Logo quando nasci fui diagnosticada com microcefalia, meu crânio era menor do que a média e por isso os médicos chegaram a dizer para os meus pais que eu poderia não falar, andar ou me alimentar sozinha.
Com nove dias de vida fiz a minha primeira cirurgia para correção na face, porque nasci com um afundamento no rosto que prejudicava a minha respiração. Até os meus 12 anos – período de crescimento do crânio – foram sete cirurgias. Todos os procedimentos foram para correção do tamanho da minha cabeça para que o meu cérebro pudesse se desenvolver e não prejudicasse as minhas atividades motoras e intelectuais.
Comecei a frequentar a escola, em Campo Grande, ainda na pré-escola. Meus pais e professores sempre acompanharam o meu desenvolvimento de perto e me deram liberdade para que eu desenvolvesse a minha autonomia.
Desde pequena gostava muito de estudar e já no ensino fundamental eu adorava as disciplinas da área de humanas, como português e história, mas fazer contas sempre foi um desafio.
‘Fui vítima de preconceito e me isolei na escola’
Por ter cicatriz de uma cirurgia bem aparente na testa fui vítima de bullying e preconceito. Alguns colegas de sala me deixavam de lado e diziam que a minha doença, que na verdade é uma síndrome, era contagiosa.
Os olhares das pessoas me acuavam e cada vez mais fui me isolando do convívio com outros alunos e acabei não tendo muitos amigos nessa fase da vida. Devido à microcefalia, a minha saúde também exigia alguns cuidados. Até os 13 anos fiz acompanhamento com uma equipe multidisciplinar que acompanhava de perto o meu desenvolvimento. Também tive convulsões e até os 12 anos tomava remédios como Gardenal e Tegretol para controlá-las.
‘Na faculdade, decidi escrever um livro sobre a síndrome’
Quando terminei o ensino médio logo quis ingressar em uma faculdade. Escolhi estudar direito, mas não me adaptei e abandonei os estudos no primeiro ano. A paixão pela escrita e pela leitura me fez ingressar na faculdade de jornalismo em 2011. Escolhi este curso para dar voz a pessoas que, como eu, não se sentem representadas e por considerar que a informação liberta o ser humano.
Na faculdade os preconceitos acabaram. Muitos dos meus colegas de sala nem sabiam que eu tinha microcefalia. Grande parte deles descobriu minha síndrome apenas no último ano
Como não poderia ser diferente, resolvi trabalhar no trabalho final o tema que me acompanhou desde o meu nascimento: escrevi um livro sobre microcefalia. O resultado? Tirei 9,6 e fui aprovada como uma das maiores notas do curso.
Com dificuldades para conseguir um emprego na área, resolvi, em 2016, começar um novo curso, o de letras. No final de 2020 tive mais uma vitória: a segunda graduação.
‘Sonho em dar aula para crianças com deficiência’
Agora, como professora, vejo que por meio da educação posso realizar mais um sonho: dar aulas para crianças com deficiência ou algum transtorno e contribuir para o desenvolvimento delas, tanto na área da educação como também na questão pessoal e de auto-aceitação.
Agora faço pós-graduação em psicopedagogia e no próximo ano pretendo cursar psicologia. Estudar nunca é demais.
Agora me divido entre meu emprego no departamento de marketing de uma faculdade e começo este ano a trabalhar como auxiliar de sala, onde vou poder contribuir para que crianças com deficiência se desenvolvam, sem preconceitos ou até mesmo limitações.
Meu maior sonho é trabalhar exclusivamente com crianças com deficiência física, motora ou intelectual. Para isso quero ter uma escola voltada para elas e criar um espaço especializado e sem preconceitos.