Mulher é vítima de racismo durante almoço no trabalho

“Ele falou que queria que a escravidão voltasse para que eu fizesse sexo com ele, enquanto fingia que me chicoteava”, afirma Eunice Oliveira

Por Thalita Peres, da Marie Claire

Eunice Oliveira (Foto: Arquivo Pessoal )

Eunice Oliveira, 30 anos, foi vítima de racismo no escritório da Club Med, localizado em Botafogo, no Rio de Janeiro, no último dia 10.

Ela, que trabalha como agente de viagem e estava na copa terminando o almoço, foi agredida por um funcionário antigo da empresa. “O homem segurou meu braço e falou que queria que a escravidão voltasse, assim não teria conversa, que eu teria que fazer sexo com ele, enquanto fingia estar me chicoteando”, afirmou em entrevista à Marie Claire.

“Ele, que deve ter mais de 40 anos de empresa, soltava piadinhas machistas e sexistas, então, algumas mulheres não falavam com ele. Quando me agrediu, disse que não queria ouvir isso. Ele falava como se fosse ‘brincadeira’, como se fosse normal”.

Depois da agressão, Eunice tentou retomar o trabalho em sua mesa, porém não conseguiu. “Me bateu um desespero e uma vontade de chorar imensa. Chamei meu chefe direto para explicar o que tinha acontecido, que chamou um superior. Os dois queriam que eu fosse conversar com meu agressor, o que não queria fazer. Não queria que me visse nessa situação, não sabia como seria minha reação ao vê-lo. Então, os chefes foram conversar com o funcionário. O que ficou resolvido é que ele, quando me encontrasse pela empresa, pediria desculpas. E só”.

Ela ainda conseguiu ir trabalhar na empresa mais dois dias seguidos, mesmo assustada e sem dormir. “Procurei uma psicóloga que me disse que estava com estresse pós-traumático e me encaminhou uma psiquiatra, que receitou remédios para que eu conseguisse dormir, além de um atestado que me deixou cinco dias longe do Club Med”.

De volta ao escritório, mais um choque. “Achei que podia confiar no meu chefe direito, até que descobri que ele me xingou e me chamou de chata. Nunca esperei passar por isso, era uma pessoa que confiava. Até o momento, não tive apoio da Club Med. O RH só entrou em contato comigo por causa do atestado, não tive amparo algum deles”.

Eunice entrou com processo contra o antigo funcionário que a agrediu no refeitório, na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância, no Rio de Janeiro, e vai entrar com outro contra seu chefe direto.

Marie Claire Brasil procurou a Club Med. Em nota, afirmaram que o funcionário em questão foi afastado da empresa e que eles não compactuam com o racismo.

“Nós, do Club Med repudiamos de forma veemente o racismo bem como qualquer ato de razão discriminatória, seja com base em gênero, raça, credo ou qualquer outra natureza, tendo desligado o funcionário em questão assim que tomamos conhecimento do caso. Outras medidas com relação a este caso estão em andamento. Nos orgulhamos de ser uma companhia multicultural”.

“Desde que tomou conhecimento sobre o fato, o Club Med esteve à frente para tentar acolher e prestar todo apoio necessário à colaboradora e, para isso, em diversas vezes a convidou para abrir um diálogo após o ocorrido. Infelizmente, ela optou por não conversar com nossa equipe de Recursos Humanos. A empresa segue respeitando o seu momento e está à disposição a qualquer tempo para apoiá-la”.

Após ver o comunicado da empresa, o escritório Cândido e Costa orientou Eunice a pedir tréplica. “Depois dos cinco dias que fiquei afastada, uma funcionária do RH veio até a minha mesa falando que a chefe do RH queria falar comigo. Disse que não me sentia pronta, estava bastante abalada com a situação, tanto do agressor quanto o do gestor que me xingou. Passei o telefone do meu advogado”.

“Não fui aparada pela Club Med quando precisei, o único contato que fizeram comigo foi no dia 19. Minha própria gerente também até o momento não dirigiu nenhuma palavra a mim”.

+ sobre o tema

Editores e racismos

Sou negro e cometo racismo contra negros. Sou como...

20 de Novembro e a defesa de nossos melhores sonhos de liberdade

Em algum momento entre 1962 e 1976, o poeta...

Racismo e baixa autoestima levam cotistas a se esconder, diz pesquisadora

  Brasília - A pesquisadora da Universidade de...

IDADE PENAL: A sociedade e as lógicas da criminalidade – por Suzana Varjão*

“Criava-se uma geração de predadores que iria aterrorizar São...

para lembrar

“Orelha’ do Munanga e o racismo à brasileira

Por: MARTINIANO J. SILVA   Não sei se...

Mulher negra filma ataque racista em posto de Salvador: “Odeio preto, não suporto”

Uma mulher negra foi vítima de racismo em uma loja de...

Índice de assassinatos de negros em Alagoas é o maior do Brasil

Estudo indica que em 2002 foram 650 homicídios e...

“Não vejo racismo em propaganda de azeite”, diz líder negro

Ana Cláudia Barros O coordenador nacional da União de...
spot_imgspot_img

Elites que se tornaram uma caricatura

Em salões decorados com obras que ninguém sabe explicar e restaurantes onde o nome do chef vale mais que o sabor da comida servida, uma parte da elite...

Festa de São Jorge é a utopia de um Rio respeitoso e seguro

Poucas celebrações são mais reveladoras da (idealizada) alma carioca e, ao mesmo tempo, do fosso de brutalidade em que nos metemos. Todo 23 de...

Belém e favela do Moinho, faces da gentrificação

O que uma região central de São Paulo, cruzada por linhas de trem, a favela do Moinho, tem a ver com a periferia de Belém, sede...
-+=