Mas, afinal, alguém ainda esperava que o Grammy fosse da Beyoncé?

O Grammy Awards tem o mesmo problema que diversas premiações americanas têm. A maioria dos indicados são brancos, a maioria dos ganhadores são brancos e a maioria dos votantes para as premiações são brancos.

Se no ano passado o Oscar foi denunciado pelos usuários do Twitter com a hashtag #OscarSoWhite (O Oscar é Muito Branco), neste ano, o Grammy Awards foi acusado por toda a internet de racismo por ignorar o álbum ANTI da Rihanna e dar apenas dois prêmios para Lemonade, de Beyoncé.

A maior premiação da música usou e abusou da imagem das duas cantoras como chamariz de audiência mas, na hora de retribuir com prêmios, deixou a desejar. O Grammy, pela primeira vez, inverteu uma categoria que era televisionada com uma categoria técnica, para não cometer a gafe de deixar Beyoncé sem receber algum prêmio durante o evento: a categoria “Best Urban Contemporary Album” foi trocada de lugar com a categoria “Best Vocal Pop Album”. Assim, a cantora ganharia alguma coisa no live show e não sairia de mãos vazias.

O discurso de Beyoncé quando ganhou o gramofone de “Best Urban Contemporary Album” também nos deu certeza de que o prêmio não iria para ela. Ela fez um discurso digno de álbum do ano. Ela possivelmente sabia que não levaria este prêmio. O site Lainey Gossip fala que ela provavelmente descobriu isso durante as negociações de sua performance.

O Grammy tem um histórico racista muito forte. Em 2015 a revista Rolling Stone escreveu um artigo intitulado “O Grammy tem algum problema com raça?“, onde expôs as indicações de Iggy Azealia para as categorias de “Best New Artist e Record Of The Year” e não indicou nenhum artista negro para tais categorias. Inclusive, a maioria das indicações destas categorias são de artistas brancos.

Dos 59 anos de premiação, artistas negros levaram o gramofone de Melhor Álbum do Ano apenas 12 vezes. A última mulher negra a levar o prêmio foi Lauryn Hill, em 1999, por The Miseducation of Lauryn Hill. Dos 22 prêmios que Beyoncé ganhou, 18 são em categorias de R&B e de “música urbana”. Muitas pessoas acusam o Grammy de usar estas categorias como “prêmio de consolação” para os artistas negros, já que eles nunca ganham ou concorrem nas categorias principais. Além disso, a academia tem esnobado álbuns de artistas negros (que tiveram a melhores notas entre os críticos musicais) há bastante tempo: em 2013, quando Frank Ocean perdeu para Mumford and Sons, em 2014 Daft Punk ganhou de Kendrick Lamar, em 2015 Beck ganhou de Beyoncé, em 2016 Taylor ganhou de Kendrick Lamar e em 2017 Adele ganhou de Beyoncé. O problema, aqui, não é ganhar ou perder: o álbum perdedor sempre tem melhores avaliações ou maior impacto, mas foi feito por um artista negro.

Foto: Reprodução/Café Radioativo

E claro, não estou querendo tirar o mérito de Adele por ter ganhado os prêmios que ela ganhou. Afinal, é incontestável que Adele é incrível e que seu álbum 25 mereceu os prêmios que ganhou. A crítica aqui é outra. Lemonade realmente fez alguma coisa pela vida das pessoas, realmente ajudou muitos a encontrar e se encontrar como seres humanos. Trouxe a questão tão séria e complexa da solidão da mulher negra para a mídia mainstream. E mesmo assim, não ganhou mais do que dois gramofones. Afinal, alguém ainda achava que o Grammy, com este histórico de boicote aos artistas negros, realmente seria da Beyoncé?

O que nos consola é saber que a limonada está guardada e jamais azedará, se depender de nós.

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