Enquanto no Brasil o Congresso discute reduzir a maioridade penal, nos Estados Unidos o número de menores presos tem diminuído ano após ano, e o Judiciário e legisladores de vários Estados vêm criando restrições à punição de menores como se fossem adultos.
Por João Fellet Do BBC
Segundo a ONG americana Campaign for Youth Justice, desde 2005, 29 Estados americanos e a capital Washington aprovaram leis que tornam mais difícil processar e punir adolescentes como se fossem maiores de idade.
Com isso, o número de jovens em prisões de adultos vem caindo em quase todos os Estados. Segundo o Council of State Governments Justice Center, outra ONG americana, o total de menores de 18 anos nessas penitenciárias baixou 65% entre 2007 e 2012.
A ONG estima que todos os anos 250 mil menores sejam julgados e punidos como adultos nos Estados Unidos. No país, que tem as maiores populações de jovens e adultos encarcerados do mundo, cada Estado tem relativa autonomia para definir sua legislação punitiva.
Em alguns locais e a depender da gravidade do crime, menores podem ser julgados e condenados como adultos, cumprindo pena em prisões regulares. Há casos de menores que foram condenados à prisão perpétua em penitenciárias estaduais quando tinham 12 ou 13 anos de idade.
No Brasil, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) em discussão no Congresso prevê baixar de 18 para 16 anos a idade a partir da qual infratores passariam a ser julgados como adultos.
Nesta terça-feira, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara avaliou que a proposta não fere a Constituição. Com isso, o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), criou uma comissão especial para discutir o conteúdo da matéria ao longo dos próximos meses. Só ao fim desse processo a proposta poderá ser posta em votação.
Prisões reduzem crimes?
“A redução massiva do envio de jovens para prisões de adultos ocorreu após estudos mostrarem que prender não tem um efeito considerável nos índices de crimes”, diz à BBC Brasil Mike Tapia, professor do Departamento de Justiça Criminal da Universidade do Texas e autor de um livro sobre o perfil dos jovens encarcerados nos Estados Unidos.
Para ele, a melhor prática para lidar com menores infratores é mantê-los em suas comunidades e famílias, “que são chave no processo de reabilitação”.
Fora das celas, diz ele, os jovens correm menos riscos de cometer novos crimes ao fim da pena e se livram dos abusos, da corrupção e da violência comuns a carceragens nos Estados Unidos.
As restrições à punição de jovens infratores nos Estados Unidos também se devem a decisões da Suprema Corte. Em 2005, os juízes proibiram condenar menores à prisão perpétua e, em 2010, a corte manteve a pena máxima apenas para jovens que tivessem cometido homicídio.
Agora os Estados discutem se a medida deve se aplicar a crimes cometidos antes da decisão. Estima-se que 2,5 mil presos nos Estados Unidos cumpram prisão perpétua por crimes cometidos enquanto eram menores.
Onda punitiva
O afrouxamento das punições a jovens nos Estados Unidos reverte uma tendência iniciada nos anos 1990, quando o aumento no índice de crimes cometidos por menores levou 47 dos 50 Estados americanos a ampliar as penas para esses atos.
O endurecimento das leis se embasou numa crença, amplamente difundida por pesquisadores e políticos da época, de que com o tempo os jovens americanos cometeriam cada vez mais crimes.
Mas não foi o que ocorreu. Em estudo publicado em 2013 pela Universidade de Ohio, os criminologistas Franklin E. Zimring e Stephen Rushin dizem que as taxas de homicídios cometidos por jovens americanos despencaram entre 1993 e 2010.
Uma corrente de pesquisadores avalia que a redução se deveu ao endurecimento das punições de jovens infratores. Para esses acadêmicos, as penas mais duras desencorajaram muitos crimes que teriam sido cometidos sem a mudança.
Mas os autores da pesquisa apontaram que, no mesmo período analisado, os índices de homicídios cometidos por jovens adultos americanos tiveram uma queda equivalente, sem que as punições para esse grupo tivessem aumentado significativamente.
Os autores concluíram que as leis mais rígidas tinham pouco efeito nos índices de crimes entre jovens e aconselharam os Estados a rever a prática de encarcerar menores infratores por prazos longos.