabalha com documentos falsos, pagam impostos e uma Previdência que jamais será recolhida. O Tio Sam embolsa a grana, cospe um caroço e agradece.

Fonte: BBC Brasil

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