Certa vez, uma pessoa perguntou à ativista Maria José Menezes porque o movimento de mulheres negras propõe marchas ao invés de caminhadas. Ela respondeu: “Não estamos ali de uma forma confortável, não estamos pedindo licença para ir para rua, [ao marchar] nós exigimos que os nossos direitos fundamentais sejam respeitados, inclusive o direito à vida”.
Integrante da Marcha das Mulheres Negras de São Paulo, Zezé, como é carinhosamente chamada, é graduada em Ciências Biológicas e mestra em Patologia Humana. Natural de Alagoinhas (BA), vive em São Paulo (SP). Ativista desde os 15 anos de idade, participou ativamente da organização da Primeira Marcha Nacional de Mulheres Negras, que ocorreu em 2015, apesar de não ter conseguido estar presente no ato.
“O principal das marchas é a construção, se finaliza com o evento, que esse ano vai ser no 25 de novembro, mas a construção nas periferias, no seio da comunidade de mulheres negras, é o principal”, diz. Segundo ela, a mobilização para a primeira marcha possibilitou o crescimento e o fortalecimento de organizações de mulheres negras.
Maria lembra do contexto político em que a marcha foi realizada, em um período de fragilidade democrática e ascensão da extrema direita. Mesmo diante desse cenário, ela pontua que “a Marcha de 2015 foi um dos principais movimentos reivindicatórios populares do Brasil”.
Uma década depois, o cenário social e político ainda é desolador. A ativista ressalta pontos como o avanço do negacionismo, a redução da renda da população e a letalidade maior de negros durante a pandemia de covid-19. Acrescenta ainda que a Carta feita pelas proponentes da Marcha de 2015 permanece atual.
“O tecido social está muito mais esgarçado. Penso que se não houvesse mobilização da sociedade civil, do movimento negro e do movimento de mulheres negras, a sociedade estaria em um patamar muito pior”, reforça Maria José.
Nesse sentido, marchar por reparação e Bem Viver – motes do ato de 2025 – é urgente. E reivindicar reparação significa reivindicar o fim dos privilégios da branquitude, incluindo políticas públicas de seguridade social em todas as fases da vida.
Já o Bem Viver, se traduz na convivência harmônica e respeitosa entre todos os seres e a natureza. “Não é ter uma conta com bilhões, que não se sabe onde gastar e ver as pessoas morrerem de fome, mas, ao contrário, é que todos convivam em harmonia”.
Diante disso, a ativista reflete:

Maria conta que pretende estar presente na Marcha de 2025 e, por mais que não tenha a visibilidade que merece, é uma ação necessária. Servindo, inclusive, para provocar o parlamento brasileiro, que tem se mostrado inimigo do povo. “A Marcha de 2025 está carregada de muitas dores, nossas dores estão muito exacerbadas e precisam ser mostradas para a sociedade brasileira”.
A conversa com Maria José Menezes integra a série de entrevistas “Mulheres Negras em Marcha”, que vai dialogar com ativistas do movimento de mulheres negras de diferentes gerações e regiões do país, a fim de pautar a 2ª Marcha Nacional de Mulheres Negras, que acontecerá no dia 25 de novembro, em Brasília. As entrevistadas vão relatar suas trajetórias de luta, seu engajamento nas marchas e os motivos que as fazem marchar cotidianamente.
A Marcha das Mulheres Negras por Reparação e Bem Viver trata-se de uma continuação do movimento que aconteceu em 2015 e reuniu milhares de militantes em Brasília: a Marcha das Mulheres Negras contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver. Uma década depois, o movimento de mulheres negras pretende reunir 1 milhão de marchantes na capital do país a fim de reivindicar um novo pacto civilizatório.