A carreira de modelo é uma trajetória constantemente mal interpretada por quem acompanha, consome e até mesmo por quem está envolvido no mercado. Para uma modelo negra, o trabalho é ainda mais complicado.
Por Wilson Nemov Do Finissimo
Convidamos a ex-Miss DF Amanda Balbino para comentar um pouco sobre as mudanças em sua vida desde sua vitória, sobre machismo, racismo e sororidade. Além, claro, dos seus planos enquanto estudante e modelo.
O mercado dos sonhos parece um pouco mais realista para a brasiliense. “No ano seguinte ao meu reinado, 2016, recebi convites para trabalhar no RJ e em SP e acabei tendo essa experiência única de viver com mais autonomia, liberdade, confiança e autoconhecimento longe dos pais. Obviamente, o desejo de viajar para o exterior se mantém, mas hoje após conhecer um pouco mais a vida profissional de modelo, percebi que existem exigências extremas demais e que lá fora o preço pode ser muito alto para mantê-las”, declara.
Balbino não desistiu de desbravar o mundo, claro, mas prefere investir em sua trajetória intelectual. “ainda alimento esse desejo de viajar e conquistar conhecimentos únicos em cada país e cultura que vir a conhecer, seja pela psicologia, alguma pós, outros cursos, conta própria ou em detrimento de um convite a algum evento”, revela empolgada.
Quando entramos no debate racial, é necessário deixa-la falar:
“Minha luta nunca foi para o triunfo da Amanda Balbino modelo em si, mas para a devida ocupação da mulher negra no mundo da moda. Em um casting, se há alguma negra em meu lugar, me sinto honrada e representada. O problema é quando as mulheres não pretas ocupam meu espaço no mundo da beleza e influência. Certamente as loiras e morenas tem belezas dignas, porém elas sempre foram contempladas e influentes.
Sempre ditaram os padrões e o que deve ser aceito, inclusive para mulheres como eu que não tinham nada a ver com elas. Muitos pensam que o problema no mundo da moda se restringe a falta de representatividade, mas eu acredito que seja um fenômeno mais amplo. A questão não é que não tenhamos modelos negras, porque nós também sonhamos e também nos preparamos para um casting. O problema é que as pessoas do mundo da moda não estão preparadas para nos aceitar.
A beleza da mulher negra é extremamente diversa, mas muitos clientes pensam apenas em um certo tom de pele, ou escolhem apenas aquelas com o cabelo bem afro, mas que o quadril não passe de 89/ 90cm. A verdade é que a grande parte da herança genética das mulheres negras tem um corpo curvilíneo, quadril largo, bocas carnudas, olhares expressivos, passos fortes, mas no fundo os profissionais da moda estão sempre esperando a modelo magra, do quadril 89, que consiga usar a mesma base para todas é que possa fazer uma escova no cabelo. Bom, meus caros, essa não é a mulher negra, essa não sou eu e essa é a forma com que nós constantemente perdemos a oportunidade de colocar a vista a NOSSA beleza para o mundo!”
Se Amanda desistiu completamente do mundo da moda? De maneira nenhuma! Um dos seus sonhos envolve a quebra de padrões de beleza e o uso da psicologia em uma espécie de agência/coaching super bacana: “Comecei a ter vontade de dar alguns cursos de consciência e expressão corporal, coaching para modelos e misses iniciantes e principalmente algo que fosse voltado para o despertar da beleza da mulher negra. Além disso, tenho a vontade de posteriormente ter uma agência voltada para a valorização da beleza das pessoas, principalmente das mulheres que são constantemente coagidas a se encaixarem aos padrões institucionalizados.”
E a dica de Miss? O que Amanda passa para as aspirantes?
Diria em primeiro lugar que elas são lindas! Independentemente do que digam, elas têm suas belezas e precisam ter consciência disso. Depois diria que elas não sabem, mas que nossa história é de realeza, visto que seus ancestrais não são escravos e sim reis e rainhas fortes e resistentes, tanto é que o reinado chegou até nós. Diria também que entre nós não há concorrência, o resgate é coletivo e que cada conquista se expande para todas de forma que possamos vibrar e auxiliar todas que queriam ocupar esse espaço. E por ultimo, diria que não tenham medo de se esforçar, conquistar grandes espaços, mas que acima de tudo não deixem de se amar. O amor próprio é imprescindível para essa profissão para que saibamos sempre até onde iremos e o que merecemos! Ele é um ótimo medidor da felicidade que os momentos nos trarão e da justiça que precisamos ter conosco em cada situação.