Momentos Olímpicos: Para 1º brasileiro bicampeão, palmas em derrota foi seu instante mais memorável

Adhemar Ferreira da Silva , o mais bem sucedido esportista brasileiro da história das pistas, o único bicampeão olímpico do Brasil em atletismo – no salto triplo – teria eleito como seu maior momento nos Jogos curiosamente sua pior participação, segundo o jornalista especializado em esportes amadores Alberto Chammas.

“Em Roma, em 1960, ele enfrentava problemas físicos e não conseguiu boas marcas. Ao deixar o estádio, ouviu aplausos e pensou que eram para algum outro atleta, mas ao ver que eram para ele, foi até o alambrado”, diz o jornalista, que também foi amigo pessoal de Adhemar.

“Aos poucos, o estádio todo começou a aplaudi-lo. Adhemar então deu a volta, cumprimentando a todos. No dia seguinte, os jornais italianos deram destaque a essa ‘volta olímpica’. Ele mesmo me disse que esse foi seu maior momento, a ‘medalha’ mais importante”, conta Chammas.

“Porque ser ovacionado quando se está no pódio, após um feito, é compreensível. Mas após um fracasso, é um sinal enorme de reconhecimento. Não é para qualquer um”, completa.

De fato o termo “especial” pode ser aplicado a Adhemar sem medo. Muitos inclusive creditam a ele a criação da primeira volta olímpica, em 1952, na Olimpíada de Helsinque.

Após conquistar o ouro – quebrando três recordes olímpicos nesse processo – Adhemar foi para perto do público que o aplaudia, circundando o estádio enquanto acenava, dando origem, segundo alguns relatos, para a expressão.

Estrelas

adhemar recordeEle foi o primeiro a romper a marca dos 16 metros, considerada o ´limite humano’ na época

Quatro anos depois, o atleta voltou a ser o melhor, nos Jogos de Melbourne. Demorou outros 48 anos para que o Brasil voltasse a ter bicampeões olímpicos, com os iatistas Robert Scheidt,Torben Grael e Marcelo Ferreira e os jogadores de vôlei Giovanni e Maurício, em Atenas 2004.

“Adhemar era um cara muito especial. Extremamente sério. Parte do seu sucesso, além de ter um corpo predisposto ao esporte, era se empenhar totalmente aos treinos”, diz Chammas.

Adhemar Ferreira seguiu durante toda a carreira as orientações do exigente técnico alemão Dietrich Gerner, primeiro no São Paulo, depois no Vasco da Gama. As duas estrelas douradas presentes no distintivo do clube paulistano são pelos ouros olímpicos de seu ex-atleta.

“Ele se ressentia de que a torcida do São Paulo nem sabia quem ele era. Muitos achavam que as estrelas eram por causa dos Mundiais em Tóquio”, afirma Chammas.

Aliás, sua lista de conquistas é extensa: foi dez vezes campeão brasileiro, pentacampeão sulamericano e tricampeão panamericano. Ao todo são mais de 40 troféus.

Chammas diz que o ex-atleta costumava lembrar das dificuldades de seu tempo, afirmando que, se tivesse disponíveis os recursos de preparação dos atletas atuais, seria praticamente “imbatível”.

“Ele dizia que em sua época de atleta, não tinha essas coisas de suplementos alimentares, vitaminas, mas comia as refeições feitas por sua mãe, à base de arroz com chuchu”, diz o jornalista.

Feitos

Fora das pistas, Adhemar atuou no filme Orfeu Negro, vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 1960.

Passou três anos como adido cultural brasileiro na Nigéria, em meados da década de 1960.

Poliglota, era fluente em francês e inglês. Ainda como atleta, formou-se técnico em escultura e depois como professor de educação física. Posteriormente, conseguiu ainda os diplomas superiores de direito e relações públicas.

Chammas diz que, além da ovação de 1960, Adhemar costumava lembrar de quando venceu o ouro em 1952, na Finlândia.

“Ele dizia que muita gente do público o chamava para cumprimentá-lo e, em particular uma menina pequena. Ao se aproximar, ela disse que sua família o acolheria, que ele podia morar na casa deles”, relata.

adhemar180Adhemar era poliglota

“Ao voltar ao Brasil, Adhemar soube que um jornal de São Paulo havia feito reportagens sobre sua falta de recursos financeiros e organizado uma coleta para comprar uma casa para ele”, diz.

“Adhemar ficou com medo de que o COI (Comitê Olímpico Internacional) julgasse que ele havia deixado de ser amador e fez a mãe devolver a casa. Ela teria dito a ele: ‘Não se preocupe, porque um dia você terá uma casa em cada local do mundo’.”

“Pouco antes da olimpíada de 2000 em Sydney, Adhemar me disse ter recebido uma carta de uma senhora finlandesa que dizia ser ela a menina de Helsinque em 1952, que tinha visto uma reportagem sobre ele e suas condições financeiras. E que tinha em sua casa um quarto vago e ele poderia hospedar-se lá”, conta.

“Ele ficou feliz de ver a profecia de sua mãe realizada”, diz Alberto Chammas.

Desde 2012, Adhemar Ferreira da Silva, que morreu em 2001 aos 73 anos, tornou-se o único brasileiro a integrar o hall da fama da Federação Internacional do Atletismo (FIA).

 

 

Fonte: BBC Brasil

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