Foto: Getty Imagens
Um levantamento feito pela produtora cultural Maria Grijó aponta a pouca diversidade entre os selecionados nos editais de audiovisual apoiados pela Secretaria de Estado da Cultura (Secult). Com base nos dados da própria Secult referente aos contemplados entre 2009 e 2016, utilizando as categorias do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para gênero (feminino e masculino) e raça (branca, preta, parda, indígena e amarela), a análise indica a predominância de pessoas brancas e do sexo masculino em relação a mulheres e pessoas pretas e pardas.
Na análise há dois recortes: o de número de pessoas/entidades contempladas e do valor total disponibilizado. Em termos de raça, 80% das produções e 85% do orçamento foram disponibilizados para pessoas brancas, contra 15% e 13% para pessoas pretas ou pardas. O restante foi direcionado a produções coletivas, mistas ou não identificadas.
Na análise de gênero, 72% das produções e 86% dos recursos foram para homens. As mulheres ficaram com 26% dos prêmios e 13% do valor, conforme indicado nos gráficos abaixo, disponibilizados pela própria pesquisadora.
Maria ressalta que os números não se diferenciam muito dos apresentados em nível nacional por estudos da Agência Nacional do Cinema (Ancine). “Há anos não temos um longa-metragem estreando nas telas de cinema dirigido por uma mulher negra. A presença de homens negros é menor que de mulheres brancas, que é ínfima se comparada ao de homens brancos”, comenta. “Nesse sentido, o audiovisual capixaba é um espelho do nacional, que é um espelho também do audiovisual mundial, como o da Europa e Estados Unidos”.
Num segundo levantamento, mais detalhado focado na questão de gênero, a produtora expõe que até hoje todos os oito prêmios de longa-metragem, os de maior orçamento da Secult foram para homens. Entre todas categorias, aquele em que as mulheres têm maior participação é em documentários de curta-metragem, embora não passe de 36% dos prêmios, contra 64% de diretores do sexo masculino.
Para Maria Grijó, o resultado ajuda a dar subsídios para o debate que está acontecendo no setor audiovisual nacional e agora também no capixaba. “Cada ano tem havido maior aporte de recursos do governo estadual e também da Ancine no Estado. Então é importante fazer essa análise agora para a gente não reproduzir com mais recursos um sistema que já está falido. Se houver muito dinheiro e muitos editais e não tiver diversidade nas produções, vamos ter uma audiovisual que só tem uma visão de mundo”, aponta.
Segundo ela, a situação atual é clara, mas é possível mudar a produção do futuro, fazendo com que seja mais diversa e produzida por mais pontos de vista.
Como a Secult não cobra preenchimento de gênero e raça no momento de inscrição, alegou não ser possível fazer um levantamento do perfil dos inscritos, o que permitiria um cruzamentos das informações e percentuais de inscritos e aprovados.
O levantamento também se reduz aos dados dos diretores e proponentes dos projetos, não permitindo indicar gênero e etnia de outras funções como diretores de fotografia, técnicos de som, montadores, editores de som, atores e atrizes e outras funções que Maria acredita também estarem subrepresentadas no audiovisual capixaba. “Atribuo essa predominância de um único perfil ao fato do cinema e do audiovisual terem sido e continuarem sendo uma arte extremamente burguesa e elitista em todo país. Assim como vários locais de trabalho, reproduz essa sociedade machista e racista, essa estrutura que está em todos os lugares, mas que em alguns momentos e locais, ela se reproduz com mais força”.
Atualmente, a Associação Brasileira de Documentaristas e Curta Metragistas do Espírito Santo (ABD Capixaba) discute a questão das políticas afirmativas para serem propostas para a Secult para os editais do setor audiovisual. “Temos que discutir de forma clara, há experiências de ações afirmativas pelo país e podemos solicitar à secretaria para que isso esteja incluído nos próximos editais”, acredita a produtora cultural.