Racismo: Mais do Mesmo

Fonte:Blogspot- Acordei que sonhava


Sempre que posto sobre temas polêmicos fico esperando a reação em e-mails e comentários, sabendo que vou ter um longo trabalho de argumentação pela frente.

Por isso, ontem à noite, quando abri minha caixa de e-mail e me deparei com uma mensagem com o título “Um Post Racista”, já esperava o pior.

Minha surpresa foi que, na verdade, se tratava de uma parabenização pelo meu ponto de vista e um adendo com outro texto na mesma linha, ambos escritos pelo advogado José Roberto Militão, afrobrasileiro (conforme se definiu), e ativista contra o racismo. Fiquei muito emocionada por ter conseguido desenvolver o mesmo ponto de vista de uma pessoa que sofre a discriminação, sem dúvida um dos melhores momentos em mais de dois anos de blog.

Com a permissão do autor, transcrevo aqui seu artigo.

“Prezados, viver a vida sem reflexão, não vale a pena ser vivida, é a velha máxima socrática a que peço vênia sempre que preciso de interlocutores e para que sirva à interlocução.

A despeito do entusiasmo dos comentários emitidos, confesso, após ler e reler o longo artigo do Gentile, não gostei. Compreendo uma certa dose de tolerância de meus nobres colegas do No-Race, com o que dizia Sartre: “somente as vítimas do racismo compreendem a violência contra a dignidade humana da ofensa racial. Nós podemos e devemos ser solidários, porém, jamais podemos nos colocar no lugar dos oprimidos raciais”, raciocinava.

Acho que nessa questão do combate ao racismo, ou a qualquer tipo de discriminação, o humor oportunista não ajuda, pois para ter graça numa sociedade vincada pela cultura do racismo, o emissor precisa falar (e pensar) no tom médio do seu ouvinte. É o que faz Gentile.

O autor, tentou, em seu arrazoado demonstrar um ´desprezo´ aos conceitos raciais. Porém os emprega e reproduz. E o faz, com intento de injúria quando insiste em que a designação dos pretos como ´macacos´, seria por simples semelhança, e não por associação racista. Mas embora diga isso, no fundo, ele faz sim a associação racista, aquela de que os pretos são uma subespécie, mais próxima do macaco do que dos humanos. É nesse contexto que a idéia da ofensa dos pretos por ´macacos´ foi criada e é assim que Gentile faz uso, intencional, dessa associação racista. “Mas se alguém chama um preto de macaco é crucificado. E isso pra mim não faz sentido. Qual o preconceito com o macaco? Imagina no zoológico como o macaco não deve se sentir triste quando ouve os outros animais comentando: – O macaco é o pior de todos. Quando um humano se xinga de burro ou elefante dão risada. Mas quando xingam de macaco vão presos. Ser macaco é uma coisa terrível. Graças a Deus não somos macacos.”

Prezados, não é a toa que a ofensa racial mais comum e mais popular que explode nos estádios de futebol, nas quadras, no tênis ou em qualquer ambiente de multidões é essa: ´macaco´ com que a turba irada e ignara procura atingir os atletas. Não há ofensa mais sentida pelos pretos do que a de ser chamado de ´macaco´. Essa dói, e dói profundamente, pois representa a mais expressa negação de nossa humanidade. Aquela negação nuclear do racismo.

Mais ainda, se conferirem a íntegra do texto, tem um parágrafo inteiro em que confessa um pertencimento racial, mesmo que o faça, para dizer que não tem orgulho de pertencer a ´essa raça branca´: “Se você acha que vai impor respeito me obrigando a usar o termo “negro” ou “afro-descendente”, tudo bem, eu posso fazer isso só pra agradar. Na minha cabeça você será apenas preto e eu branco, da mesma raça, a raça humana. E você nunca me verá por aí com uma camiseta escrita “100% humano”, pois não tenho orgulho nenhum de ser dessa raça que discute coisas idiotas de uma forma superficial e discrimina o próprio irmão.”

Vejam, porque ele se refere a uma camiseta escrita ´100% humano´ e não, se queria ser irônico ou sarcástico, não se refira a uma camiseta `100% branco´. Será que o autor, associa o fato de ser branco a ser 100% humano e aos ´macacos´ apenas o equivocado direito de reivindicarem 100% negros?

Perdoem-me, pois, convoca-los a ser críticos nesse episódio e o faço distante de advogar um ´politicamente correto´ para fins de consumo, o faço, convicto que a luta contra a crença em raças nos exige conviver por longo tempo com pessoas deformadas, porém, reconhecendo nelas, como reconheço nesse Danilo Gentile, também com vítimas involuntárias de uma cultura defeituosa.

Não gostei do artigo, e vendo, (copiado abaixo) a sucessão de fatos que o motivaram, inicialmente não havia uma ofensa explicitada, a ofensa veio no longo texto, tentando dizer que suas piadas racistas não eram racismo. Acho mesmo que foi uma provocação oportunista sem consideração pelos ofendidos.”

 

Matéria original: Mais do Mesmo

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