Música Afro-Urbana Brasileira

por Clodoaldo  Arruda

A música brasileira é, sem dúvida alguma, uma das melhores do mundo. Sua qualidade é atestada por todos os músicos e críticos do planeta, não só por suas várias vertentes, gêneros e sub-gêneros ou por suas várias influências étnicas e culturais, mas por sua grande capacidade antropofágica. Por sua facilidade de importar estilos, estéticas, ritmos e técnicas, adaptá-los, transformá-los e devolvê-los completamente modificados, mutados em algo novo, que, depois, será mais um elemento que nós vamos chamar de MPB (música popular brasileira).

Na música negra e urbana do Brasil, essa transformação ocorre de forma ainda mais rápida e soa ainda mais natural. Num país de maioria afrodescendente e de dimensões continentais como o Brasil, temos espaço e elemento humano para aprendermos várias músicas negras e criarmos várias MPBs.

Podemos citar vários exemplos de movimentos musicais: a Tropicália, com suas fusões de rock’n’roll, bossa nova e músicas regionais nordestinas, seguida pelos Novos Baianos, primeiros a misturarem guitarra com cavaquinho, o samba-esquema-novo de Jorge Ben(jor), e sua batida inconfundível que unia bossa nova, samba das quadras de escola de samba e rock’n’roll, sem contar a própria bossa nova, que possibilitou tudo isso ao dar o swing do samba aos acordes complexos e requintados do jazz norte-americano.

Era a música africana na diáspora crescendo e se fundindo. Temos o samba-reggae nascido nos blocos afro da Bahia como o Olodum, Ilê Ayê e Muzenza, além dos vários trios elétricos e grupos de samba-duro (samba de roda) do recôncavo baiano. Mesmo movimentos que, aparentemente, não se valiam dessas misturas, como a Jovem Guarda ou o rock da geração dos Anos 80, imprimiam ao rock de influência inglesa e americana um tom, um molho genuinamente brasileiro. Na década de 90, em Pernambuco, o movimento mangue-beat uniu punk, hip hop, funk, soul e música eletrônica com maracatu, ciranda e côco. Lembra da Tropicália? Pois é, era a Geléia Geral profetizada pelos tropicalistas re-acontecendo.

Em São Paulo e no Rio de Janeiro, o Hip Hop e, em seguida os bailes funk, viram os maiores movimentos sócio-culturais da periferia a partir dos anos 80, como continuidade do movimento Black Soul dos anos 70. No caso do Hip Hop, além de recuperar a estética do Orgulho Negro, com tranças e cabelo afro black power, através do recurso tecno-eletrônico do sample, que possibilita usar trechos de músicas antigas para criar músicas novas, o Hip Hop cria ídolos novos (Thaíde, Racionais MCs, MV Bill), e resgata figuras da black music para as novas gerações (Tim Maia, Jorge Benjor, Cassiano, Banda Black Rio), que, devido às inconstâncias do mercado fonográfico e da mídia, tinham suas carreiras consideradas acabadas nos anos 80, a despeito de seu enorme talento e importância.

Pronto: a geléia geral estava formada de novo. Jovens negros e pobres, vindos de regiões violentas e afastadas estavam fazendo música sem nenhum conhecimento teórico-musical ou de informática, apenas utilizando computador e os discos velhos de seus pais. Novamente, o Brasil importou, absorveu, adaptou e criou, nascia assim o rap brasileiro. Mais do que isso, nascia a música urbana brasileira, seguindo a tendência das grandes capitais da cultura ocidental. Cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Recife não deviam nada a Nova York, Londres, Berlim ou Paris.

Além de Thaíde, Racionais MCs, DMN ou MV Bill, ainda em atividade, hoje, Rappin Hood e Marcelo D2, já apontam outros caminhos para o rap, fundindo Hip Hop com samba. Resumo do Jazz, Afro-Verso e Alquimistas (o coletivo chamado Clube da Rima) aponta caminhos que unem o hip hop ao jazz, ao samba-rock, à MPB e à música cubana e afro-latina.

No exterior, ingleses, franceses, alemães, norte-americanos, entre outros, já se renderam ao talento dos DJs brasileiros fazendo com que o Brasil se torne referência na cena da música eletrônica em todas as suas vertentes, principalmente o Drum´n´Bass com os DJs Marky, Patife, Xerxes, Ramilson Maia, Marcelinho Da Lua, Dolores, Drummagic, entre outros.

O Hip Hop, o samba-rock, o mangue-beat, o funk, o soul e a música eletrônica são genuínos exemplos da música afro-urbana brasileira.

 

+ sobre o tema

Mostra em São Paulo celebra produção de cineastas negros no Brasil

Uma seleção de filmes brasileiros realizados por cineastas negros...

O dia em que os deputados brasileiros se negaram a abolir a escravidão

Se dependesse da vontade política de alguns poucos, o...

para lembrar

Mostra em São Paulo celebra produção de cineastas negros no Brasil

Uma seleção de filmes brasileiros realizados por cineastas negros...

O dia em que os deputados brasileiros se negaram a abolir a escravidão

Se dependesse da vontade política de alguns poucos, o...
spot_imgspot_img

Feira do Livro Periférico 2025 acontece no Sesc Consolação com programação gratuita e diversa

A literatura das bordas e favelas toma o centro da cidade. De 03 a 07 de setembro de 2025, o Sesc Consolação recebe a Feira do Livro Periférico,...

Mostra em São Paulo celebra produção de cineastas negros no Brasil

Uma seleção de filmes brasileiros realizados por cineastas negros ou que tenham protagonistas negros é a proposta da OJU-Roda Sesc de Cinemas Negros, que chega...

O dia em que os deputados brasileiros se negaram a abolir a escravidão

Se dependesse da vontade política de alguns poucos, o Brasil teria abolido a escravidão oito anos antes da Lei Áurea, de 13 de maio de...