por TATIANE PATRON
Quando Meire Aparecida Barbosa saiu de casa ontem pela manhã com a filha e as duas netas o que ela menos podia imaginar era que passaria pela maior humilhação da sua vida. Ser chamada de macaca por um desconhecido em pleno estacionamento de supermercado.
Ontem, por volta das 10h30, ela aproveitou a folga do feriado para ir ao Supermercado Esperança, no centro de Sorocaba, para comprar produtos para casa. Enfrentou o trânsito que, mesmo com o feriado, não era dos mais calmos e quando entrou no estacionamento do supermercado, na rua 7 de Setembro, teve dificuldade para obter uma vaga. Viu um carro saindo, parou, sinalizou que ocuparia a vaga e quando achou que tudo estava bem, aconteceu o inesperado.
O agressor/ O pintor Flávio Aparecido Alexandre também saiu de casa ontem pela manhã com a intenção de aproveitar o feriado fazendo compras com a mulher e os filhos. Enfrentou o mesmo trânsito e o mesmo problema de falta de vaga no estacionamento, mas decidiu deixar a mulher entrar primeiro no supermercado, para ir adiantando as compras, e ficou esperando uma vaga no estacionamento. Achou que estava tudo certo quando viu um carro dando ré, mas se surpreendeu quando um outro carro, onde estava Meire, sinalizando que iria entrar na mesma vaga.
Quem são/ Meire Aparecida Barbosa tem 45 anos de idade sendo que 24 deles foram inteiramente dedicados à Polícia Militar, onde é soldado. Nunca sofreu um nenhum tipo de represália, tem a ficha profissional limpa, e mesmo quando está trabalhando nunca deparou com uma situação de racismo.
O pintor Flávio Aparecido Alexandre, tem 42 anos, e passagem pela polícia por tráfico de entorpecentes e ato libidinoso (ficou nu em local público). Mas cumpriu sua pena e vive uma vida limpa, trabalhando e cuidando da família.
O que diz Meire/ Nesse clima de stress atrás de um vaga para parar o carro que aconteceu toda a triste confusão de ontem.
O pintor Flávio viu que Meire sinalizava para ocupar a vaga, mas insistiu mesmo assim: “Eu o avisei que estava com duas crianças, ele disse que também estava e se exaltou. Ele gritou: Eu vou guardar meu carro na vaga. Que se dane, sua macaca. Pedi para ele repetir o que tinha dito e novamente ele gritou ‘macaca’. Quando ele saiu do carro fiquei com medo de ele me agredir.” Assim que a vítima avisou que chamaria a polícia, o homem pediu desculpas. Mas Meire achou pouco diante da humilhação que passou e quis dar o exemplo a filha e as netas para não tolerarem tamanha agressão sem propósito.
Meire chegou à delegacia para registrar o boletim de ocorrência aos prantos: “Não sou macaca, sou ser humano. A única diferença de uma pessoa para a outra é a pigmentação da pele. Se eu for doar sangue, poderá servir para qualquer outro ser humano, seja branco ou japonês”, reflete.
Meire acionou um advogado para que o caso seja levado adiante na Justiça e pedirá indenização por danos morais. “Seguirei com o processo, pois a lei existe para ser cumprida e servir de exemplo”, defende Meire.
O que diz Flávio/ O pintor, de dentro de cela conversou com o BOM DIA e contou a sua versão do fato: “Eu estava sozinho no carro, mas precisa pegar a minha esposa e meu filho que estavam dentro do supermercado, por isso discutimos pela vaga.”
Ele diz estar arrependido por ter ofendido a policial. “Eu sei que o que falei pode ser considerado racismo. Eu me arrependo e pedi desculpas.”
O que diz a lei/ O pintor foi levado para a delegacia do plantão sul, na avenida General Carneiro, onde continuará preso até que a fiança seja paga. Ele responde por injúria qualificada pelo racismo. Flávio admite que não tem dinheiro para pagar a fiança, então continuará encarcerado, informa a delegada Cássia Almagro Mezzomo.
A delegada informa que não é comum casos de injúria qualificada ser tratadas como racismo. “As pessoas estão conscientes que têm de respeitar o próximo, infelizmente ainda existem casos como esse”, comenta.
A delegada explica que o pintor não foi indiciado por racismo porque o crime é relacionado quando existem ações mais graves, como, por exemplo, impedir a entrada de um negro em um estabelecimento.
O crime por injúria qualificada pelo racismo, que enquadrou Flávio, é quando há uma agressão verbal como a registrada.
Crime de injúria e não racismo
Crime de racismo é relacionado com ações como, por exemplo, impedir a entrada de um negro em um estabelecimento. O crime por injúria qualificada pelo racismo é quando alguém xinga outro
3 anos é o máximo que o pintor poderá ficar preso. O menor tempo de cadeia é 1 ano
Sem dinheiro para a fiança
Para prisão em flagrante por crime de injúria qualificada pelo racismo tem fiança que pode variar entre um e seis salários mínimos. No caso do pintor, a delegada determinou o pagamento de 5 salários, igual a R$ 3.110. Mas ele não tinha como pagar e ficou preso
Fonte: Dia a Dia