Não se assumir gay pode prejudicar carreira profissional, diz especialista

O dilema sobre sair ou não do armário no trabalho ainda aflige muitos gays, mas esconder a orientação sexual pode fazer o profissional ser visto com desconfiança pelos colegas. Veja histórias de homossexuais que passaram por essa situação

por Iran Giusti

Funcionário de uma das maiores empreiteiras do Brasil, o administrador de empresas Caio Boggiss, 32, só conseguiu ficar à vontade para falar abertamente de sua homossexualidade depois de cinco anos trabalhando no escritório paulistano da empresa. Antes disso, ele ficava intimidado com o ambiente formal e predominantemente masculino heterossexual do local.

 

“No início, a preocupação em esconder a questão de todos era muito grande. Até porque na época o assunto era tratado de forma mais atrasada do que atualmente”, conta Caio, que está há 13 anos na empreiteira. No entanto, o administrador admite que a sua orientação sexual não era tão invisível quanto ele próprio imaginava. “Alguns amigos mais próximos do trabalho já sabiam que eu era gay, até mesmo antes de mim. Eles foram muito importantes no processo de me assumir”, explica.

Depois de falar do assunto com os colegas com os quais tinha mais proximidade, Caio ganhou confiança para não se esconder mais. “Já tive vários chefes e diferentes relações de trabalho. Para alguns, o assunto é tabu, mas para outros, de cabeça mais aberta, a homossexualidade é tratada com tranquilidade. Eu mesmo já consegui me abrir sobre o assunto com alguns gestores que são assim”, observa o administrador de empresas.

O dilema vivido por Caio não é algo incomum. Assim como ele, muitos homossexuais se questionam se devem ou não se assumir gays no ambiente de trabalho. Para Georgete Lemos, diretora de diversidade da ABRH (Associação Brasileira de Recursos Humanos), falar a verdade é sempre a melhor opção. Do contrário, não se assumir ou mentir sobre o assunto pode acabar afetando a credibilidade do profissional.

“Quando um funcionário gay omite sua orientação sexual ou até se comporta como heterossexual, ele não está sendo verdadeiro com ele mesmo e nem com os outros. Isso fatalmente vai gerar um clima de desconfiança, o que pode levar a um afastamento dos colegas (Georgete Lemos)

“Quando um funcionário gay, lésbica ou transexual omite sua orientação sexual ou até se comporta como heterossexual, ele não está sendo verdadeiro com ele mesmo e nem com os outros. Isso fatalmente vai gerar um clima de desconfiança, o que pode levar a um afastamento dos colegas, posteriormente”, analisa Lemos.

A especialista acredita inclusive que a atitude de sair do armário contribui para que o assunto seja tratado com mais naturalidade no ambiente de trabalho. “Se você se sente confortável com sua própria sexualidade, os outros também acabam ficando confortáveis quando a diversidade é exposta”, avalia Lemos, acrescentando que esse gesto é fundamental para quebrar preconceitos. “Você é gay, se comporta como tal, o que na verdade não te faz essencialmente diferente dos outros. Então, as pessoas vão percebendo isso e acabam se aproximando com naturalidade”, completa ela.

assumir gay
Arquivo pessoal

Caio Boggis: “Alguns amigos mais próximos do trabalho já sabiam que eu era gay, até mesmo antes de mim”

Eleito pela revista Out como a personalidade gay mais poderosa dos Estados Unidos, o CEO da Apple, Tim Cook, acredita que sair do armário não é positivo apenas para o funcionário que adota essa atitude, mas também para empresa em que ele trabalha. Ao escrever um artigo recente para o “The Wall Street Journal” defendendo a aprovação de uma lei nos EUA contra a discriminação de funcionários por gênero ou orientação sexual, Cook reafirmou essa ideia.

“Quando as pessoas se sentem valorizadas por ser quem são, elas têm o conforto e a confiança para fazer o melhor trabalho de suas vidas”, escreveu Cook, apostando não só no caráter humanitário de uma política de recursos humanos em prol da diversidade, mas também no aspecto desta como estratégia de negócios.

Para o chefão da bilionária e admirada empresa de tecnologia, funcionários gays assumidos ficam mais à vontade para ser mais criativos e produtivos. E, na ponta do lápis, isso acaba significando mais lucro para as companhias que criam um ambiente acolhedor aos trabalhadores homossexuais.

“Quando as pessoas se sentem valorizadas por quem são, elas têm o conforto e a confiança para fazer o melhor trabalho de suas vidas (Tim Cook, CEO da Apple)

Metade do escritório é gay

No escritório brasileiro da Zomato, uma multinacional que produz um aplicativo de avaliação de restaurantes, os homossexuais não só são respeitados como representam metade dos 22 funcionários da equipe. Um dos empregados da companhia, o profissional de relações públicasBruno Grimaldi, 25, hoje se sente confortável para falar de sua orientação sexual, algo que ele não experimentava  num emprego anterior.

“Eu não falava sobre o assunto. O que era uma forma de lidar com a diversidade sexual sem mentir, mas nem por isso era uma forma melhor”, reconhece Bruno, que enxerga uma impossibilidade de evolução profissional na vida de quem não se assume. “Não faz sentido progredir na carreira e regredir na vida pessoal”, constata o profissional de relações públicas.

Colega de Bruno na Zomato, Mariana Cristtal, 26, nunca escondeu sua orientação sexual. Pelo contrário, ela deixou claro que era lésbica desde o seu primeiro estágio. “Se uma empresa tem problema com a minha sexualidade, eu é que tenho problema com a empresa, antes de qualquer coisa”, defende a profissional, que é formada em Relações Internacionais e trabalha na área de vendas.

Encontre aliados e não minta

Bruno e Mariana têm conselhos a dar para quem vive o dilema de se assumir no trabalho. “Se você acredita que em seu trabalho sua orientação sexual não vai ser aceita, não precisa mentir e inventar uma vida que você não vive”, aconselha ela.

O relações públicas recomenda que o processo seja feito sem afobação. “Busque aliados, fale com as pessoas próximas primeiro, não precisa fazer um comunicado dizendo que você está se assumindo gay”, argumenta Bruno, lembrando que não é preciso contar para todos os colegas de uma vez ou mesmo fazer da saída do armário um grande evento.

“Busque aliados, fale com as pessoas próximas primeiro, não precisa fazer um comunicado dizendo que você está se assumindo gay (Bruno Grinaldi)

Georgete Lemos indica que os funcionários entrem nos sites das companhias para verificar a postura delas. “Veja se os valores da empresa abordam a diversidade, muitas já contam com politicas em relação à sexualidade. É claro que muitas vezes a missão não é posta em prática, mas neste caso o problema é gerencial”, finaliza a especialista em RH.

Fonte: IG

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